Inconfidências: Diminuir Problemas

Fotografia retirada do site Forrest Mankins


«Acho covarde aquele tipo de pessoas que faz os problemas dos outros parecerem fáceis e simples; fazendo sentir-se bobos e imaturos os que não conseguem resolvê-los tão rapidamente»
Jadem Freitas dos Santos



O meu temperamento sempre foi muito pacífico. Poderia, inclusivamente, gabar-me da minha paciência - que também tem limites, apesar de tudo. Mas se há algo capaz de mexer com a minha estabilidade emocional [e racional também] é a necessidade que algumas pessoas têm de diminuir os problemas dos outros - já para não mencionar as suas tentativas sucessivas para os menosprezar.

Existem preocupações que, naturalmente, só passamos a ter quando se tornam parte integrante da nossa realidade. E isso não significa despeito por aqueles que as vivem há mais tempo. Significa, simplesmente, que o nosso foco estava voltado para assuntos que nos eram mais caros. Por exemplo, houve questões para as quais só fiquei mais consciente quando adotei os meus gatos. Até então, não é que não me preocupa-se com o bem-estar destes animais, mas como não faziam parte do meu quotidiano não me lembrava delas - nem seria possível, por não ter o devido conhecimento sobre as mesmas. Por outro lado, há preocupações que nos são bem familiares, ainda que não as sintamos na pele, como é o caso da guerra, uma vez que têm uma exposição considerável e, infelizmente, fazem parte dos noticiários com bastante regularidade. E é esta gestão de problemáticas que nós vamos abraçando diariamente, de uma forma mais ou menos consciente.

Não considero, portanto, que seja obrigação do ser humano doer-se por todos os problemas existentes. Porque, para além de não ter o super-poder de identificar a sua totalidade, também não tem todos os recursos essenciais para os tentar resolver - e não há mal nisso. O que não pode acontecer é, em primeiro lugar, rejeitar que existem muitas componentes que desconhece e, em segundo, achar que os seus problemas são mais graves e/ou mais válidos que os dos outros. Porque não corresponde à verdade. Além disso, não podemos entrar neste tipo de comparações irrefletidas e despropositadas. Tal como cada um de nós é diferente, os nossos problemas também apresentam características distintas. Por isso, devem ser encarados com o mesmo grau de seriedade e de respeito. Neste ponto, poderíamos divagar para a clara falta de empatia de determinadas pessoas, pois só isso, a meu ver, consegue justificar este tipo de atitudes!

Sei que parece surreal - e talvez incorreto da minha parte - procurar acomodar todos os problemas no mesmo patamar. Não é isso, no entanto, que pretendo fazer. Reparem, quando analisamos introspetivamente os seus contornos, percebemos que alguns perdem esse estatuto rapidamente, porque concluímos que existia um sentido superficial e até fútil na maneira como os encaramos. Perante esta constatação, a nossa resposta torna-se muito mais prática e assertiva. Contudo, enquanto não os resolvemos, não deixam de ser uma preocupação. E no nosso contexto pessoal tem impacto. E é este processo que temos que considerar. Assim, o que quero transmitir é que não temos o direito de julgar os problemas dos outros. Não só porque não os conhecemos a fundo, mas também porque não sabemos o quanto afetam quem passa por eles. O facto de não nos implicarem diretamente não é motivo suficiente para os colocarmos em causa - e mesmo que estivéssemos numa situação semelhante, continuávamos a não ser portadores desse direito, até porque todos nós temos maneiras distintas de lidar com os obstáculos que surgem no nosso caminho.

Nós não distinguimos melhor a dor do outro do que ele próprio. Por essa razão, só ele saberá como lidar com ela. Para além disso, não existem preocupações absurdas. Existe, sim, um tempo singular para cada pessoa, gerindo-as no ritmo que lhe parecer mais conveniente. Precisamos, então, de lhe dar espaço. De não a anular. E de pararmos de comparar aquilo que sentiríamos - ou como reagiríamos - se fossemos nós a viver aquela adversidade. Nós não somos o outro. E isso tem que ficar bem claro. Enquanto não calçarmos os seus sapatos, não temos qualquer legitimidade para questionar os seus problemas. Por muito que possamos estar em sofrimento, porque fomos invadidos por uma privação sufocante, não nos podemos colocar num pedestal, como se fossemos os únicos no mundo a lutar. Essa arrogância é completamente descabida. E intolerável. 

Como seria de esperar - e isso, sim, é compreensível -, se temos que enfrentar determinado problema, ele ser-nos-à mais importante que os restantes. Porque é nosso. Porque requer a nossa atenção. E porque somos nós que temos que o resolver. Mas não é a desvalorizar os das outras pessoas que nos rodeiam que isso vai acontecer. É urgente sermos mais conscientes. Mais humildes. Mais solidários. E perceber que o mundo, para além de não girar à nossa volta, já tem problemas suficientes. Não precisa que lhe acrescentemos mais um por só sabermos olhar para o nosso umbigo!

Comentários

  1. Concordo!
    Cada um enfrenta de maneira diferente o problema, não somos todos iguais. A dor é diferente.

    Beijinhos

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  2. Subscrevo a 100% o que escreveste! Concordo mesmo com tudo! :p

    amarcadamarta.blogspot.pt

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  3. Ponho me muitas vezes no lugar dos outros... sei la é uma mania minha.Infelizmente nem toda a gente é assim... calçar os sapatos dos outros é muito complicado...
    Continua assim, gostei de te ler :)
    Bjinhosss e boa semana*
    https://matildeferreira.co.uk/

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  4. O que me incomoda a mim, pode ser de simples e natural para os outros... Sempre se ouviu duzer, cada um sabe de si!
    Quem somos nós para por em causa as decisões de vida do outro, quando a nossa realidade é outra?
    Calçar os sapatos dos outros não e fácil...

    R-Fico feliz que gostem das minhas entrevistas, nelas acabo também por me por um pouco na pele dos outros...


    Beijinhos
    Sandra C.
    bluestrass.blogspot.com

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  5. Como tudo a paciência tem fim,
    a tolerância, também, igualmente
    neste à beira mar plantado jardim
    iludida, ainda, vive muita gente?

    Tenha um bom dia de Segunda-feira Andreia.

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  6. Concordo plenamente!! Cada pessoa têm diferentes capacidades para gerir emoções e lidar com as situações, se não podermos ajudar mais vale ficar quietos a opinar!!

    Beijinhos

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  7. Assino por baixo, e infelizmente tenho vindo a notar isto em algumas pessoas que no meu circulo de amizades. Todos temos problemas e lá está a arrogância de acharem que só os problemas deles importam e muitas vezes não respeitarem os meus limites, até mesmo de privacidade levou-me a reavaliar algumas coisas. Acho sim que devemos ter a humildade de reconhecer que o MUNDO vai para além de nós mesmos, que os problemas dos outros são válidos e devem ser levados em consideração. E não menos importante devemos escutar ao em vez de começar uma disputa sobre quem tem problemas maiores.
    beijinhos :)

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  8. Concordo plenamente! Como diz o ditado popular: cada um com os seus problemas. =)

    Beijinhos e boa semana!

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  9. Cada um sabe as dores e as delícias de ser o que é. Menos menosprezo e mais empatia, né Andreia? Um abraço!

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  10. Tens toda a razão! Essa frase de abertura não podia ser mais verdade!

    Bjxxx
    Ontem é só Memória | Facebook | Instagram

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  11. Costumam dizer que eu sou Boa ouvinte :) mas também não gosto de pessoas que só ela têm problemas.
    Evito as, até.
    Beijinhos linda.

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  12. Infelizmente... É algo para ser trabalhado aos poucos no nosso interior, né?!

    Concordo plenamente com tudo que escreveu. Ninguém sabe exatamente o que cada pessoa passa! Um exemplo é que aqui no Brasil está em alta a discussão de como as mulheres sofrem desigualdades apenas porque são mulheres. E então chegam alguns homens querendo saber mais do que as próprias mulheres que vivem essa triste realidade. Fico bem chateada com isso, sabe?! Tem coisas que não podem ser julgadas. Não tem como mesmo!

    Ótima terça!

    Beijo! ^^

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  13. É incríiiiivel :D Já não o dispenso!!

    Ora, é mesmo isto!! A minha paciência também é grande. Aliás, aprendi a ganhá-la com o tempo e mantê-la bem presente na minha mente - porque é necessário. Aprendi a desvalorizar os MEUS problemas com o intento de, primeiro, não pensar tanto neles e, segundo, não massacrar as pessoas que me rodeiam com eles... ainda que saiba que seriam as primeiras pessoas a apoiar-me. Contudo, já tive pessoas à minha volta, com quem (na minha modéstia inocência) pensei que pudesse desabafar. O que aconteceu foi o que tu dizes: a pessoa acabava por não mostrar o ponto de vista mas dar a conhecer aquilo que já tinha passado, como se de uma comparação se tratasse... e isso é tão errado. Acaba por confundir mais e a fazer-me sentir pequenino como se o meu problema fosse algo "brejeiro".
    Com tudo isto acabei por começar a guardar tudo para mim, na medida dos possíveis, e a saber com quem, efetivamente, posso contar. Também aprendi a não sofrer as dores do outro mas a dar-lhes alento para dar um passo em frente... porque isso é muito importante!

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  14. «Enquanto não calçarmos os seus sapatos, não temos qualquer legitimidade para questionar os seus problemas.» Não tenho muito mais a acrescentar ao que escreveste, pois partilho da mesma opinião.
    As pessoas e essa mania do "eu também tenho problemas" ou "eu estou a sofrer mais do que tu" não me cabe na cabeça. Somos pessoas diferentes, com características e personalidades diferentes, logo temos maneiras diferentes de reagir às coisas. Não devemos desvalorizar os problemas dos outros e olharmos só para nós, claro que o meu problema me dói mais a mim do que ao outro, porque é meu. É normal, mas os outros têm os deles e são válidos, pois não somos nós que estamos a viver a vida daquela pessoa.

    Mais uma vez, escreveste o que eu penso!

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  15. Gratidão imensa por citar uma reflexão minha, que já nem lembrava.
    Mas foi com satisfação e alegria que pude recordá-la através desse post.

    Grato!
    Jadem Freitas dos Santos
    jademfreitass@hotmail.com

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