notas literárias jan'24

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A banda sonora de uma viagem literária


O compromisso de associar músicas aos livros foi renovado para este ano, mas com uma identidade nova, isto porque o nome anterior não me estava a fazer assim tanto sentido. Além disso, queria algo independente, que não ficasse preso a duas rubricas do blogue, para continuar a existir se algum dia decidir terminá-las.

Foi assim que nasceram as notas literárias. E as de janeiro reúnem 12 temas, que incluem artistas que nunca ouvi, reencontros e instrumentais, numa simbiose que é uma autêntica manta de retalhos. Há canções que exploram muito o nosso lado emocional, mas também trago um ou outro apontamento mais enérgico.


o quarto do bebé, anabela mota ribeiro
Preciso Me Encontrar, Cartola Há versos nesta canção que, para além de serem referidos no livro, descrevem bem o estado da protagonista: «Deixe-me ir/preciso andar/vou por aí a procurar/rir pra não chorar […] Se alguém por mim perguntar/diga que eu só vou voltar/depois me encontrar». Porque ela andou sempre nesta oscilação, nesta vontade de ir, de voltar, de se encontrar naquilo que acabou por perder.

ferry, djaimilia pereira de almeida
What a Difference a Day Makes, Dinah Washington A protagonista, numa fase inicial da narrativa, cantarola versos desta canção. Quando terminei a leitura, senti que tinha de ficar esta e bastava o título para o justificar, porque um dia fazia toda a diferença na sua vida, na vida de quem a rodeava. Mas, depois, ao ouvir o tema completo, percebi que ainda lhe assentava melhor pelos contrastes, pela ideia de mudança e de perda.

mar da tranquilidade, emily st. john mandel
A Thousand Years, Rachel Pierce Há um som de um violino que é essencial para toda a narrativa, por esse motivo, fui à procura de um instrumental… de violino. E escolhi uma versão de um tema bastante conhecido, creio eu, da Christina Perri: não pela mensagem que a cantora transmitiu na letra original, mas pela ideia de, página a página, estarmos um passo mais perto de descobrir algo, pela ideia do tempo que fica em suspenso, mas que, depois, parece trazer tantos anos dentro.

a casa holandesa, ann patchett
The Nutcracker, Op. 71, Act I: March, Pyotr ILyich Tchaikovsky, Sir Simon Rattle & Berliner Philharmoniker Inicialmente, tinha pensado num tema que abordasse as dinâmicas familiares, mas quando o Quebra Nozes é mencionado na história fez-me todo o sentido não seguir a via mais óbvia. Há algo nesta Casa Holandesa que nos leva para um lado clássico e imponente, tal como este tema em particular. De repente, imaginei-me a entrar na casa com esta música de fundo e a descobri-la com uma certa formalidade.

reaccionário com dois cês, ricardo araújo pereira
Tudo Bem, Lázaro A associação deste tema talvez seja a mais livre de todas. Podia ter jogado pelo seguro e ir para «Lisboa, Menina e Moça», de Carlos do Carmo, já que foi referido no livro. No entanto, ao ler o nome Lázaro, ocorreu-me logo esta canção de um artista cuja voz adoro. E, em boa verdade, como fica sempre tudo bem quando lemos Ricardo Araújo Pereira, achei que podia resultar.

a minha andorinha, miguel esteves cardoso
Porto Sentido, Rui Veloso Numa das minhas crónicas favoritas deste livro - Parabéns Obrigados -, Miguel Esteves Cardoso refere-se a esta música, dizendo que a arrepia. Sendo assim, senti que melhor combinação era impossível, porque é um círculo de favoritos muito bem conjugado!

nadar no escuro, tomasz jedrowski
Heart Of Glass, Blondie O tom melancólico do livro talvez não se encaixe bem na energia desta canção. No entanto, achei que fazia todo o sentido combiná-los porque, aquando da sua referência na narrativa, senti que foi um dos momentos mais livres do protagonista, um daqueles rasgos de vida em que o medo, a dúvida, a insegurança não conseguem interferir. Ali, ao som desta música, a dançá-la, ele pôde apenas ser sem pensar em tudo o que isso implica.

a maldição de rosas, diana pinguicha
The Curse, Agnes Obel Como não me ocorreu uma música específica, abri o Spotify e procurei pelo nome do livro (tanto em português como em inglês) e foi assim que me cruzei com este tema de Agnes Obel. O passo seguinte foi ler a letra, enquanto escutava a melodia, e senti que lhe assentava bem por causa destes versos «From the start they didn't know exactly why», «It was swift, it was just, another wave of a miracle», «Only then would they know a blessing in disguise» e «And their hope grew with a hunger to live unlike before». Estava a ouvi-los e a recordar a(s) protagonista(s).

o vestido de noiva, filipa leal
Talvez Se Eu Dançasse, Miguel Araújo ▫️ O livro da Filipa Leal não está relacionado com a nossa apetência ou falta dela para a dança. Mas tem dança. E embala-nos como se estivéssemos a ser conduzidos numa valsa. Sempre que a palavra dança era mencionada, só me ocorria esta canção do Miguel Araújo e acho que não foge assim tanto do tema, porque as personagens vão tendo uma noção de si, porque estão à espreita e autoconscientes. E é por estarem sempre atentas, como se olhassem constantemente para o espelho, que vão lutando contra a imagem que observam e aquela que percebem ser a sua verdadeira identidade. Se calhar, se dançassem como se ninguém as visse, talvez fossem mais livres.

a solidão dos inconstantes, raquel serejo martins
Eu Te Amo, Chico Buarque ▫️ A escolha deste tema apropria-se de um certo sentido de conveniência, isto porque é associado a uma passagem do livro. Há um momento em que a protagonista tenta manter a lucidez, mas é traída pela memória desta canção e, portanto, senti que podia encaixar na dinâmica que procuro: porque lhe é próxima, porque teve algum impacto na narrativa e, sobretudo, porque, ao ler a letra, há versos que traduzem muitas emoções da história, tal como estes: «Se juntos já jogamos tudo fora/Me conta agora como hei de partir/Se ao te conhecer, dei pra sonhar, fiz tantos desvarios».

obras completas volume iv, maria judite de carvalho
Duas Casas, Stereossauro & Capicua ▫️ Quando cheguei à crónica «Casas», ocorreu-me logo esta canção, porque tem uma identidade muito portuguesa, porque nos faz viajar por diferentes zonas e emoções e, também, porque imaginava Maria Judite de Carvalho a escrever alguns destes versos. Além disso, sinto que explora bem a dicotomia entre o que vemos de dentro para fora e o que trazemos do lado de lá da janela para o conforto do nosso lar. Mas continuamos a voar por outros mundos e a arranjar forma de regressar.

a casa de pineapple street, jenny jackson
Super Rich Kids, Frank Ocean & Earl Sweatshirt ▫️ Fui acompanhando a leitura com uma playlist que alguém criou para o livro de Jenny Jackson e fiquei presa a esta, sobretudo por causa dos versos «Super rich kids with nothing but loose ends/Super rich kids with nothing but fake friends». Se calhar, a questão dos falsos amigos não é tão evidente no enredo, ainda que se compreenda que há sempre oportunismos, mas nota-se que há muitas pontas soltas nestas personagens, porque todas tentam perpetuar uma realidade ou distanciar-se dela. E todas as suas ações são tomadas nesse sentido. Além disso, acho que todas elas andavam à procura de um amor verdadeiro - «Real love, I'm searching for a real love».

Comentários

  1. Adoro que associes músicas às tuas leituras. Faz-me todo o sentido.

    Gostei imenso da relação que criaste entre os livros e as canções escolhidas *.*

    Beijinho grande, minha querida!

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    1. Estou a gostar mesmo muito de fazer este exercício, porque também é uma forma de perceber como é que aquela narrativa me tocou!
      Obrigada, minha querida *-*

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  2. Concordo com a Ana *.* A musica é mesmo a melhor companhia para as leituras :) E que bela resenha literaria para começar bem o ano :) Ja disse que guardei a maior parte na minha wishlist da Wook *.* Muito muito obrigada pelas partilhas, minha querida :)

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    1. Nem sempre consigo ler a ouvir música, às vezes procuro por playlists dos livros, para ajudar a entrar no ambiente. Independentemente disso, adoro fazer este exercício e criar pontes entre duas artes que fazem parte dos meus dias *-*
      Awww, que bom, fico tão feliz por saber isso, minha querida. Eu é que agradeço!

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  3. Nunca fiz algo assim do género de associar músicas aos livros, mas quem sabe um dia...

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