LIVROS QUE GOSTAVA DE ESQUECER PARA
OS LER PELA PRIMEIRA VEZ

Fotografia da minha autoria



«Os livros que lemos construíram-nos»


As leituras que vou fazendo, nos momentos mais distintos, moldam o meu caráter, porque me predispõem para uma série de questões que podiam não estar tão claras em mim. É por esse motivo que as minhas estantes me representam tão bem: porque em cada um dos exemplares que as preenchem há um pedaço de quem sou.

Reorganizo a minha modesta biblioteca com frequência e, em todas essas ocasiões, paro para observar uma obra em concreto, recordando o que me fez sentir, quão maravilhoso seria transportar-me para aquele enredo ou, então, como seria se tivesse a possibilidade de me esquecer da história para a ler pela primeira vez.

Foi com a última imagem no pensamento que voltei a olhar para a lista de livros lidos para perceber quais é que poderiam figurar neste cenário. A verdade é que tinha várias possibilidades, mas, no total, selecionei dez.



É o primeiro volume da Saga Millennium. E abre-nos a porta a uma premissa original, intrigante e complexa, que ultrapassa a componente policial, privilegiando o jogo psicológico constante. Percebemos, de imediato, que há um ritual que se repete ano após ano. E que isso levanta suspeitas, pois é impossível que o seu remetente corresponda ao indicado. No entanto, se há algo que fica claro durante toda a narrativa é que nem tudo é o que aparenta ser. E, embora tenha feito uma releitura, dei por mim a mergulhar nesta história com a mesma urgência da primeira vez. Determinados sinais tornaram-se mais evidentes, sobretudo, porque tenho outra maturidade e perceção dos factos, porém, continua a não ser óbvio se existe um assassino e, se houver, quem poderá integrar a lista de suspeitos. Muito menos detetamos as contrariedades que nos esperam.



Tornou-se num dos meus favoritos. Pela escrita cuidada e quase poética. Pela sobreposição de temáticas. Pelo enredo imprevisível. E pelo amor à literatura. O autor teve a mestria de partir de um lugar mágico para nos levar numa viagem sentimental e sombria, muito fiel ao que poderia ser o relato da existência de alguém. Porque sinto que um dos pontos fulcrais desta obra é mesmo o seu caráter relacional e credível.



Transporta-nos para a Venezuela, um país em crise, no qual impera a corrupção, a criminalidade e a repressão. E a história deste lugar, que se funde com a da personagem principal, chega-nos pelo relato avassalador de Adelaide: uma mulher de 38 anos, de luto pela morte da mãe. Pouco tempo depois dessa perda, a sua casa é ocupada por um grupo de mulheres às ordens do regime. Sem nada, completamente à deriva, compreende que, tendo perdido tudo, a única alternativa que lhe resta é sobreviver.



É um relato biográfico, despretensioso e comovente sobre a perda: da mãe e de identidade. Assim, recuando à tarde em que recebeu a trágica notícia do falecimento da sua progenitora, leva-nos numa viagem introspetiva, na qual procura pistas que interliguem as suas recordações e fragmentos que apaziguem a dor, ao mesmo tempo que mantenham presente esse elo relacional, porque é pavoroso termos a noção que nos estamos a esquecer, aos poucos, de características tão identitárias de alguém que significa o mundo para nós. E é através de uma luta interior, com vários percalços pelo meio, que o autor compreende a importância do luto.



É uma história ficcional, com personagens construídas para aquele contexto. Porém, guarda acontecimentos tão plausíveis, que se torna intuitivo senti-la como se fosse parte da nossa realidade, quer enquanto seres autónomos, quer enquanto país. Além disso, atendendo a que atravessa o período histórico da ditadura, é fácil alimentarmos essa sensação de pertença, mesmo que nos magoe e que nos pese. Porque, lá no fundo, são a prova de uma união que não se quebra, sobretudo, quando há laços familiares a amparar cada passo.



Alterna entre dois planos - flores e livros -, permanecendo interligados por um tom poético que marca toda a narrativa. Além disso, faz uma clara alusão à história de Portugal, numa transição do Estado Novo para a Liberdade. E é neste enlaço que somos confrontados com segredos, ilusões, dicotomias, silêncios e dúvidas, tão próprios de quem vai construindo a sua identidade e gerindo o turbilhão de emoções que florescem num peito inquieto e desejoso de ser grande. Só que o nosso discernimento nem sempre privilegia a postura mais correta, porque nos deslumbramos e criamos ideais frágeis, que nos fazem ruir.



Coloca-nos ao lado da curiosa Isabel, que procura descobrir a verdade sobre um assunto que a vai atormentando. Aparentemente desamparada, porque ninguém pretende esclarecê-la, acabará por desenterrar fantasmas de um passado pautado por mentiras, maldade e um crime hediondo.



A premissa é simples, mas vai-se complexificando, até pelos temas, pelas experiências, pelas ligações e pelas filosofias abordadas. Com inúmeros "ses", partimos do presente para conhecermos o passado, regressando ao fatídico dia que mudou a vida de Theo para sempre. Este flasback permite estabelecer um fio condutor e compreender não só o que aconteceu, mas também as repercussões da tragédia. Por sua vez, as constantes reviravoltas ligam-nos à personagem principal, mesmo que nem sempre tenha seguido o caminho mais correto e/ou desejável. Porque vamos procurar colocar-nos no seu lugar. Consequentemente, a sua vida vai proporcionar-nos ensinamentos inesquecíveis, ao mesmo tempo que implicará descobertas intra e inter pessoais, daí que considere O Pintassilgo extremamente fascinante e rico!



Abriga um mundo de histórias e de personagens com percursos distintos e, aparentemente, autónomos, mas que encontram uma forma de se interligarem. Tendo o Oriente como pano de fundo, através de efabulações e traços mais fantásticos, somos capazes de estabelecer uma ponte com o nosso quotidiano, porque todos procuramos algo na vida, mesmo que os nossos contextos divirjam. Além disso, é o retrato fiel do «equilíbrio desequilibrado» do universo, que nos coloca à prova e nos leva a reconsiderar decisões e a ponderar uma maneira de quebrar as barreiras que ainda envolvem o ser humano.



Escrita em minúsculas, numa clara utopia de igualdade, parte da vida de um barbeiro reformado para nos impulsionar a refletir sobre conceitos que nos transformam, durante o nosso crescimento: família, amizade e compromisso. Além disso, atribui voz à velhice, à solidão e ao luto. Através de um discurso poético, é impensável não ponderarmos o que nos reservará o futuro e quais as implicações de certas perdas: sejam elas referentes a um cenário de autonomia, sejam elas referentes à morte de alguém que é tudo para nós. Porque cada uma delas dilacera à sua medida, condicionando uma parte do nosso presente.


* os títulos das obras encaminham-vos para a opinião completa dos mesmos

16 Comments

  1. Como eu habitualmente digo "depois de ler, já não há volta a dar!"

    Bjxxx
    Ontem é só Memória | Facebook | Instagram | Youtube

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    1. Sou bastante suspeita, mas acredito que sim
      Obrigada e igualmente, Ricardo

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  3. Tenho cá em casa A Sombra do Vento que ofereceram ao meu pai. Tenho de o ler e de descobrir estes livros.
    Obrigada pelas sugestões.
    Beijinho grande, minha querida!

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    1. Recomendo, minha querida. Esse universo criado por Zafón é fabuloso!

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  4. Tenho 3 desta lista para ler :) Consegues adivinhar quais sao? Um deles fez chorar o meu Rui quando veio ca a Londres ha 10 anos atras... *.*

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  5. Adoro ler! E esta lista está recheadinha de bons livros para adicionar à minha!
    Gostei do teu blogue, vou certamente acompanhar-te!!
    Beijinho

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    1. Aconselho todos 😊 se leres algum, depois diz o que achaste
      Muito, muito obrigada. És sempre bem-vinda a esta casa

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  6. Que me parece ser mais uma boa sugestão para conhecer, mas acho que quando começamos a ler algo ou até assistir nem sempre é fácil parar
    Beijinhos
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  7. Boa leitura, Andreia. Tenho o livro, A Sombra do Vento , Carlos Ruiz zafón, ainda não comecei a ler.
    Beijinhos, feliz fim-de-semana

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  8. Zafón e Afonso Cruz entraram-me no coração de forma inevitável e definitiva!

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