THE BIBLIOPHILE CLUB // MARÇO

Fotografia da minha autoria

Tema: Livros infantis ou infanto-juvenis

A minha licenciatura - Educação Básica - e, posteriormente, o mestrado em Educação Pré-Escolar reservaram-me aprendizagens indiretas muito pertinentes. E uma das mais especiais foi a importância da literatura infantil e juvenil na construção do nosso caráter. Na medida em que tem uma magia distinta na abordagem de temas mais sérios ou que possam suscitar dúvidas. Atendendo ao tema de março para o The Bibliophile Club, optei por revisitar uma das minhas histórias favoritas.

Onde Vivem os Monstros, de Maurice Sendak, começou por provocar alguma polémica «pela forma nada exemplar» como retratava as crianças. Porém, no presente, é considerado um clássico e uma «referência imprescindível», pois faz-nos sonhar e tem uma mensagem extraordinária. A narrativa é simples, escrita com uma dose equilibrada de humor e com um traço poético, transportando-nos para uma viagem simbólica, uma vez que acompanhamos Max - o protagonista -, após ser castigado pela mãe, a partir do seu quarto para um lugar fantástico. Atravessando, deste modo, um plano e um tempo míticos. Nesta travessia tão emocional, que o faz conhecer personagens peculiares, acaba por, mais tarde, sentir vontade de regressar ao ponto de partida. O mais curioso é que, desde a realidade até à [aparente] ficção, não existem detalhes concretos que nos permitam explicar a sua metamorfose. E, muito menos, esclarecer se a sua aventura aconteceu ou se, por outro lado, é produto de um sonho.

A premissa desta obra apela à nossa imaginação. Concede-nos a possibilidade de remexer nas nossas memórias de infância. E é ótima para desmistificar o medo dos monstros. Com um enredo sempre atual, tudo neste exemplar é pensado artisticamente, conjugando a diagramação, os sons e as repetições, a simbiose perfeita entre as palavras e as imagens e a própria atmosfera encantada e intensa. À medida que o nosso menino rebelde avança para aquilo que parece ser um espaço onírico, o tamanho das ilustrações aumenta até ao climax, «altura em que ocupam a totalidade da página», respeitando o sentido inverno assim que retorna a casa. Nesta linha que aproxima dois pólos opostos, compreendemos que mesmo os monstros se sentem sozinhos e que é imprescindível estarmos num local onde nos sintamos bem, seguros, rodeados por quem nos entenda e respeite a nossa individualidade.

Quando analisei este livro, no terceiro ano, nas aulas de Literatura para a Infância e Promoção da Leitura, ficou bastante claro que há uma reflexão sobre crescimento, amadurecimento, gestão de frustrações e sobre a ambição de sermos o que quisermos. Mas também percebi que é uma metáfora acerca do inconsciente, da complexidade da infância e das contradições humanas. Além disso, achei singular que o autor se tivesse inspirado em familiares para criar os monstros, mas entendido que, no final, se pareciam mais consigo do que com os tios e as tias. Estimulando-nos a considerar os nossos conflitos interiores, retrata temas como a rebeldia, a raiva, a solidão e o empoderamento infantil.

Onde Vivem os Monstros lê-se num sopro. No entanto, torna-se inesquecível. Apesar de estar catalogado para um público específico, sinto que é indispensável em qualquer faixa etária. Porque todos temos um pouco de Max no coração. Porque precisamos de experienciar para perceber que tudo tem um limite. Porque somos obrigados a confrontar os nossos medos e as nossas inseguranças. E porque, no fundo, todos queremos ser aceites. E ter um lugar para onde podemos sempre voltar.

Deixo-vos, agora, com algumas citações:

«Naquela noite, no quarto de Max surgiu uma floresta»;

«... e brotou um oceano com um barco só para Max, que partiu a navegar através das noites e dos dias»;

«Semana após semana,

durante quase um ano inteiro,

até chegar ao lugar

onde vivem os monstros»;

«E Max, rei de todos os monstros, sentiu-se tão sozinho que desejou estar onde alguém só tivesse olhos para ele»;

«... voltou à noite do seu quarto, onde o aguardava o seu jantar»

Disponibilidade: Wook | Bertrand

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