SILENCIAR OS MACAQUINHOS NO SÓTÃO

Fotografia da minha autoria



«É só mais um ataque, é só ansiedade»


A insegurança é demasiado vocal em momentos inoportunos. Metaforicamente, sabem quando estão naquele espaço benigno de um projeto a começar, onde coexiste um certo medo e o entusiasmo da descoberta? Por norma, é nessa etapa que sinto o impacto das suas ramificações e que as minhas emoções vão oscilando.


OS MACAQUINHOS NO SÓTÃO

Há uns dias, tive um ataque extremo de síndrome do impostor. Foi silencioso, porque a minha tendência é de tentar que estas reações não interfiram nas conversas em movimento, mas sei que pesou, sei que me deixou com a energia em números quase negativos. Não chegou ao ponto de querer terminar com todas as iniciativas que tenho em curso, no entanto, fez-me reconsiderar a validade de cada uma delas e a sua pertinência.

Tenho presente o gatilho: as dúvidas foram todas desencadeadas quando recebi um e-mail a anular a subscrição na newsletter - Portugalid[Arte] -, porque o primeiro pensamento foi: o que é que fiz de errado para afastar aquela pessoa? Depois há-de chegar a fase em que racionalizo e me recentro, mas, até chegar aí, existem muitas peças para encaixar, para serenar, porque revisito o que fiz, transponho as incertezas para outras áreas criativas e acabo a comparar as propostas que tenho com outras dentro do mesmo género. Tenho plena consciência que é errado apanhar boleia desse pensamento. É tóxico, contudo, também é inevitável.

Estou preparada para estas eventualidades, acho que sempre estive, e quero ser a primeira a deixar o outro confortável para partir, quando o conteúdo deixar de lhe fazer sentido. Fico sempre grata por quem decide ficar, nas não quero nada que sinta a obrigação de permanecer, se já não lhe interessa. Isso faz parte de um processo de autoconhecimento, portanto, acho maravilhoso quando distinguimos o que é para manter e o que já não nos serve. Mas dói estar do lado de lá a perceber que o que temos para dar não encaixa no outro.

A partir daqui, parece que há um sentido que se apura ou que os astros se alinham para nos aumentar a ferida. De repente, cruzas-te com o entusiasmo multiplicado por um projeto que parte de uma base na qual investes e perguntas-te onde falhaste. De repente, há uma sensação irritante a ecoar: desenvolvi esta proposta e a mesma passa despercebida, mas aquela pessoa apresenta algo similar e a aceitação é em massa, há outra envolvência, outra adesão. Eu pensei-o e não adorei sentir que estava a alimentar um comportamento mesquinho. Ainda para mais, porque depende sempre da comunidade que agregas, da visibilidade que tens e que dás ao conteúdo, da disponibilidade dos demais, que nem sempre se ajusta ao teu encanto pelo que desenvolves - às vezes, também é importante saber que aquilo que fazemos não é assim tão incrível e que, por isso, não atrairá a atenção de terceiros. De um modo racional, sei que existe um conjunto de fatores que influencia esta troca, mas há um segundo em que resvalo para a frustração, porque parece que os outros são sempre melhores e porque é complicado olhar ao nosso redor e interiorizarmos que somos invisíveis.

Desmotivei de tal maneira, que precisei de ocupar a cabeça. Então, fui criar. Quando dei por mim, tinha o design do Alma Lusitana para 2024 praticamente definido e o de outra iniciativa alinhado. Isso fez-me pensar que, afinal, continuo a não estar disposta a abdicar do meu conteúdo por causa da síndrome do impostor.

Os macaquinhos no sótão têm força. Já o escrevi antes, mas reforço: não é um capricho, as nossas inseguranças conseguem ser paralisantes. Não existe uma intenção de romantizar a situação, existe apenas uma vontade de mostrar que isto existe, que é uma realidade que exige compromisso para que não nos vença.


SILENCIAR OS MACAQUINHOS NO SÓTÃO

O peito acelera e acho que nunca conseguiremos silenciar estas vozes na totalidade. Ainda assim, defendo que existem estratégias e uma delas talvez seja começar por aceitar que estas oscilações acontecem, que haverá sempre um momento em que iremos duvidar e que ficaremos a cogitar no assunto. Mas, depois, da mesma maneira que algo nos atira para o charco, também há uma palavra, uma partilha que nos reergue.

Em termos concretos, já pensei desistir do grupo do Alma Lusitana no Goodreads, porque não sei até que ponto é útil. Num dos dias em que este pensamento estava bastante audível, recebi uma mensagem a destacar que aquele desafio seria excelente para apostar em autores nacionais e isso fez-me reconsiderar: talvez o grupo não fosse assim tão irrelevante. Também já me questionei muito sobre a pertinência do clube/desafio de leitura em si, visto que, felizmente, têm surgido várias iniciativas para valorizar os nossos autores. O que é que o meu tem de diferente, de transformador? Se calhar, nada, se calhar, tudo, porque é meu e a minha visão não é igual à dos outros. Isso não o torna melhor ou pior, só o torna meu, de portas bem abertas para quem quiser embarcar na viagem. E, enquanto estou no meio deste conflito, percebo que começo a apontar ideias para 2025, porque 2024 está encaminhado, e ouço-me a dizer: é por isso que continuo.

Por outro lado, sobretudo este ano, interroguei-me muito acerca da minha identidade no digital e senti-me um pouco perdida. A título de exemplo, já não me identificava com a narrativa que estava a construir no Instagram e voltei ao ponto de partida: fará sentido partilhar o que partilho, com a frequência com que o faço? Os números nunca me moveram, mas, nestas circunstâncias, fazem-se notar, já que o alcance se mantém desalinhado da dedicação e só pode existir uma explicação para tal: não sou boa o suficiente. E, se é assim, valerá a pena insistir? Mesmo no blogue, que é a minha prioridade, senti uma quebra significativa, o que me fez pensar que a minha forma de comunicar também se perdeu, potenciando o afastamento. Este efeito de bola de neve colocou a descoberto as comparações e as inseguranças voltaram a assumir o protagonismo.

Há alturas em que também não ajuda sentir que os nossos não estão assim tão investidos naquilo que desenvolvemos (ou aparentam não estar). Não considero, de todo, que tenham de nos acompanhar ao detalhe, porque os seus gostos nem sempre encaixam naquilo que é o nosso motor. E está tudo bem com isso. Hesitei muito antes de escrever este parágrafo, uma vez que, se o lerem, não quero que sintam que lhes cobro, nunca seria capaz disso, ainda para mais quando já foram o meu colo em tantas circunstâncias e quando reconheço que nem sempre sou a maior chefe de claque dos seus projetos paralelos. Apesar disso, não deixa de custar, sobretudo, se forem tão atentos aos conteúdos de quem não conhecem. Às vezes, seria bom tê-los a ocupar a primeira fila. Fica esta nota para o futuro, porque é esta atitude que quero manter: por mais que não partilhemos aquela preferência, quero lá estar apenas porque é um ponto de interesse de quem quero bem.

É muito fácil perdermo-nos nesta espiral de síndrome do impostor. É ainda mais fácil permitir que estes pensamentos levem a melhor. No entanto, enquanto combato mais uns quantos (escrever este texto é uma forma de luta), obrigo-me sempre a pensar nas minhas motivações: criei o blogue porque adoro escrever e mantenho-o pelas mesmas razões. Avancei com o Alma Lusitana porque quero continuar a descobrir novas vozes literárias e fico feliz por haver alguém a querer seguir o mesmo caminho. Optei por transformar a Portugalid[Arte] numa newsletter porque acredito que temos imenso talento no nosso país e quero partilhá-lo de uma forma mais imediata. Enviei o meu manuscrito porque me reencontrei com a poesia e sei que é o meu lugar. Continuo a escrever contos a partir de um título porque me desafia. Hei-de avançar com uma ideia em pausa porque quero explorar novos formatos. Portanto, sei que há um profundo amor naquilo a que me dedico e, por mais cliché que isso seja, é o mais importante. Posso duvidar, mas não me esquecerei das origens.

Os macaquinhos no sótão permanecem cá e acho que fizeram morada em mim com contrato vitalício. Aceito. Hei-de arranjar maneira de os revestir com um pouco de silêncio, para que a casa fique arrumada e eu me encontre sempre no meio do caos - mesmo que sejam três da manhã e eu esteja em frente ao computador, com a página do canva aberta, a curtir a minha neura e a criar a nova identidade de projetos que adoro.

8 Comments

  1. É sempre difícil encarar de pé e de frente as incertezas. Custa ultrapassá-las. Mexem fortemente connosco. Mas penso que fazem parte de todo o processo, vai haver sempre momentos em que pomos tudo em causa. Precisamos é de ter alicerces fortes para as ultrapassar.
    Força, minha querida. Não desistas.
    Beijinho grande.

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    1. Não podia estar mais de acordo contigo. Talvez seja um lugar comum, mas a verdade é que nenhum caminho se faz sem estas indecisões. Teremos sempre dúvidas e é importante percebermos isso mesmo, para, depois, sermos capazes de encontrar ferramentas que não nos impeçam de seguir.
      Obrigada, de coração!

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  2. Não estás sozinha nisto, acredita. Eu estou sempre a "mandar vir" com os meus macaquinhos e se ha coisa que me faz lutar contra eles é ouvir podcasts como o Isso nao se diz, é a minha terapia semanal :) O Bruno lê-me a alma. Quanto ao tema deste post, se te faz bem, nao desistas *.*

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    1. Sim, é verdade, ter esse contacto ajuda muito a ocuparmos os nossos pensamentos e, até, a aprendermos a relativizar certas coisas.
      Obrigada 🥺

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  3. Nem sempre tudo é fácil, mas como sempre digo um passo de cada vez que acabamos por chegar lá
    Beijinhos
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    Tem Post Novo Diariamente

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