ENTRELINHAS | FILHOS DO ABANDONO

Fotografia da minha autoria


«Cada história desenrola-se um pouco como um caso policial»


As pessoas que cruzam o nosso caminho moldam-nos, seja por todo o amor que acrescentam no lado esquerdo do peito, seja por nos tornarem mais resilientes. Porque acredito mesmo que ninguém chega ou parte por acaso. E tanto o colo que nos cedem, como a porta que nos fecham influenciam o nosso caráter. Enquanto Educadora de Infância, sei que não faltam desafios à espreita, mas a figura que representamos para as criança terá um impacto único. Portanto, é necessário valorizá-las. Amá-las. E prestar todos os cuidados que as permitam crescer seguras. E há uma pessoa que o faz como nenhuma outra: Torey Hayden.

Filhos do Abandono coloca à prova o nosso discernimento e a nossa vertente emocional, uma vez que retrata três histórias com uma carga bastante pesada e com um passado completamente desestruturado e negligente. Contrariamente ao cenário da maioria dos seus livros, este em particular não se foca no contexto escolar, mas sim no contexto hospitalar, mais concretamente na unidade de pedopsiquiatria. Além disso, a faixa etária apresenta uma novidade: para além de trabalhar com Cassandra, de seis anos, e com Drake, de quatro, a terapeuta intervirá junto de uma idosa, embora nunca tenha trabalhado com adultos. A vida dos protagonistas não poderia ser mais diferente e desprovida de laços comuns. No entanto, há uma particularidade transversal a todos: o mutismo eletivo, que é um transtorno psicológico, caracterizado pela recusa em falar em determinadas situações. Assim, a autora procurará descobrir os motivos que desencadearam esta condição e o que escondem todos os seus silêncios.

Nesta obra vamos descobrir realidades muito contrastantes. Se, por um lado, acompanhamos o quotidiano de uma menina que oscila entre comportamentos «erráticos e agressivos» e períodos de afasia voluntária, por outro, vamos conhecer um menino «cativante e carismático». E contactaremos, ainda, com Gerda, que se refugia numa espécie de mutismo depressivo, após sofrer um AVC. Individualmente, são histórias que espelham problemas fraturantes da nossa sociedade: os abusos, a pressão familiar, a solidão, o abandono, as doenças cardiovasculares, os distúrbios comportamentais graves e a saúde mental. Em simultâneo, tornam evidentes as consequências de um mau diagnóstico e da carência afetiva. Quando só se conhece o pior lado da vida e quando a pressão é demasiado alta, é natural que prevaleça uma sensação de sufoco e que exista pouca recetividade nas interações. Portanto, desenvolvem mecanismos de defesa que lhes possibilitem gerir traumas pelos quais nunca deveriam ter passado.

No meio do caos, é a generosidade e persistência de Torey que trazem alguma luz e alento para a vida das três personagens. Com esta narrativa sentimo-nos a percorrer uma estrada movediça e labiríntica. Penosa. Que expõe o pior lado da humanidade. Porém, graças à intervenção consciente e regular, há um traço de esperança que nos acalma e que nos permite crer num futuro melhor. E aquilo que era um lugar inquietante, praticamente impossível de transpor, deixa de ter substância. Por isso é que esta obra é tão inspiradora e estimulante. Para além do mais, por ser real, aprendemos novas técnicas de apoio e de resolução de conflitos. E relembramos a importância da força interior. Da empatia. Do espírito de entreajuda, que nos pode salvar.

Há indícios que são pedidos de socorro: para afastar a escuridão que se abate em nós. E para libertar os fantasmas que nos condicionam - e querem definir. Porque nada deveria ter poder suficiente para interferir com a nossa segurança. Contudo, em Filhos do Abandono percebemos que há bases de proteção que falham. Que precisamos de recuar para recuperar impulso. E que há silêncios que gritam.


Deixo-vos, agora, com algumas citações:

«Este comportamento era demasiado desprendido, demasiado travesso para ser verdadeiro. Cheirava-me a manipulação» [p:12];

«Quando a situação já é desesperada, os teus actos não vão agravá-la. Portanto, vale sempre a pena correr o risco, só para veres se tens uma pequena oportunidade de a melhorar» [p:73];

«- São amigos. Meus amigos. Estão dentro de mim. Mas são reais. Enfim, é como se fossem reais. Mas sabes, há muitos tipos de realidade. As pessoas julgam que há só uma, mas, de facto, há várias» [p:144];


// Disponibilidade //
Wook: Livro | eBook
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Comentários

  1. Bom dia:- Acredito que seja um livro maravilhoso de se ter na mesa de cabeceira e ir lendo com olhos de ler.
    .
    ^^^ Mulher em pétalas de amor ^^^
    .
    Que a felicidade resida em seu coração.

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    1. É preciso ter estofo para ler algumas passagens. No entanto, vale muito a pena. Porque a autora desenvolve um trabalho fantástico!

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  2. Nunca li nada da autora, vou acrescentar este livro à minha longa lista.

    Beijinho grande :*

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  3. Sempre a conhecer novos livros mais um que não conhecia

    Beijinhos
    Novo post
    Tem post novos todos os dias

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  4. Olá:- O título é muito sugestivo. Imagino ser um bom livro.
    .
    ... Quer ler?. . . POEMA . . .
    .
    ** Luz de amor e vida **
    .
    Desejando um dia feliz

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  5. Confesso que é um romance que não desperta o meu interesse.

    Continuação de boas leituras 📚

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    1. Tem um registo muito particular, até porque, à semelhança da maioria dos seus livros, é baseado em histórias reais

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  6. Não li o livro, mas pela apresentação (cuidada, como sempre) parece-me um tema interessante.
    Andreia, continuação de boa semana.
    Beijo.

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    1. Muito obrigada! Aconselho muito os livros de Torey Hayden
      Obrigada e igualmente

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  7. Respostas
    1. Aos pouquinhos, nem que seja só uma página por noite, vais ver que consegues recuperar esse tempo :)

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  8. Não consigo ler histórias assim, uma estrada penosa. Fico transtornada.
    Xoxo

    marisasclosetblog.com

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    1. É preciso ter alguma predisposição emocional, de facto, porque os pormenores pode ser mesmo inquietantes

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  9. Nunca li nada da autora, mas sei que os livros são muito marcantes, não sei se já leste, mas um dentro do género que me marcou muito (chorei praticamente durante toda a leitura), é o "O Menino Que Ninguém Amava" de Casey Watson.

    MRS. MARGOT

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  10. Excelente review :) Adoro esta escritora e desde já te agradeço por me a teres dado a conhecer:)
    Beijinhos

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    1. Muito obrigada, minha querida! Fico mesmo feliz por ter contribuído :)

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  11. Os livros da Torey deixam-me sempre com o coração apertado

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    1. Tal e qual, minha querida! Ela tem um dom absolutamente inspirador, mas as histórias são difíceis de gerir emocionalmente :/

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  12. Pelo titulo "Filhos do Abandono". Ainda não li o livro. Deve ser interessante. Nenhum filho devia ser abandonado, nem pelo pai nem pela mãe. Bem como o pai ou mãe também não deviam ser abandonados pelos seus filhos. Como em ambos os casos acontece!

    Tenha uma boa noite Andreia.

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  13. Só titulo chama a atenção :)
    Beijinho linda.

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  14. Acabei de comprar esse livro na Saraiva pela
    Internet. Espero gosta tanto quanto você...
    Beijos.

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