ENTRELINHAS //
LEVARAM ANNIE THORNE

Fotografia da minha autoria


«Uma noite, Annie desapareceu»


O meu processo de transição para uma nova leitura não é linear. Embora procure que seja diversificado, há alturas em que prefiro manter-me ou dentro do mesmo género literário ou na companhia do mesmo autor. E foi o que aconteceu, assim que terminei O Homem de Giz. Porque C. J. Tudor tem uma escrita mesmo viciante, que despertou, em mim, uma séria vontade de continuar a explorar a sua obra. Portanto, aventurei-me.

Levaram Annie Thorne abre-nos a porta de um mundo ainda mais perverso, com um prólogo intenso, angustiante e repugnante. Em simultâneo, faz-nos compreendemos, de imediato, que entramos num quebra-cabeças capaz de nos deixar os nervos e a sanidade do avesso. E, por isso, necessitei de momentos para respirar, para reorganizar a informação e para aceitar que, talvez, nem sempre encontremos uma explicação lógica para determinadas circunstâncias da nossa vida. Apesar disso, continuamos a tentar. Porque queremos sarar as feridas e concluir um ciclo que nos destruiu por dentro, condicionando os nossos passos.

Só para contextualizar, uma noite, Annie desaparece. Misteriosamente. Após serem efetuadas buscas - e todos temerem o pior -, regressa 48 horas depois, sem qualquer esclarecimento. A única certeza evidente é que voltou bastante diferente. Este episódio ocorreu nos anos 90, contudo, 25 anos depois, Joe - o seu irmão - recebe um e-mail, no mínimo, surreal, porque o remetente assegura saber o que aconteceu e, pior, afirma que se repetirá. Neste ponto da narrativa, há várias questões que se impõem, a começar pela veracidade da mensagem e a terminar na necessidade de remexer no passado. Porém, só existe um caminho possível. E Joe faz as malas para retornar ao local que o viu crescer, com o objetivo de descobrir, por fim, as respostas em falta.

A história oscila, então, entre um registo de mistério, horror e sobrenatural. E aborda temas de máxima importância, como é o caso do bullying, da saúde mental, do alcoolismo, da instabilidade profissional e das próprias relações inter e intrapessoais. Alicerçada num ambiente sinistro - e numa comunidade «com esqueletos no armário» -, acompanhamos a luta do protagonista, que se revela uma espécie de anti-herói, uma vez que apresenta inúmeras falhas e um caráter dúbio. Mas são essas características que o tornam credível e que nos deixam mais empáticos com o seu sofrimento. Paralelamente, é impressionante como podemos estar enganados em relação a uma pessoa. E como o passado pode influenciar a nossa existência, encaminhando-nos para o abismo.

Levaram Annie Thorne é obscuro. É imprevisível. É visceral. E faz-nos sentir num permanente conflito interno, não só pelo que fica por dizer, mas também por todas as cicatrizes que põe em relevo. Com uma escrita mais madura e mais gráfica, o final desarmou-me por completo. Será que, algum dia, seremos capazes de enterrar todos os fantasmas?


Deixo-vos, agora, com algumas citações:

«Contudo, mesmo vazia, uma casa de família deixa perceber ecos de vida. Não se queda envolta num manto de silêncio pesado, sufocante e agoirento, como acontece com aquela casa» [p:9];

«Viro-me. A luz começa a escassear, o ar está mais frio, e se me deixo ficar por aqui mais tempo ainda alguém chama a polícia. A última coisa que quero é atrair as atenções» [p:82];

«Não quer dizer que não tenham vontade de partir para outro lugar. O que nunca lhes ocorreu foi a possibilidade de existir outro lugar» [p:161];

«-Porquê? Porquê dar-se a todos este trabalho? A esta pantomima? Por que não pensou apenas em telefonar-me? Sabe que os correios continuam a entregar cartas?
- Se eu me tivesse limitado a telefonar, você teria voltado?» [p:236];

«E também não lhes disse - nem a ninguém - o que mais tinha visto naquele fim de tarde» [p:272].


// Disponibilidade //
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Comentários

  1. Já li boas opiniões sobre este autor, obrigada pela partilha. Vou levar a sugestão.

    Um beijinho grande!

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    1. Estou completamente rendida à escrita da C. J. Tudor. E mal posso esperar para ler Os Outros!

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  2. Nunca li, mas vou tomar nota da sugestão!

    Isabel Sá  
    Brilhos da Moda

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  3. Promete! Estes temas obscuros deixa-no sempre a pensar e se fosse comigo??

    Beijos e abraços.
    Sandra C.
    Bluestrass


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    1. Sim, precisamente! E esse pensamento constante acaba por intensificar toda a experiência

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  4. Já ouvi falar, mas ainda nunca li :)

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  5. Mais um livro que ainda não tinha ouvido falar, mas deve ser bastante interessante
    Beijinhos
    Novo post
    Tem post novos todos os dias

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  6. Gostei muito da sugestão :) Gosto de temas como este que mexem comigo...

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  7. Já tenho o livro na minha lista 😍 tal como O Homem de Giz. Como sempre adoro as tuas opiniões! São sempre tão originais e objetivas, focando nos assuntos mais relevantes que iremos encontrar. Faz toda a diferença opiniões assim. 😍 bom fim de semana Andreia

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    1. Muito obrigada, minha querida! Essa confiança enche-me o coração *-*

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  8. Um romance que me deixou curiosa. Vou procurar na biblioteca.

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    1. Sou bastante suspeita, porque adorei, embora algumas passagens sejam sinistras. Mas é um thriller muito bem conseguido

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