augusta b. ou as jovens instruídas 80 anos depois, joana bértholo
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Fotografia da minha autoria |
As saudades de um autor, por vezes, são subtis, mas orientam-nos com propósito, por isso, inconscientemente, dei por mim a selecionar dois livros da Joana Bértholo para ler em simultâneo, quando precisava de uma leitura mais curta que me acompanhasse entre viagens de metro. Olhando para o catálogo do Kobo Plus, nem hesitei na escolha.
efemeridade vs transversalidade
Augusta B. ou As Jovens Instruídas 80 Anos Depois nasceu no Festival Correntes d’Escritas 2023, «a propósito da iniciativa Residência de Um Dia em que vários autores e autoras foram convidados a explorar a Póvoa de Agustina», e partiu do famoso anúncio que a autora publicou no jornal Primeiro de Janeiro, aos 22 anos, «para se corresponder com uma pessoa inteligente e culta». Assim, através de duas jovens na mesma faixa etária de Agustina, pretende estabelecer uma ponte com a atualidade e a procura pelo outro.
O mundo das aplicações de encontros continua a ser turvo para mim. Nunca explorei e, embora não seja uma porta completamente fechada, não me imagino a fazê-lo, uma vez que não tenho jogo de cintura suficiente para gerir a dança incerta que é o engate. No entanto, acho interessante ler sobre o assunto e compreender como é que as coisas têm evoluído, como é que um ato tão disruptivo continua a ter impacto na sociedade, em geral, e nas mulheres, em particular, como é que as necessidades se alteram e há cenários que são transversais. Existem oito décadas a separar estas personagens, mas a vontade de viver um romance arrebatador é força motriz dos seus comportamentos.
«Tudo naquela história soava obsoleto: o veículo, os modos e o contexto. Mas talvez não o impulso, sentiram elas; talvez não o anseio, talvez não a carência, a volúpia ou a intensidade. Porventura nada do que realmente importa teria mudado»
Cansadas das formalidades do digital, Augusta e Raquel decidem republicar o anúncio de Agustina e, a partir daqui, abre-se um novo mundo de peripécias e dificuldades - e de entusiasmo também, talvez, pela novidade e pelo desejo de descobrirem até onde é que aquilo as levaria. Não obstante, os sucessivos entraves, sinto, acabaram por trazer duas das camadas mais bonitas desta narrativa: um conhecimento intimo sobre quem são e o lugar que ocupam no mundo e a construção de uma amizade feminina sólida. Além disso, acho mesmo interessante a ideia de termos tanto em comum com alguém que não conhecemos e a noção de que os lugares são ramificações da nossa história.
Augusta B. ou As Jovens Instruídas 80 Anos Depois desconstrói, por um lado, a imagem de que todas as histórias de amor têm de começar de uma forma profundamente poética e, por outro, mostra-nos que, por mais que as ferramentas que utilizemos se venham a relevar efémeras, a procura pelo amor é transversal a qualquer geração: seja qual for o plano de ação, seja qual for a natureza desse amor. E que nunca nos falte o impulso de mergulhar neste sentimento: se calhar, só precisamos de uma trivial folha de jornal.
notas literárias
- Lido entre: 24 e 25 de maio
- Formato de leitura: Digital
- Género: Novela
- Pontos fortes: A escrita e a capacidade de estabelecer uma ponte tão fascinada entre o passado e o presente
- Banda sonora: O Amor é Mágico, Expensive Soul | Decide-te, Rita Rocha | Plot Twist, Carolina Deslandes | Telefone Estragado, Nena
augusta b ou as jovens instruídas 80 anos depois
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joana bértholo
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livros de autores portugueses
6 Comments
Mais uma autora que preciso de descobrir, nunca li nada da Joana-
ResponderEliminarLevo, como sempre a sugestão.
Beijinho grande, minha querida!
Quanto mais leio dela, mais quero descobrir!
EliminarNão conhecia, mas levo a sugestão.
ResponderEliminarIsabel Sá
Brilhos da Moda
Boas leituras, Isa :)
EliminarTantas vezes procuramos o amor com fórmulas novas, sem perceber que o impulso — esse desejo genuíno de encontrar o outro — é sempre o mesmo, ontem como hoje. Este livro lembra-nos isso com ternura e inteligência, como se Agustina sussurrasse às mulheres de agora. Que nunca nos falte a coragem de sentir, mesmo quando o mundo nos parece demasiado rápido, demasiado filtrado.
ResponderEliminarCom carinho,
Daniela Silva
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Não diria melhor, é mesmo isso! Os tempos evoluem, mas há coisas que são transversais e é importante não nos esquecermos do que nos move
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