lunário, al berto

Fotografia da minha autoria


Gatilhos: Linguagem Explícita, Álcool e Drogas


O nosso percurso pode ser feito de passos errantes, mas apenas o descobriremos se optarmos por seguir determinados caminhos. Contando o tempo em cada quarto de lua do ano, o livro de Al Berto mostra-nos que somos feitos de inúmeras tentativas.


histórias dentro de histórias e um tom etéreo

Lunário permite-nos conhecer e acompanhar Beno, «escutando-lhe as narrativas, as paixões efémeras, a vida boémia, as noites de amor e de diálogos secretos». Acima de tudo, senti que nos permite compreender toda a solidão que tantas vezes nos habita.

As diferentes vozes que compõem esta obra aparentam viver num plano quase etéreo, mas somos confrontados por uma solidão profunda - sendo uma personagem extra, pelo peso e pela forma como se manifesta em subtilezas. Inclusive, acredito que a carga emocional do texto sobressai por causa dessa solidão partilhada por todos. E o vazio que os reveste, levando-nos numa espécie de travessia pelo deserto, vai sendo preenchido com álcool, drogas, sexo, paixões intensas, mas fugazes e excentricidades.

Há sempre um tom sombrio, melancólico e de perda a marcar estas memórias, por isso, oscilamos entre a esperança e a tristeza, entre o amor que também lhes impulsiona os passos e os cenários decadentes por onde se movimentam. E, aqui, parece-me que o texto fica um pouco datado, embora não deixe de ser um espelho de uma época não tão longínqua. Assim, à medida que vamos avançando na leitura, vamos percebendo que a liberdade que transparecem não é mais do que um mecanismo de defesa, porque sentem-se perdidos, limitando-se a sobreviver.

«A "moral" era uma treta que não lhe dizia respeito. Era-lhe alheia, pura e simplesmente alheia. O que sempre o fascinara e seduzira era o amor, a amizade e a paixão que cada ser pode dar como um dom, e receber como uma dádiva»

A história não traz uma visão inovadora, mas é o lado emocional que torna a experiência interessante, até porque nada parece ser suficiente para colmatar a ausência, o abandono, a solidão. Nada é suficiente para que queiram viver de um modo frenético, a um passo do abismo, num ritmo vertiginoso. E essa falta de sonhos e de ambições vai sendo ocultada pelas sensações que os alimentam, pelos engates fáceis, pelas noites que parecem intermináveis e bem regadas para que não haja silêncio. Porque eles pensam muito em tudo e, para conseguirem lidar com a opressão do mundo, preferem entrar num jogo de ilusão, de imaginação, onde o real se perde.

Lunário tem histórias dentro de outras histórias, é poético e tem muitas desventuras. Apesar de ser vívido, ser uma viagem de autodescoberta e de nos fazer refletir sobre a necessidade de procurarmos estabilidade para a nossa vida, confesso que não adorei o tom moralista, como se o presente só pudesse ser uma punição pelas escolhas do passado. Por outro lado, achei fascinante a influência que as pessoas e os lugares têm na construção da nossa identidade e o impacto que a tristeza tem no isolamento.


🎧 Música para acompanhar: Sharkey’s Day, Laurie Anderson


Disponibilidade: Wook | Bertrand

Nota: Esta publicação contém links de afiliada da Wook e da Bertrand

Comentários

  1. Nunca li nada do autor, apesar de já ter ouvido falar muito da sua obra.

    Vou levar a sugestão. Parece-me um livro interessante.

    Beijinho grande, minha querida! 😙

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    Respostas
    1. Foi a minha estreia na obra do autor. Embora não tenha sido arrebatada em pleno, acho que é um livro muito interessante, porque nos confronta com vários medos, dúvidas e valores

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  2. Quem sabe um autor para descobrir nos próximos tempos!
    Isabel Sá
    Brilhos da Moda

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  3. Desconhecia por completo. Obrigada pela partilha 🤗

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