Inconfidências: Adiar Conversas

Imagem retirada do google

«Não te acomodes», Às nove no meu blogue


É inevitável, todos temos aquela palavra que ficou por dizer. Adiamos o tempo como se fosse um fundo inesgotável, mas quando damos por isso as oportunidades ficaram escassas. Ou porque as ligações se quebraram ou porque não era o momento indicado. E aqui levanta-se logo uma questão: o que é «o momento indicado»? Será que precisa de seguir uma série de rituais para assumir essa designação? Será que depende do nosso estado de espírito? Ou a pessoa do outro lado tem assim tantos muros que não nos sentimos mentalmente preparados para os transpor? Daquilo que fui percebendo, por vontade ou por força das circunstâncias, não há melhor momento que o agora. Por mais que doa. Porque, convencidos ou não, aquele pensamento não se liberta de nós. Mói. Corrói. E quanto mais tempo passa, mais a ferida alastra. E talvez não saibam, mas as feridas invisíveis custam mais a sarar. E deixam cicatrizes profundas.

O nosso cérebro prega-nos rasteiras. Conformamo-nos com explicações que nunca ouvimos, mas que construímos a partir dos cenários que idealizamos. Por vezes, certos. Maioritariamente, iludidos pelas falsas aparências que julgamos irrefutáveis. Sofremos, portanto, em silêncio. Alimentando os motivos ficcionais que abraçamos como uma nova realidade. E se alguém a contesta, infelizmente, estamos tão cegos que encaramos isso como uma afronta. A verdade somos nós que a sabemos, como se atrevem a duvidar? Talvez porque, num pequeno pedaço de loucura, todas as histórias têm, pelo menos, duas versões. E a nossa mágoa é tão grande que perdemos o discernimento de ouvir o outro lado, perceber as suas razões e ver para além das sequências que nos parecem lógicas. Se ao menos houvesse uma maneira de se compreender toda a verdade...

Eu sei, há conversas que assustam. E no momento em que mais precisamos, falta-nos a coragem. Já escrevi cartas para evitar o confronto direto de uma conversa assim e, estranhamente, não fiquei mais em paz por isso. Já calei a minha revolta, abrindo mais uma porta de oportunidades, e até hoje arrependo-me do que ficou por dizer. E também já fiquei à espera de conversas que nunca chegaram a acontecer. E não é justo, para nenhuma das partes. Porque há muitas perguntas pelo meio que perdem o direito a uma resposta. Acomodamo-nos. E esse é o nosso maior erro. Ficamos tão convictos de que não se irá resolver nada, que é uma perda de tempo, que nem percebemos que as pontes começam a dar lugar a muros. E que o acesso direto ao coração e à vida do outro está agora vedado. Talvez para sempre.

Logicamente, apanhamos a estrada mais óbvia: o esquecimento. Mas não esquecemos. Os diálogos sucedem-se na nossa cabeça. Há um barulho ensurdecedor, que nos agonia. Voltamos a imaginar novos cenários, com conversas que não passarão do silêncio da nossa mente. Mas se, por obra do destino, até chegam mesmo a acontecer, as palavras transformam-se numa bola de pelo que temos que expulsar do nosso corpo. E os danos são catastróficos. Irremediáveis. E o pior de tudo é que podiam muito bem ser reversíveis, caso não tivéssemos o péssimo hábito de julgar tudo à primeira; de acumular aquilo que nos afetou até o copo transbordar. Honestidade. É o que se exige, sem ser necessário pronunciar o termo, entre aqueles que se gostam. E isso aplica-se a tudo. Porque acredito seriamente que grande parte dos problemas seriam evitados se as pessoas tivessem a ousadia suficiente de resolver as situações na hora. Não a quente. Mas de mente aberta. Evitando todos os mal-entendidos [e mal dizer] que o adiar pode trazer.

Haverá sempre algo que ficará por dizer. Mas enquanto o nosso tempo não começa a descarrilar, mais vale não fechar as palavras na gaveta, para não acumularem lixo, nem envenenarem as relações. Sejam elas de que natureza forem. É que ao fazê-lo, ainda que pareça uma contradição, só estamos a adiar o inadiável: a deterioração do nosso bem-estar emocional. Porque serão mais os fantasmas do que o nosso sentimento de paz!

Comentários

  1. Como é tão verdade, há muita coisa que deixei por dizer por medo e agora já é tarde :(
    R: Eu também :)

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  2. Como compreendo isso...
    Já fui tão medrosa... Agora, ainda sou um pouco... Mas tento melhorar...

    Acho que tentamos todos...

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  3. O medo muitas vezes atrapalha, deixamos de falar, de fazer coisas por medo, tem momentos que precisamos ter coragem pra enfrentar, Andreia bjs.
    http://www.lucimarmoreira.com/

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  4. Compreendo te tão bem
    https://retromaggie.blogspot.pt

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  5. Já fui assim mas com o tempo aprendi a não deixar nada por dizer, principalmente a quem me diz tanto :)
    Mais uma vez foste de encontro ao que eu sinto :)
    Bjinhosss
    https://matildeferreira.co.uk

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  6. Acho que nunca há o momento indicado seja para o que for, é sempre o nosso "medo" a falar mais alto ao dizer-mos isso a nós próprios. "Agora não. Não é o momento certo, talvez depois", só que esse momento nunca chegará... ou pelo menos, quase nunca acontece. :)

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  7. Este teu texto fez-me recordar uma situação do passado. Uma pessoa que conheci, quis a minha amizade quando lhe interessou e depois com um email decidiu terminar tudo sem uma explicação. Já tive oportunidade de confrontar a pessoa sobre esse passado mas adio sempre. No entanto, um dia, vamos ter que falar, cara a cara.

    Beijinhos e parabéns, adorei esta nova rubrica :)

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  8. Mais vale ficar vermelho um minuto do que amarelo toda a vida...
    Em qualquer caso, devemos ser assertivos e, por isso, dizer as coisas no tempo e no tom certos.
    Um excelente texto, uma reflexão que vale a pena fazer de vez em quando.
    Gostei muito, parabéns.
    Bom resto de semana, amiga Andreia.
    Beijo.

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  9. Tanta verdade neste texto!!!
    "(...) por vontade ou por força das circunstâncias, não há melhor momento que o agora." Haverão sempre coisas que ficarão por dizer, mas quanto menos forem mais perto da paz estaremos, HONESTIDADE (como tu tão bem falaste). Se as ligações tiverem que ser quebradas serão e ao menos ficamos com a certeza de que mais nada haveria a dizer.

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  10. (Finalmente consegui comentar, não estava a conseguir comentar o teu blog desde terça feira, não sei porquê)

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  11. :) Não imaginas como apreciei este texto. Andava, há tempos, para escrever algo muito simples a propósito, mas tu tens muito mais jeito e disseste tudo. Tudo!
    Fizeste-me lembrar de pessoas, de momentos...

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  12. R: Dia 26, certo? (acho que fiz bem as contas ahah)
    Se é de Novembro e desse dia, de certeza que é boa gente :p

    É mesmo assim, devemos ser honestos sempre. Quando eu e o meu namorado passamos por uma má fase que até em risco pôs a nossa relação adiamos ao máximo a conversa que tínhamos de ter. Um dia tivemos, foi a conversa mais difícil da minha vida, pusemos os pratos todos em cima da mesa e hoje, estamos melhor que nunca, quase quatro anos e temos uma relação incrível. Há conversas que temos mesmo de ter, por mais que doam. No nosso caso não se quebrou, muito pelo contrário, melhorou-nos em todos os aspetos. (Ainda há pouco comentei isto noutro blog)

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  13. é verdade, muito ou pouco acho que todos nós já sentimos ou sentimos isto. Mas eu pessoalmente sou...uma, como se diz por aqui, desbocada. Penso e digo, nem sempre claro e nem sempre fico satisfeita mesmo que fale e fale...mas penso que não tenha assim nada com ninguém que tenha ficado por dizer...tirando certas pessoas a quem devia dizer o quanto má pessoas são e falsas e que sdsgfd ahah mas pronto isso já é outra questão acho.
    kiss

    http://inspirationswithm.blogspot.pt/

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  14. Ola bom dia, princesa :)
    Nomeei-te para uma TaG, espero que gostes ;)
    Bjinhosss e boa sexta*
    https://matildeferreira.co.uk/2017/11/10/tag-o-que-eu-mais-gosto/

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  15. Sem dúvida, meu anjo!

    Sabes que eu já pensei demasiado nisto?! De não dizer, de não fazer quando devia. Depois, paro e penso... que se realmente não o fiz, foi porque, na altura, não sentia o suficiente ao ponto de não me sair pela boca (o que teria a dizer, neste caso) sem pensar muito. Como se fosse um impulso, entendes?!
    Obviamente que, sendo eu como sou, e uma vez que não gosto nada de deixar as coisas em vão ou meio à deriva, digo sempre tudo mas de forma muito racional.

    NEW TIPS POST | ANTI-AGING CARE MUST BEGIN AT AN EARLY AGE. :D
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  16. Há conversas que por mais que tentemos adiar, são inadiáveis. E por vezes, quanto mais tentamos adiar pior torna a "situação"

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  17. Há tanto que tenho para dizer a pessoas que já não vejo.
    Este teu texto deixou um pouco de ti e também um pouco de mim para te ser sincera. É muito raro ler alguém e conseguir emocionar-se por recordar histórias passadas. Os meus parabéns linda. Deixas-te mesmo emocionada. :)

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  18. A vida é aqui e agora! Chega de adiar :)
    Gostei muito do texto!

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