lugar 54

Fotografia da minha autoria


Os parques de estacionamento são espaços funcionais, que cumprem um propósito muito específico. Mas já pararam para pensar na quantidade de histórias que podem esconder, sem que nunca sejamos capazes de as desvendar? Eu nunca tinha feito esse exercício de análise, até que assisti à mais recente produção nacional da RTP Lab.

Lugar 54, composto por cinco episódios, parte do mesmo cenário para nos mostrar a pluralidade de narrativas que conseguem passar pelos mesmos metros quadrados, ao longo do dia. Bernardo Lopes e Francisco Mira Godinho procuraram criar um lugar comum, onde seria fácil rever-nos, porque existem pedaços destas histórias que, de facto, podiam pertencer-nos. Assim, do drama à comédia, e com um toque de terror pelo meio, acompanhamos momentos distintos, que levantam inúmeras perguntas.

Não quero entrar em detalhes, para não correr o risco de relevar demasiado sobre os episódios, mas sei que fiquei com outra perspetiva dos sítios por onde passo, daquilo que guardam sem que esses fragmentos nos toquem, daquilo que vai acontecendo em simultâneo sem que sejamos capazes de marcar a trajetória e viver as suas nuances. Aliás, quando voltar a um parque de estacionamento, sei que darei por mim a pensar na quantidade de realidades que se cruzaram ali e que acabaram por seguir caminho.

Neste lugar de passagem, um carro avança, deixando as marcações vagas, e outro chega para o ocupar, sem fazer ideia «das emoções que nele habitaram», do medo, das promessas que se quebraram, do desencanto, dos diálogos intensos, dos pensamentos, da esperança e/ou da carência de futuro. As histórias sobrepõem-se, no entanto, são incontáveis, porque fora dali mais ninguém as conhece, ainda que possam estar a viver algo semelhante. E foi esta noção que mais me fascinou na série, porque é como se estivéssemos a assistir a um jogo de luzes e de sombras ou, então, a contar segredos.

Lugar 54 traz-nos planos de fuga, problemas com drogas, memórias que se esfumam, conversas inconsequentes, deslumbramento e crime. Não me senti impactada em todos os episódios da mesma forma, talvez por estar longe de algumas experiências, mas gostei bastante da humanidade que espelharam, da credibilidade das reações e do facto de deixarem perguntas em aberto, porque a verdade é que não permanecemos nos locais durante os mesmos períodos de tempo, portanto, há coisas que acabaremos por não descobrir. Essa janela entreaberta aguça a curiosidade para vermos mais.

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