CLUBE DO LIVRA-TE ◾ UM MURO E UMA CERCA, ELISABETE MARTINS DE OLIVEIRA

Fotografia da minha autoria



«Uma amizade improvável»

Avisos de Conteúdo: Solidão, Negligência Parental, Doença Oncológica, Luto


Livros com histórias de amizade e dramas familiares têm o meu coração por inteiro, devo confessar-vos. Visto que era isso que prometia a obra de estreia de Elisabete Martins de Oliveira, não tardei a incluí-la na minha lista de desejos - e na TBR de agosto, acompanhando a sugestão da Rita da Nova para o Clube do Livra-te.


QUEBRAR OS MUROS QUE ERGUEMOS

Um Muro e Uma Cerca tem uma premissa intrigante, afinal, foca-se numa criança negligenciada pelos pais, num idoso solitário e no vínculo improvável que os unirá. Como o título deixa antever, haverá um muro e uma cerca a separá-los, mas a ligação de Santiago e Elias crescerá mesmo assim. E, digo-vos, a amizade entre eles é realmente amorosa. No entanto, houve alguns aspetos que não resultaram muito bem para mim.

«Deito-me na cama, abraço a almofada e só rezo para que os meus pais não me ouçam chorar»

A escrita não me arrebatou. Num ponto inicial, pelo discurso de Elias, até me transportou para características da tradição oral, o que achei interessante, mas fui-me distanciando, porque se tornou um pouco repetitiva, perdida em pensamentos filosóficos que me pareceram acrescentar pouco à narrativa. Tem potencial e margem de progressão, faço essa ressalva, contudo, sinto que o enredo precisava de outra abordagem - talvez beneficiasse, como li recentemente, de um narrador na terceira pessoa, criando uma visão menos dispersa.

«Para o resto, terei sequer tempo de vida?»

Além disso, houve acontecimentos que se revelaram inverosímeis e, até, forçados. Preferia que a autora mantivesse apenas as problemáticas de base, já que teria muito por onde desenvolver. Ao tentar acrescentar outras situações intensas, fez com que o principal fosse menos explorado. Claro que isto não passa do meu gosto e a opção narrativa que tomou não deixa de ser válida, mas, enquanto leitora, acho que me teria emocionado mais se continuasse alinhada com a negligência parental, provocando uma maior nuance nos comportamentos dos pais, com a situação familiar débil e com a solidão que consegue ser um elo transversal.

«As lágrimas caem-me. Tenho medo»

Os valores que transmite são imprescindíveis e não ignoro a capacidade de demonstrar que, independentemente da idade, há condicionantes comuns a moldar a nossa visão do mundo, das pessoas, das circunstâncias, simplesmente ocorrem numa escala distinta, porque temos recursos igualmente distintos. Além disso, numa história contada a duas vozes, gostei de conseguir identificar a mudança na linguagem: mesmo que não lesse o nome do narrador de cada capítulo, tornou-se simples reconhecê-lo e unir as peças do puzzle. Desta maneira, também nós vamos furando as divisórias, como se passássemos a ser parte daquelas casas.

«Encosto o braço ao portão, e a cabeça nele. Consigo ouvi-los respirar, 
a ansiedade a arrancar-lhes a esperança»

Um Muro e Uma Cerca levanta questões pertinentes e faz-nos refletir sobre bullying, sobre o lado imprevisível da vida, sobre a influência que as relações humanas têm nas situações mais mundanas e sobre a angústia de nos sentirmos invisíveis, de sentirmos que as nossas pessoas não acreditam na nossa palavra. Não foi, de todo, uma má leitura, há passagens que ficarão comigo, apenas não teve a carga emocional que esperava.


🎧 Música para acompanhar: Tourada, Fernando Tordo


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Comentários

  1. Terminei de ler este livro no fim de semana. Gostei imenso da narrativa, contive as lágrimas em algumas partes, mas também houve coisas que não resultaram comigo. Achei a escrita muito simples, tendo em conta a experiência de escrita da autora, estava à espera de uma escrita mais elaborada.

    Outro aspecto que não resultou foi o Santiago, achei-o demasiado desenvolvido para a idade. Percebo a ideia da autora, de mostrar uma personagem que é forçada a crescer por ser negligenciada. No entanto, sempre que lia os capítulos do Santiago pensava num miúdo de 12 ou 13 anos, não de 10 anos. Achei a personagem pouco consistente.

    Gostei mais do Elias. Senti que estava bem caracterizado.

    Também achei o bullying exagerado. Irreal.

    É uma história com potencial, mas precisava de ser mais explorada.

    Beijinho grande, minha querida!

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    1. Há partes da narrativa que me comoveram e acho que tem uma mensagem importante. No entanto, não foi tudo aquilo que achei que seria.
      Sim, também esperava outro tipo de escrita, sobretudo, pelos temas em si.
      Por acaso, essa parte não me fez confusão, talvez por trabalhar num centro de estudo e ter miúdos de 10 anos que veria a ter certos comportamentos iguais ao do Santiago. Por outro lado, concordo contigo quando referes que o achaste pouco consistente.
      Gostei do Elias, mas acho que teve uma transição muito rápida na ligação ao Santiago.
      O que me fez confusão nas cenas de bullying nem foram as cenas em si, porque acho que, infelizmente, não devem ser uma realidade tão inverosímil. O que me chocou mais foi passar tudo despercebido, tendo em conta que não foram situações subtis.
      Sim, é isso, a história tem potencial, mas precisava de ser mais consistente

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  2. Sugestao interessante mas nao cativante tendo em conta a tua opiniao e a da Ana...

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    1. Acho sempre interessante pela possibilidade de se descobrir uma nova voz literária. E a verdade é que podes ter uma experiência de leitura completamente diferente. No discord do Livra-te, por exemplo, houve muitas pessoas a adorar e consigo compreender as razões.
      Para mim, confesso, não resultou tão bem, mas tem uma mensagem importante

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  3. Que me parece ser mais uma boa sugestão para se conhecer, mas ainda não tinha ouvido falar desse livro
    Beijinhos
    Novo post
    Tem Post Novo Diariamente

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