furriel não é nome de pai, catarina gomes
Fotografia da minha autoria |
Gatilhos: Referência a Violência, Violação, Morte e Aborto
O livro Coisas de Loucos foi um dos que mais me marcou: quer pela escrita da autora, quer pela forma como partiu de objetos perdidos para traçar o retrato de um lugar, de pessoas anónimas e de uma época. Por esse motivo, estava desejosa de me reencontrar com Catarina Gomes e finalmente consegui alinhar-me para descobrir outra obra sua.
histórias que ficam no silêncio
Furriel Não é Nome de Pai conta-nos a história dos «Filhos do Vento»: os filhos que os militares portugueses deixaram na Guerra Colonial. Considerado, pela autora, como um livro de pós-reportagem, uma vez que surgiu após as peças que fez para o Público, quebra o silêncio sobre esta realidade pouco visível, mas que deixou marcas profundas.
Na tentativa de compreender o sucedido, Catarina Gomes foi até à Guiné-Bissau, em 2013, «levando na mala um dos maiores tabus» da sociedade portuguesa e mostrando-nos que estas crianças foram rotuladas como filhas do inimigo, o que as fez sofrer represálias constantes e permanecer segregadas, privadas de uma parte crucial da sua identidade. É fácil procurarmos por culpados, e a verdade é que eles existem, mas a responsabilidade não se encerra nestes homens (nem todos pais na designação exata do termo): não só porque alguns voltaram para Portugal sem saberem que deixaram descendência, mas também porque o próprio Estado português «nunca fez um esforço para conhecer a dimensão» da situação e para lhes garantir direitos. Assim, estas crianças cresceram a tentar encaixar peças onde só encontravam silêncio e vazios.
Todas as histórias apresentam um denominador comum, por isso, sabemos que estes nomes e estes rostos, que não vemos, mas imaginamos, poderiam ser outros; por isso, sabemos que todos sentiram na pele a discriminação pela cor da pele e o seu futuro hipotecado. Não que lhes tenha faltado colo e amor, não que as mães e os padrastos lhes tenham falhado com o essencial, mas faltou-lhes a verdade e a possibilidade de serem aceites. E é desolador perceber que toda a gente à nossa volta tem noção do que aconteceu menos nós. Quer queiramos, quer não, isso também molda o nosso caráter.
Na tentativa de compreender o sucedido, Catarina Gomes foi até à Guiné-Bissau, em 2013, «levando na mala um dos maiores tabus» da sociedade portuguesa e mostrando-nos que estas crianças foram rotuladas como filhas do inimigo, o que as fez sofrer represálias constantes e permanecer segregadas, privadas de uma parte crucial da sua identidade. É fácil procurarmos por culpados, e a verdade é que eles existem, mas a responsabilidade não se encerra nestes homens (nem todos pais na designação exata do termo): não só porque alguns voltaram para Portugal sem saberem que deixaram descendência, mas também porque o próprio Estado português «nunca fez um esforço para conhecer a dimensão» da situação e para lhes garantir direitos. Assim, estas crianças cresceram a tentar encaixar peças onde só encontravam silêncio e vazios.
Todas as histórias apresentam um denominador comum, por isso, sabemos que estes nomes e estes rostos, que não vemos, mas imaginamos, poderiam ser outros; por isso, sabemos que todos sentiram na pele a discriminação pela cor da pele e o seu futuro hipotecado. Não que lhes tenha faltado colo e amor, não que as mães e os padrastos lhes tenham falhado com o essencial, mas faltou-lhes a verdade e a possibilidade de serem aceites. E é desolador perceber que toda a gente à nossa volta tem noção do que aconteceu menos nós. Quer queiramos, quer não, isso também molda o nosso caráter.
«O pai que naquele instante ganhou rosto e corpo, mas permanece bidimensional, impalpável, terá mais cor para ter mais vida»
Sinto que fui avançando na leitura com o coração nas mãos, porque a esperança dá lugar à revolta, porque o humor camufla a tristeza e porque existem perguntas que continuam sem resposta. No meio de inúmeras frases impactantes, permitam-me transcrever uma que não me sai do pensamento, já que me parece uma prova fiel do quanto estas vidas ficaram condicionadas: «Nunca namorei com uma pessoa clara, tinha medo que fosse filha do meu pai». Foi impossível ficar indiferente a esta imagem.
Furriel Não é Nome de Pai é, acima de tudo, um trabalho de empatia e de dignidade fabuloso. Embora não seja possível anular o passado, reverter o que viveram, a autora assumiu a missão de tentar unir estas famílias e, sem julgar escolhas, também não escondeu o desalento e a frustração que sentiu durante o processo. Como alguém destacou, há uma grande diferença entre «aceitar um filho e conhecê-lo», no entanto, Catarina Gomes trouxe um aconchego diferente a esta obra: por sabermos que aquelas pessoas não ficaram esquecidas. Ela deu-lhes voz, reunindo o que ficou por contar.
🎧 Música para acompanhar: Filha da Tuga, Irma
Furriel Não é Nome de Pai é, acima de tudo, um trabalho de empatia e de dignidade fabuloso. Embora não seja possível anular o passado, reverter o que viveram, a autora assumiu a missão de tentar unir estas famílias e, sem julgar escolhas, também não escondeu o desalento e a frustração que sentiu durante o processo. Como alguém destacou, há uma grande diferença entre «aceitar um filho e conhecê-lo», no entanto, Catarina Gomes trouxe um aconchego diferente a esta obra: por sabermos que aquelas pessoas não ficaram esquecidas. Ela deu-lhes voz, reunindo o que ficou por contar.
🎧 Música para acompanhar: Filha da Tuga, Irma
📖 Outro livro lido: Coisas de Loucos
Não conhecia, mas parece ser uma boa leitura 😊
ResponderEliminarHá partes que são autênticos murros no estômago, mas a escrita e a sensibilidade da autora cativam
EliminarFiquei curiosa.
ResponderEliminarParece-me uma leitura interessante.
Beijinho grande, minha querida!
Aconselho imenso, minha querida!
EliminarMais um para a lista *.* Muito obrigada pela partilha :)
ResponderEliminarBoas leituras, minha querida 💛
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