As minhas viagens de metro #10


«Tô me afastando de tudo que me atrasa, me engana, me segura e me retém. Tô me aproximando de tudo que me faz completo, me faz feliz e que me quer bem»
Caio Fernando Abreu


Já não te vejo há uns dias. Se contabilizar melhor talvez compreenda que não sejam dias, mas sim semanas. Por estranho que pareça tem-me custado menos do que aquilo que estava à espera.
 
Sempre olhei para a vida com o filtro romântico colocado, por isso habituei-me a sentir tudo em exagero. E por essa mesma razão equacionei que se um dia os nossos caminhos se separassem iria custar-me horrores. Como se me arrancassem o coração a sangue frio. Custou-me, admito, mas o coração continua aqui, sem ferimentos, apenas marcado pelo vazio que a tua ausência provoca. 

Desconstruí aquela ideia feita de que «não vivo longe de você». Eu vivo! Só é mais difícil, porque nos sentimos seguros quando contamos com aquela presença constante. Se um dia nos falta é como se nos roubassem um pedaço de chão. Mas eu vivo sem ti. E o meu coração continua inteiro, ainda que tenha existido alturas em que o senti a desfazer-se em pequenos pedaços de nada. Essa imagem de um coração quebrado é poética, personifica a dor que se sente, mas nós vivemos sem o outro. 

Decidi não compactuar com a dor que me desmancha por dentro. Em vez disso lutei por seguir em frente, conformando-me com o facto de que tu não estarias mais aqui. Ali. Acolá. Onde eu estivesse. Onde o meu coração permanecesse. Lá, bem junto a mim. Se calhar por isso, quando penso no tempo que não nos vemos - e há quanto tempo não sei nada de ti -, não sinto o coração apertado e as lágrimas prontas a rolar pela minha cara, que um dia sorriu por ti. 

Aprendi que mais vale não criarmos expectativas, mesmo que não o consiga fazer, e que se as pessoas não nos procuram é porque não sentem tanto a nossa falta. Nem sempre isto é tão linear assim, mas, neste caso, é mesmo isso que se passa. Tu não sentes a minha falta. E eu sinto a tua. Muito. Por vezes até demais. Eu tento procurar-te. Tu desvias-te no caminho. 

Ainda continuo com o mesmo número de telemóvel. E só não te digo que o caminho para minha casa é exatamente igual desde a última vez que estiveste cá porque sei que não vens visitar-me. Deixaste de me procurar. E eu deixei de estar à tua espera. Por isso, se um dia te apetecer manda mensagem - nem que seja só a dizer olá. Ou então liga e desliga assim que eu atender - como se quisesses dizer-me que tens saudades de ouvir a minha voz. Talvez nunca o venhas a fazer - é o mais certo -, mas sente-te à vontade para dar esse passo se um dia o teu coração voltar a chamar por mim. É que cansei-me de ser sempre eu a tentar manter algo que, ao que parece, não tem mais força para continuar.

Não sei o que nos aconteceu. Nem em que parte do caminho nos perdemos. Só quero que te lembres de uma coisa: um dia que a vida volte a cruzar os nossos caminhos talvez eu não esteja mais à tua espera, sentada num banco de jardim qualquer, imaginando que chegas e pegas a minha mão com ternura. Se calhar mudei definitivamente a direção. E não deixei qualquer pegada, para que assim não sejas capaz de encontrar-me. 

É como se tivesse virado a página e não quisesse que fizesses parte da minha história. 


M, 02.11.2013

Comentários

  1. Que texto tão lindo!
    É bom quando atingimos a fase de 'paz' depois de uma relação e quando conseguimos que ela perdure. :)

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  2. Que belo texto, tem coisas que nos propomos a esquecer, mas a ideia nos surpreende por conta própria.

    Bjos, Amore.

    Participe do sorteio de 5 anos do blog, Ficaria muito feliz em presentear uma de vocês.
    chuvadecamelias.blogspot.com.br

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  3. O texto é lindo querida mas tens de avançar mesmo com a tua vida, não digo por mal, mas se de facto os vossos caminhos se cruzarem pode ser que as coisas corram bem, mas agora tens de avançar linda. Eu também crio imensas expectativas não só em cima das pessoas e de tudo... às vezes é com cada desilusão

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  4. R: O tempo cura mesmo tudo e tens toda a razão, ficamos mais fortes e um bocado mais insensíveis :/

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  5. Um certo querer e não querer denota o texto. Mas penso que estás minimamente tranquila, apesar da dor, que, apesar de tudo transparece.

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  6. Tu escreves cada coisa *.*
    Espere que fiques bem*

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  7. É mesmo, estou farta de tanta alergia :s

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  8. Se assim é, então o melhor conselho que te posso dar é que não esperes. Por muito que digam "quem espera sempre alcança" a dor que sentimos não vale a pena...

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  9. É sempre delicioso ler o que escreves. gosto mesmo. Um beijinho e uma feliz páscoa

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  10. Relações marcam-nos e aprendemos sempre algo...pelo menos é bom de acreditar, mas expectativas continuam a nascer e o romance volta a surgir quando alguém é merecedor. Lindo de ler, puro de sentir...senti-te =)
    Ausento-me uns dias e mudas o aspecto da casa? Está bonita =)

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  11. Amei, e estou numa fase em que me identifico com o que escreves-te! Gostei muito de ler ;)

    Boa Páscoa querida Andreia!!

    Santi

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  12. oh está bem querida :)
    Bom fim de semana *

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  13. Aquilo que passamos no passado e no presente têm de ser vividas, só isso faz sentido para a pessoa que somos hoje e seremos amanhã. A pessoa que se é, é construída com os acontecimentos da vida, que nos ajudam e ajudaram a seguir outros caminhos diferentes dos que anteriormente deram errados.
    Uma feliz pascoa.

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  14. Que texto lindo apesar do tema ser tocante. É uma situação sempre desconfortável o tempo por vezes ajuda mas temos de ser fortes e lutadores e deixar que a brisa nos preencha de novo a vida.
    Beijinhos
    http://retromaggie.blogspot.pt/

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