a maldição, lourenço seruya

Fotografia da minha autoria



O sorteio para o desafio literário que tenho com a Sofia, 5 autores para 2025, ditou que regressássemos a Lourenço Seruya em julho. Depois de uma estreia que me pareceu promissora, estava entusiasmada para conhecer mais da sua obra, no entanto, tenho de confessar que a experiência não correspondeu totalmente às minhas expectativas.


 uma peça amaldiçoada

A Maldição foca-se na investigação mais recente do inspetor Bruno Saraiva e, por isso, somos levados até ao Teatro da Passagem, em Lisboa, onde voltará a estar em cena a peça A Pedra do Pecado, na qual «nenhum encenador ousou voltar a pegar», durante quarenta anos, por se acreditar que estaria amaldiçoada. Afinal, foi representada duas vezes, em Portugal, e em ambas as datas de estreia morreu a atriz principal. Apesar de as mortes terem sido naturais, esta coincidência potenciou uma aura muito particular. Quarenta anos depois, o Teatro da Passagem desafia as probabilidades e a questão que se impõe é: nesta estreia também ocorrerá uma morte em palco? Tudo indica que sim.

A premissa é intrigante e continuo a achar fascinante um enredo construído a partir de um ambiente fechado, onde aparentam ser poucas as possibilidades de fuga ou de, pelo menos, se passar despercebido, porque há a necessidade de aprimorar detalhes e a própria criatividade, para que as decisões narrativas sejam credíveis. Ademais, sinto que a escrita cinematográfica do autor facilita todo o processo, porque torna o enredo mais claro, mais fácil de imaginar. Até aqui, não tenho qualquer crítica negativa, o que não funcionou comigo foi mesmo o tom novelesco que pontuou certas partes do texto.

Inevitavelmente, fui criando teorias e anotando possíveis culpados e motivações, mas sempre com margem para ser surpreendida, oscilando entre o desejo de fazer parte da investigação e a inocência de não estabelecer determinadas associações. Ainda assim, houve um nome e uma razão que se revelaram mais fortes e que nunca me saíram do pensamento, por mais que o autor nos levasse por rotas paralelas. Não sinto que este facto tenha condicionado a experiência de leitura e, aliás, até achei curiosos os desvios que fez, mostrando-nos que nem sempre as escolhas óbvias têm o desfecho esperado.

«O ser humano é tão peculiar - disse Américo, encolhendo os ombros. - Nunca sabemos bem o que vai na cabeça das pessoas, pois não?»

Num plano oposto, sinto que existiram opções um pouco rocambolescas, algumas até macabras, sem necessidade. Acho que o texto ganhava mais sem esses apontamentos extremos. E, embora não goste de comparar livros, porque cada um tem a sua valência, dei por mim a perceber que estive muito mais investida na obra de estreia, A Mão Que Mata, porque o ritmo foi mais frenético. Neste, com as arestas bem polidas, creio que conseguiríamos o mesmo efeito. Não obstante, é uma história que se lê com fluidez e que tem aspectos interessantes, que nos desarmam pela sagacidade/ousadia do autor.

A Maldição levantou o pano para nos fazer refletir sobre mágoas do passado, sobre os segredos que ecoam em silêncio, sobre aquilo que omitimos por medo ou insegurança e, acima de tudo, sobre o facto de, por vezes, o passado não ficar onde pertence: por vezes, fica só à espera da ocasião certa para vingar a honra de tudo o que se perdeu.


 notas literárias
  • Desafio: 5 autores para 2025
  • Gatilhos: Luto, linguagem gráfica e explícita
  • Lido entre: 15 e 16 de julho
  • Formato de leitura: Digital
  • Género: Policial & Thriller
  • Personagem favorita: Sr. Américo
  • Pontos fortes: Escrita cinematográfica e fluída
  • Banda sonora: Maldição, Gisela João | Closer Than Sisters, Abel Korzeniowski | Is It Poison, Nanny?, Hans Zimmer | A Pedra, Pedro Puppe & Tiago Bettencourt | You’ll Be In My Heart, Phil Collins

Disponibilidade: Wook (Livro | eBook) | Bertrand (Livro | eBook)
Nota: Esta publicação contém links de afiliada da Wook e da Bertrand

1 Comments

  1. Também já li "A Maldição" e gostei muito. Senti que faltou qualquer coisa que fizesse o final surpreender-me, senti esse fator mais presente em A Mão que mata. Mas o autor escreve muito bem, gosto da forma como os seus livros me prendem à leitura.

    Beijinho grande, minha querida!

    ResponderEliminar