Avenida Q

Fotografia de Filipe Ferreira

«O que vai atrair as pessoas é a estética e a própria linguagem. Neste espetáculo, a linguagem é meio de programa infantil, mas torna a coisa muito engraçada porque os temas abordados são bastante adultos», Rui Melo


O Teatro é uma arte que me atrai. No entanto, erradamente, usufruo muito pouco do seu ambiente único, intenso, sem rede. E isso é algo que pretendo mudar. Quando, no Natal, os meus pais receberam bilhetes para irem ao Sá da Bandeira, partilhei logo a minha vontade de lhes fazer companhia. E reforcei-a assim que vi qual seria a peça!

Avenida Q é um musical de 2003, originalmente escrito e produzido por Robert Lopez, Jeff Marx e Jeff Whitty. A versão portuguesa foi adaptada e encenada, respetivamente, por Henrique Dias e Rui Melo. Mantendo-se fiéis ao conceito, houve, naturalmente, necessidade de apropriar o texto a um contexto que fizesse sentido e que estivesse enquadrado na nossa realidade, para que as piadas resultassem. Além disso, também o nome de algumas personagens sofreu uma mudança. Em cena desde dia 11 de janeiro até 25 de fevereiro, é a vez do Porto render-se a este espetáculo irreverente.

A minha curiosidade em relação à Avenida Q aumentava sempre que via alguma partilha por parte dos atores. Mas, apesar de ter uma ideia do que seria, a verdade é que estava longe de imaginar a experiência que me permitiria viver. Porque aquilo que se passa em palco é absolutamente surpreendente. Na página de facebook [aqui], definem-na como «o musical mais estúpido e genial de todos os tempos», no entanto, de estúpido tem muito pouco [já para não dizer nada]; quanto à segunda parte, estamos inteiramente de acordo. Durante uma hora e meia, sem qualquer pausa, o elenco põe de parte o politicamente correto. E fala sobre assuntos importantes - como o racismo, o desemprego, a homofobia - com muita brincadeira pelo meio. No fundo, nota-se que tem maturidade suficiente para não se levar demasiado a sério. Em consequência disso, encontramos um grupo coeso e com uma energia contagiante. Espontaneamente, conquista as gargalhadas do público. E faz com que todos se envolvam na história.

Nesta «Rua Sésamo em esteróides, que junta à estética dos Marretas uma linguagem adulta», pessoas e bonecos coexistem e aliam-se para encontrar um propósito na vida. Luís é um recém-licenciado sem emprego, Marta é uma monstra que nunca encontrou o amor, Paula é a porca [e a figura que enlouquece os homens], Trekkie é um tarado viciado em pornografia, Tozé perdeu o emprego, Maria é uma psicóloga vítima de racismo, Joca não tem dinheiro para viver sozinho, por isso partilha casa com Félix, que é um gay que ainda não saiu do armário. Talvez fossem problemas suficientes para esta Avenida, mas ainda há lugar para o Pequeno Saúl, que foi roubado pelos pais e agora é porteiro. E assim se percebe que somos confrontados por situações reais, levando-nos a refletir sobre a transição para a vida adulta, onde nem tudo acontece como idealizamos. 

A produção é extraordinária. E é preciso destacar a exigência desta peça, porque os atores têm que cantar, dançar, interpretar, contracenar e dar vida a bonecos inanimados, tudo em simultâneo, num ritmo alucinante, respeitando entradas e saídas de cena regulares. Focando-me especificamente numa das ações anteriores, aprender a coordenar a boca do boneco com as falas, atribuindo-lhes também expressões e movimentos não é, de todo, fácil. Por isso é que o produto final é tão fascinante, pois sente-se o compromisso de todo o elenco, que desempenha os diversos papéis na perfeição e com grande generosidade. Honestamente, sinto que foram escolhidas as pessoas certas. Com muito humor, seriedade, ironia e cantoria [ou não estivéssemos a falar de um musical], Ana Cloe, Diogo Valsassina, Samuel Alves, Gabriela Barros, Inês Aires Pereira, Rodrigo Saraiva, Rui Maria Pêgo, Manuel Moreira, André Galvão, Luís Neiva e Artur Guimarães merecem um prolongado aplauso de pé, como, aliás, aconteceu, por darem vida a uma peça de extrema qualidade. E por fazerem-no de uma forma tão brilhante.

Ri-me. E muito. Emocionei-me. Cantei. Dancei sem sair do lugar. Revi-me em certos pensamentos e fases. Não dei pelo tempo passar. E rendi-me por completo. Com toda a certeza, estou pronta para ver novamente. Se querem um conselho, não percam esta oportunidade. E esgotem o Sá da Bandeira, porque vale bem a pena!


Alguém já viu a Avenida Q?

Comentários

  1. Ainda no domingo passado fui assistir, no Teatro Sá da Bandeira, no Porto à peça a Ressaca com Carlos Cunha e gostei.


    Isabel Sá
    Brilhos da Moda

    ResponderEliminar
  2. Olha, fiquei bem cheia de vontade de o ver! E também adoro teatro, só tenho pena de não ter a oportunidade de ir mais vezes! Beijito*

    ResponderEliminar
  3. Se estivéssemos em Portugal, está peça não nos escapava :) Adoro o Teatro Sa da Bandeira :)
    Bjinhosss
    https://matildeferreira.co.uk/

    ResponderEliminar
  4. Já não vou ao teatro a imenso tempo mesmo mas pela descrição que fizeste fiquei mesmo curiosa e com vontade de ver. Pena ser longe de onde moro.

    ResponderEliminar
  5. Teatro não é algo que vja com frequencia, mas também gosto muito. A peça que mais gostei de ver foi o Ulisses :)
    Mas esse tem ar de ser igualmente maravilhosa.

    XOXO|| diamonds-inthe-sky.blogspot.pt

    ResponderEliminar
  6. Sou fã de teatro e até já fiz peças de teatro. Estar em cima de um palco é um misto de emoções mas ao mesmo tempo é libertador. Já não vejo uma peça há 3 anos e tenho imensas saudades tanto de ver como de participar numa. Ótimo post! Beijinhos

    www.carolinafranco.pt

    ResponderEliminar
  7. Só fui o teatro uma vez, acho que vi a peça Falar Verdade a Mentir e na altura, gostei imenso.

    Esta peça parece ser bem engraçada também :p

    ResponderEliminar
  8. Parece ser bem engraçado :) aqui mal há coisas assim grandes de teatro :p

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. r: a quem o dizes :) bem verdade! aproveito sempre para comprar coisas que nunca encontro a bons preços aqui na Madeira... eu sinceramente ando mais nas compras fora daqui :D

      Eliminar
  9. Também gosto muito de teatro e raramente vou. Fiquei curiosa.

    ResponderEliminar
  10. Muito bom quando nos identificamos com apresentação artística.
    Cadinho RoCo

    ResponderEliminar
  11. Seu conteudo é bom, seu layout é lindo. Não tenho como não fazer parte disso.
    Já te sigo. Bjs.
    http://juliamodelodemodelo.blogspot.com.br/

    ResponderEliminar
  12. Ouvi falar tanto nesta peça deve ter sido fantástico :) Tenho de ir ao teatro
    https://retromaggie.blogspot.com

    ResponderEliminar
  13. Obrigado, meu bem :D

    Fiquei muito curioso quando vi o grupo a fazer uma mini-apresentação no Você na TV aqui há atrasado. Achei imensa piada às temáticas que abordam e ao facto de ser tudo cantado! Também concluí que a exigência, neste género de espetáculos, é muito maior :o Quase ao cronómetro :o
    Quero ir veeeer :D

    NEW REVIEW POST | FINALLY TESTED A BLACK MASK! (SUPER AFFORDABLE)
    InstagramFacebook Official PageMiguel Gouveia / Blog Pieces Of Me :D

    ResponderEliminar
  14. Ainda fiquei com mais pena de não ter ido ver.

    ADORO a maneira como escreves, tão simples e tão bem!
    Segui!

    pontodereclamacaoblog.wordpress.pt

    ResponderEliminar

Enviar um comentário