impostora, r. f. kuang

Fotografia da minha autoria



Gatilhos: Racismo, Morte, Pensamentos Suicidas, Referência a Violação


A vontade de descobrir a obra de R. F. Kuang foi aumentando, graças a todas as partilhas com que me fui cruzando sobre Babel. Ainda assim, quis que a minha estreia fosse com um livro focado no mercado editorial.


 uma narradora pouco confiável

Impostora permite-nos descobrir June Hayward, uma escritora pouco conhecida, a viver na sombra de Athena Liu - ela, sim, uma estrela literária. A relação entre ambas é complexa, porque não são propriamente cúmplices, nem amigas, mas partilham certos momentos. Inclusive, June está com Athena na noite em que esta morre e isso concede-lhe a oportunidade perfeita para ascender na carreira. Como? Roubando-lhe o manuscrito.

É através do «nome ambíguo de Juniper Song» que a nossa narradora procurará publicar o livro, alcançando, finalmente, aquilo que sempre desejou em Liu: o talento, a facilidade com que era lembrada, as experiências, os prémios e a própria crítica, que parecia adorá-la. No fundo, June nunca escondeu a sua inveja e o quanto se considerava merecedora das mesmas conquistas. Com Athena morta, isso tornava-se possível, até porque poderia sair de uma espécie de anonimato. E vai-nos descrevendo como tudo se processou.

Neste ambiente, a leitura revelou-se alucinante, frenética, porque, acima de tudo, queria compreender as motivações da protagonista. Mais do que perceber o como, queria saber o porquê. E a verdade é que Hayward nos seduz muito bem neste plano. É difícil - para não dizer impossível - empatizar com ela, visto que tem comportamentos desprezíveis, mas não a conseguimos largar, o que prova que a sua construção está credível.

«Eles já decidiram qual é a sua narrativa sobre mim. Agora, estão apenas a recolher "factos" para a apoiar»

Acredito que, quando confrontados com esta realidade, queremos todos dizer que nunca faríamos algo semelhante. Mas... e se fôssemos capazes? E se não conseguíssemos fugir ao impulso? Se ninguém viesse a descobrir, resistiríamos? Por mais seguros que estejamos da nossa integridade moral, inevitavelmente, vamos colocar-nos em causa. Porque somos sempre encaminhados nessa direção.

Acho que há partes que precisavam de uma explicação mais profunda, no entanto, gostei imenso das temáticas e do facto de nos abrir a porta para o meio editorial, para o lado solitário da escrita e para toda a pressão que paira nos ombros dos autores. Tal como June, acredito que «escrever é a coisa mais próxima que temos da verdadeira magia», mas isso não significa que não existam muitas áreas cinzentas, relações por conveniência, tentações e uma certa competição desleal. Além disso, gostei que trouxesse para o centro da discussão reflexões sobre racismo, plágio, cultura do cancelamento e apropriação cultural. June é pouco confiável, mas abriu portas para todos estes assuntos. 

Com muito sarcasmo à mistura, R. F. Kuang desenvolveu uma narrativa intrigante.


🎧 Música para acompanhar: Vigilante Shit, Taylor Swift


Disponibilidade: Wook | Bertrand

Nota: Esta publicação contém links de afiliada da Wook e da Bertrand

Comentários

  1. Estou a precisar de ler sugestões que abordam estes temas, cada vez mais. Muito obrigada pela partilha, minha querida *.*

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