ENTRELINHAS || MARGARIDA ESPANTADA

Fotografia da minha autoria



«A loucura é muito difícil de definir e é muito fácil de cair nela»

Avisos de Conteúdo: Violência, Suicídio, Alcoolismo, Abuso


As dinâmicas familiares são intrigantes, por tudo o que nos revelam e omitem em simultâneo. Além disso, tal como escreveu Tolstoi, em Anna Karenina, «as famílias felizes são todas iguais, as infelizes são-no cada uma à sua maneira», o que demonstra esse caráter dicotómico; esse caráter individual de elos que nos prendem às nossas raízes. E foi neste ambiente familiar que me estreei na obra de Rodrigo Guedes de Carvalho.

«Como se ao espelho, no escuro, munida apenas de uma lanterna 
pequena, apontasse para partes dentro de si que se complicavam»

Margarida Espantada apresenta uma escrita leve, bastante fluída, quase como se fosse uma pena. No entanto, o seu tom é inquietante, porque permanece a sensação de haver algo escondido nas entrelinhas. Crescendo de recantos obscuros das relações intra e interpessoais, foca-se em temas tão duros e pertinentes como a violência doméstica, a saúde mental, os abusos físicos e emocionais, os vícios e a ilusão das aparências. A narrativa parece que não nos pesa de imediato, porém, vai-nos sufocando, pois compreendemos o quanto é ténue a linha que separa a dor e o perdão - e a repetição de determinados comportamentos.

«Não é pelo ruído lá de fora. É pelo ruído que vai começar cá dentro»

O drama desta família torna-se ainda mais evidente pelo retrato intimista que o autor foi desenhando, no decorrer do enredo, transportando-nos para a infância dos quatro irmãos. Decifrando este tempo, percebemos, então, que existem vivências que os moldaram e que, por consequência, condicionaram a convivência entre eles. Assim, talvez seja justificável a amargura, o desespero, a luta oposta e os vínculos tão disfuncionais. Inclusive, sem esquecer o peso das convenções sociais, parece existir uma maldição a dizimar os Duval.

«(...) regressamos a um sítio e as memórias saem dos esconderijos»

A história tem, ainda, um apontamento catártico e uma mágoa que poderia ser a de qualquer um de nós. Com uma mão no passado e de olhar sobre o futuro, sentimos os acontecimentos a escalarem de um modo célere e intenso. E, além do mais, sentimos o impacto do efeito dominó, caindo num círculo vicioso de atitudes que se perpetuam de geração em geração, como se fosse impossível inverter essa sequência preconceituosa.

«E os seus grandes mistérios não são as terras por descobrir mas as pessoas»

Margarida Espantada movimenta-se num clima violento e camufla-se na ironia para estabelecer uma crítica à sociedade, que continua a ignorar o sofrimento alheio. Embora se foque na protagonista que lhe empresta o seu primeiro nome, também é um retrato da forma como os seus familiares a observam. Pautada por um realismo psicológico que nos desorganiza, é impressionante como há tanto que nos passa despercebido. E como há heranças que necessitamos de expiar, para que a nossa vida seja mais do que uma peça de um jogo.

«Ama, mas cuidado com o que amas»


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Comentários

  1. Adoro o autor enquanto jornalista, mas ainda não aventurei na sua escrita. Tenho mesmo que descobrir este livro. Obrigada pela sugestão.

    Bom fim-de-semana! Beijinho grande, minha querida!

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    Respostas
    1. Para já, foi o único livro que li dele, mas tenho outro em espera. Fiquei mesmo rendida à sua escrita!

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  2. Tenho mesmo muita curiosidade em ler RGC e este livro parece ser uma excelente sugestão :)

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  3. Acredito que seja um livro muito interessante de ler. Gosto do autor.
    .
    Feliz fim-de-semana.
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    Pensamentos e Devaneios Poéticos
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  4. Já li. Um livro inquietante, aliás dos que li do autor, tem todos essa característica.
    Bom fim-de-semana

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  5. Sempre a conhecer novos livros, esse nunca tinha ouvido falar, mas foi bom conhecer a sua opinião
    Beijinhos
    Novo post
    Tem post novos todos os dias

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