ENTRELINHAS | OS LIVROS QUE DEVORARAM O MEU PAI
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Fotografia da minha autoria |
«A estranha e mágica história de Vivaldo Bonfim»
O meu pai não trata as palavras escritas com a mesma essência com que as acolho. Se o vi a mergulhar nas páginas de um livro, foi o máximo do seu compromisso. Porém, nunca dispensou a leitura de jornais. E isso não me faz qualquer confusão, pois temos prioridades distintas - e eu já estive do outro lado. No entanto, é com uma certa comoção que o ouço mencionar que eu não leio, eu devoro os exemplares que preservo no regaço. Por isso, neste enredo, a filha é que seria devorada pelos livros. Mas a história singular que Afonso Cruz nos conta tem outra poesia. Outro encanto. E um traço familiar inspirador.
Os Livros que Devoraram o meu Pai é uma viagem bastante emocional. É um estreitar de laços. E um misto de sensações. Nesta narrativa, terna e maravilhosa, há uma passagem de testemunho, de memórias, de património literário. Além disso, os planos de ação fundem-se no mesmo nível de existência, revelando uma simbiose entre a realidade e a ficção, o que não só funciona como um refúgio para os problemas do quotidiano, como também nos permite compreender que, conectados a algo, é sempre complicado delinear a fronteira que nos ajuda a separar a razão dos sentimentos. Porque nós não somos um só compartimento, mas movemo-nos muito em função do que nos bate no peito.
O autor é genial nos termos que utiliza e nos contextos que cria. Com um caráter um pouco surreal, envolve-nos neste ambiente que nos agita por dentro, levando-nos a analisar as inúmeras circunstâncias com outro filtro e outra astúcia. Assim, através de um texto delicioso de desvendar, consegue abordar temas tão distintos e pertinentes como a saudade, a maldade [sobretudo, entre jovens], a culpa, o arrependimento, a perda, a saúde mental, a procura de respostas, a paixão, o amor. E é por essa razão que a literatura tem tanto peso: porque, ao mesmo tempo que nos estende a passadeira dos sonhos, retira-nos o tapete e torna-nos mais conscientes. Naturalmente, este processo é muito íntimo - e nem sempre intuitivo -, mas, quando nos predispomos a sentir, a experiência é ainda mais enriquecedora. Transformadora. Visceral. E a transbordar sentido e aprendizagens.
Os Livros que Devoraram o meu Pai aparenta ter uma história simples, contudo, a mensagem é poderosa. Porque demonstra a consequência dos nossos atos, a força da nossa crença e o quanto há aspetos que ficam em segundo plano quando nos concentramos, verdadeiramente, no que estamos a ler. Nesta teia perfeita, com referência a outras obras, seguimos as pegadas de um pai e as de um filho que pretende restituir esses passos, com o intuito de entender qual foram o seu destino. Embora o final seja algo abrupto, arrepia e torna-se o impulso necessário para colocarmos a nossa jornada em perspetiva. E quase como um sopro, transmite-nos a bonita sensação de nos perdermos nas palavras, de nos deixarmos engolir por um mundo alternativo, que se camufla numa espécie de puzzle, de caça ao tesouro, porque há pistas imprescindíveis. E um pormenor que muda toda a sequência.
Afonso Cruz escreveu, portanto, no seu jeito ímpar, uma ode à boa literatura e aos sentimentos do leitor. Porque o ser humano é feito de histórias: das que lê, das que cria, das que vive. E todas coabitam no mesmo espaço. Transportando-nos para os lugares que imaginamos, quem é que não gostaria de fugir para dentro de um livro?
Deixo-vos, agora, com algumas citações:
«[...] um bom livro deve ter mais do que uma pele, deve ser um prédio de vários andares. O rés do chão não serve à literatura. Está muito bem para a construção civil, é cómodo para quem não gosta de subir escadas, útil para quem não pode subir escadas, mas para a literatura há que haver andares empilhados uns em cima dos outros. Escadas e escadarias, letras abaixo, letras acima» [p:14];
«Uma biblioteca é um labirinto. Não é a primeira vez que me perco numa» [p:27];
«- Não digas disparates, ó Bombo. Ela está sempre rodeada de gente.
- E depois? É a melhor maneira de nos sentirmos sozinhos» [p:52];
«- Atreve-te. E já agora: uma coisa é viver passando de árvore em árvore, mas como é que viverias num sótão fora de moda?
- Muito simples, passaria de livro em livro» [p:94];
«Nós, personagens fictícias da vida real, não temos como alterar o passado. Está escrito, foi assim e não há nada mais a fazer» [p:117].
Este, do Afonso Cruz ainda não li, mas já ouço falar dele desde o meu Secundário :)
ResponderEliminarRendi-me, por completo, à escrita maravilhosa de Afonso Cruz e à sua capacidade de criar histórias tão singulares *-*
EliminarConfesso que nunca li nada de Afonso Cruz, mas fiquei mesmo curiosa com este livro.
ResponderEliminarBeijinho grande, minha querida!
Acho que ias gostar muito, minha querida!
EliminarBeijinho grande
Os livros que devoraram o meu pai é um livro que quero ler, aproveito para desejar à minha amiga a continuação de uma boa semana.
ResponderEliminarAndarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
O prazer dos livros
Aconselho, Francisco. É daquelas obras que nos conquistam de imediato :)
EliminarObrigada e igualmente
Não conhecia, mas vou tomar nota!
ResponderEliminarIsabel Sá
Brilhos da Moda
Vale a pena :)
EliminarMostrar a consequência dos nossos actos é bom, é que muitas pessoas não tem noção do que provocam nos outros.
ResponderEliminarXOXO
marisasclosetblog.com
É, também, por essa razão que a literatura tem um peso tão importante na nossa formação enquanto cidadãos
EliminarFiquei convencido que deve ser mesmo um livro muito interessante.
ResponderEliminarObrigado pela sugestão.
Andreia, continuação de boa semana.
Beijo.
Sou suspeita, porque adorei, mas é mesmo!
EliminarObrigada e igualmente
Esse ainda não tinha ouvido falar, mas parece ser uma boa sugestão para ler
ResponderEliminarBeijinhos
Novo post
Tem post novos todos os dias
Recomendo :)
EliminarConfesso que não conhecia....
ResponderEliminarBeijinhos.
Sandra C.
bluestrass.blogspot.com
Se tiveres oportunidade, aconselho a descoberta deste livro
EliminarBeijinho grande
Não conhecia! Já não leio há imenso tempo :S
ResponderEliminarhttps://blogda-joana.blogspot.com/
Vais ver que é só uma fase :)
EliminarLer um livro cuja leitura nos desperta o interesse. É como aquilo que gostamos de fazer, sem nos cansarmos!
ResponderEliminarGostei de ler esse seu belo texto escrito!
Tenha um bom dia de Quinta-feira Andreia.
É mesmo maravilhoso! Sentimo-nos mais leves *-*
EliminarMuito obrigada
Uma vez vi este livro à venda e fiquei cheia de vontade de o ler por causa da capa. Acho engraçada! E agora vou levar a tua sugestão!
ResponderEliminarQuando tiveres oportunidade, aproveita. Bem sei que sou suspeita, mas o livro está incrível *-*
EliminarSó pelo titulo já me captou a atenção. Vou tentar comprar para ler!
ResponderEliminarBjxxx
Ontem é só Memória | Facebook | Instagram
Se leres, depois diz-me o que achaste :)
EliminarO meu pai era igual ao teu e dizia o mesmo de mim :)
ResponderEliminarGostei deste teu review e fiquei curiosa :)
Beijnhos minha querida*
Muito, muito obrigada, minha querida <3
EliminarAdorei o livro.
ResponderEliminarPara além de escritor, Afonso Cruz também é um belíssimo ilustrador.
Beijinho
Está extraordinário *-*
EliminarSim, sem dúvida! Afonso Cruz transborda talento em ambas as artes
it must really be a very interesting book.
ResponderEliminarthank you for reviewing
Yes, it is :)
EliminarThanks!
Zé deixou um novo comentário na sua mensagem "ENTRELINHAS | OS LIVROS QUE DEVORARAM O MEU PAI":
ResponderEliminarUm bom livro é aquele que nos põe a pensar.
É óbvio que o homem já pensava antes de ter inventado os livros, mas aí era obrigado a ler nas páginas da vida. E a vida é um livro muito complicado, mas ensina-nos muito. Ensina-nos a ler livros, por exemplo... mas primeiro ensinou-nos a inventar os livros.
Desculpa, Zé! Ao eliminar, em definitivo, o comentário que tinhas removido, acabei por também apagar o que era para ficar :/
EliminarTemos muito a aprender com a vida, ainda que sintamos que não, porque há imensas circunstâncias a colocarem-nos à prova e a fazer-nos evoluir. E, depois, através da literatura, conseguimos contactar com inúmeras realidades distintas. Pensar. Refletir aprofundadamente. E, claro, sonhar
Olá!! Não conhecia o livro mas adorei o relógio da bela e do monstro, super cute <3
ResponderEliminarpimentamaisdoce.blogspot.pt
Recomendo, é maravilhoso!
EliminarEste relógio é mesmo uma ternura *-*
Adorei a citação da pagina 52, e o livro deixou-me curiosa!!
ResponderEliminarBeijinhos
Se tiveres oportunidade de ler, vale mesmo a pena. A escrita de Afonso Cruz é deliciosa *-*
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