TODAS AS COISAS MARAVILHOSAS

Fotografia da minha autoria



«A importância de nos deslumbrarmos com as coisas que nos rodeiam»


A primeira vez que ouvi falar sobre o monólogo escrito por Duncan Macmillan - Every Brilliant Thing - foi no podcast Ponto Final, Parágrafo. A forma apaixonada como o Ivo Canelas conversou sobre o texto deixou-me com imensa vontade de o ler, no entanto, visto que ainda não está traduzido, o encontro não se proporcionou.

Quando percebi que o Ivo Canelas o iria representar, quis muito que a peça viesse ao Porto, porque 1) é um dos meus atores favoritos e 2) seria uma oportunidade única. Depois de quatro temporadas esgotadas em Lisboa, e de eu ter falhado as datas na cidade Invicta (no Hard Club), chegou o momento e não o desperdicei.


QUANDO UMA LISTA NOS PODE (OU NÃO) SALVAR

Todas as Coisas Maravilhosas acompanha uma criança que, à medida que cresce, assume a missão de escrever uma lista de coisas pelas quais vale a pena viver. E fá-lo com um intuito bastante particular: procurar ajudar a mãe a recuperar de uma depressão, depois da sua primeira tentativa de suicídio. Esta viagem começa aos sete anos, evolui e mostra-nos as várias camadas desta realidade, que nos desarma por completo.

Sabia pouco daquilo que me esperava e, ao mesmo tempo, sabia o essencial, porque a magia da peça passa muito pelo que desconhecemos, para não condicionar o envolvimento e o modo como o texto terá impacto em nós. Talvez por esse motivo tenha passado todo o monólogo (ou quase monólogo) em alvoroço emocional, a sentir o coração acelerado, a sentir a necessidade de respirar fundo e a sentir o meu humor a oscilar: tão depressa libertava uma gargalhada como regressava a um estado de pura comoção. E, sim, houve lágrimas.

A saúde mental é o foco deste texto e, embora seja um assunto delicado, com ramificações pesadas, foi trabalhado com o maior cuidado. E é impressionante como algo tão simples como uma lista consegue esconder um propósito tão poderoso. Portanto, numa base complementar, é um argumento que nos sensibiliza para a importância de discutir sobre saúde mental, de identificar sintomas e formas de agir, enquanto nos relembra que é fundamental deslumbrarmo-nos com as coisas que nos rodeiam - por mais simples que sejam.


Foram duas horas inebriantes, com uma interpretação que me deixou quase hipnotizada. Não tinha qualquer dúvida do quanto o Ivo Canelas é um ator brilhante, mas sinto que se superou, que atingiu um patamar que poucos alcançam. Eu estava consciente que aquela não era a sua história e, no entanto, acreditei que poderia ser. Aqueles não eram os seus tramas, nem eram as suas mágoas e, apesar disso, senti-os como se fossem. Foi uma simbiose plena e, por isso, senti tudo: os silêncios prolongados, os passos, as palavras quase declamadas, o olhar de quem, de facto, nos vê, a respiração e o ritmo a alterar entre a euforia e a tristeza.

Houve momentos intensos, por vezes desconfortáveis, porque não pode existir conforto na certeza de já não querermos viver. Por outro lado, a alegria e o amor também foram paupáveis, porque a vida constrói-se nesta dicotomia - a diferença é que temos mecanismos que nos aproximam ou nos afastam do abismo. A própria cadência da peça está muito alinhada com as nuances de quem se debate com uma história semelhante.

Honestamente, ainda me parece surreal ter testemunhado esta experiência tão visceral, que não se limita ao ator e ao palco: transcende para a plateia. Todas as Coisas Maravilhosas distancia-se de todos os padrões que associamos a uma peça de teatro. É arrebatadora, inesquecível. E, caso venha a fazer a minha lista de coisas maravilhosas, ter visto Ivo Canelas a interpretar o texto de Duncan Macmillan, no M.Ou.Co, será uma delas.

Comentários

  1. Que experiencia incrivel *.* Gosto muito do Ivo :)

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    1. Espero que haja essa possibilidade, Francisco 🤞🏻
      Continuação de boa semana

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  3. Deve ter sido uma experiência transcendente.
    Vou pesquisar sobre esta peça, confesso que desconhecia.
    Beijinho grande, minha querida!

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    1. Foi mesmo, minha querida, quer pelo texto em si, quer pela interpretação. Quer dizer, acho que ainda mais pela interpretação, porque a entrega do Ivo Canelas é fascinante

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  4. Que deve ter sido uma experiencia bastante incrivel.
    Beijinhos
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  5. É uma experiência incrível e difícil de descrever.
    Amei a peça ❤️

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    1. Sinto que escrevi imenso, mas que não consegui transmitir 1/3 do que senti/vivi durante a peça. Que obra de arte

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  6. Parece ter sido interessante e giro de se ver 😉

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