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ESCRITORES & AMORES, LILY KING

Fotografia da minha autoria



«Uma escritora parada na vida»

Gatilhos: Fim de Relacionamento, Morte, Luto


Os motivos que nos levam a ler certos livros podem ser muito diversos. O da Lily King, por exemplo, entrou no meu radar por causa da tradução, que foi feita pela Lénia Rufino. De outra forma, talvez não me suscitasse interesse ou demorasse a chegar à sua história. Assim, entrou na lista de prioridades e ainda bem que o li.


ESCREVER PARA QUE TUDO FIQUE MELHOR

Escritores & Amores é sobre Casey Peabody, uma mulher de 31 anos, empregada de mesa num restaurante, mas cuja missão é ser escritora. Há seis anos que está a trabalhar no seu romance, mas parece não conseguir desbloquear. Como se essa situação não fosse complexa por si só, viu-se obrigada a gerir outras circunstâncias: a morte da mãe, o inconstante processo de luto, os comportamentos impróprios do pai e um vertiginoso triângulo amoroso. Embora a façam sentir que tem pouco a dizer, acredito que a protagonista tem uma visão importante para partilhar - ainda que viesse só a escrever para que as coisas não piorassem.

«- É como se houvesse uma barreira entre mim e o mundo»

O início, admito, foi complicado de transpor, porque havia muita informação para assimilar. Não necessariamente ao nível de acontecimentos, mas mais numa perspetiva emocional. Casey sente-se perdida, angustiada, com vários problemas para solucionar e nós sentimos tudo isso. Aliás, houve momentos em que também eu fiquei atormentada, quase em apneia, como se estivesse naquele lugar. Portanto, ultrapassado o primeiro capítulo, aproximei-me muito mais da narrativa. Não foi amor à primeira vista, mas, tal como noutras situações, só precisei de não desistir, para descobrir as camadas maravilhosas que não estão à superfície.

«Não nos apercebemos do esforço que fizemos para encobrir as coisas até tentarmos desenterrá-las»

Um dos pontos fortes desta obra, para mim, é o quanto se torna relacionável. Eu não passei pelos mesmos dramas familiares da protagonista, não sei o que é estar há tanto tempo a escrever um romance, muito menos conheço o sufoco de ter tantas dívidas acumuladas, por causa de empréstimos académicos, mas consigo rever-me nas inseguranças, na rejeição, no percurso de escrita dúbio, na sensação de vermos o tempo a passar e de estagnarmos; consigo rever-me na paixão pelas palavras, nas hesitações e naquela linha ténue que separa a nossa independência da perceção de estarmos a ficar para trás. Será que o sonho compensa?


ESTABILIDADE VS DAR ESPAÇO AOS SENTIMENTOS

Reconheço, também, que a parte dos relacionamentos amorosos não foi a minha favorita, talvez por ter sentido falta de uma contextualização maior; talvez por esperar que algumas cenas apresentassem dilemas mais profundos. Não obstante, gostei das dicotomias: de um lado, Casey tinha um homem que lhe traria estabilidade, conforto e, quem sabe, uma noção de família; do outro, tinha um homem que, mesmo não lhe prometendo isso, lhe traria emoção e aquele frio na barriga que nos faz sentir vivos, validados. Sendo homens com idades distintas, é interessante perceber o que procuram e o que têm para lhe oferecer, tendo a conta a experiência de cada um. Para uma mulher de 31 anos, que continua a sofrer com o estigma e uma pressão social tão expressiva, nem sempre é fácil decidir qual o caminho a seguir: jogamos pelo seguro ou arriscamos?

«Talvez não seja demasiado cedo. Se calhar o meu lugar é aqui»

Escritores & Amores perde um pouco de força pelos cortes abruptos em temas centrais, mas brilha pela construção das personagens, pela credibilidade e por ter uma escrita que nos agrega, que dá voz a dúvidas que nos tocam a todos - mesmo a quem não pretende publicar um livro. Esta história pode não ter revolucionado a minha vida, mas sei que não a esquecerei. Sobretudo, sei que, lá no fundo, dei a mão a Casey, porque também continuo à procura do meu lugar no mundo. E, se escrever, tudo parecerá melhor.


🎧 Música para acompanhar: The River, David Byrne


DISPONIBILIDADE: Wook | Bertrand

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Comentários

  1. Fiquei muito curiosa com a narrativa deste livro.
    Mais um para a Wishlist da WOOK.
    Beijinho grande, minha querida!

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    Respostas
    1. Foi uma bela surpresa. Há partes que podiam ser um bocadinho mais exploradas, porque beneficiavam com isso, mas achei a história muito relacionável

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  2. Que me parece ser mais uma boa sugestão
    Acho que vou levar a sua dica desse livro para quem adora muito ler cá em casa
    Beijinhos
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    Tem Post Novo Diariamente

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  3. Nunca li, mas a capa não me é estranha.

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