deus na escuridão, valter hugo mãe

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Gatilhos: Referência a Pensamentos Suicidas, Linguagem Explícita


As ilhas contrastam a noção de proximidade com a noção de solidão, como se coexistíssemos numa grande vizinhança; como se, por entre rasgos de aproximação, a convivência se tornasse intrusiva, porque as fronteiras não são claras. No novo livro de Valter Hugo Mãe, deambulamos por esta ilha e por todas as ilhas que nos habitam.


sentimentos que se exercem na escuridão

Deus na Escuridão passa-se na Ilha da Madeira e conta-nos a história de dois irmãos: Serafim, mais conhecido por Pouquinho, que nasceu sem origens, e Paulinho, o Felicíssimo Irmão, que assumiu como missão de vida amar Pouquinho incondicionalmente, amando-o como um igual. Em simultâneo, encontramos uma comparação à afeição despojada de uma mãe, que cuida acima de qualquer coisa.

A narrativa tecida a poesia contempla uma certa admiração pelo outro, acolhendo-o para lá das suas diferenças. Olhando-o sem filtros, não pelo desejo de perceber a excentricidade, mas pelo genuíno interesse de nunca o deixar à margem. Isso não significa que não exista incompreensão, revolta e, até, uma dose de ciúmes, mas há o tal sentimento que se exerce na escuridão e que nos resgata para a direção certa. E só um coração sem maldade pode reconhecer essa fragilidade, procurando recuperar o sentido, o que é importante. Acho que este texto mostra bem as dicotomias do ser humano: que não é só feito de luz, que também é feito de trevas. Contudo, pode escolher a voz que marcará os seus passos e os vínculos que cria com os demais.

«A solidão é sempre uma espécie de fim. O fim de um lugar. Como se não houvesse mais para onde caminhar. Caminhar daqui embora. Eu pensava. Quando sentia estar só, aquilo de ser por dentro do peito, onde se dizia mais doer, pelo coração, ou pelas veias que forneciam o sangue ao coração, eu pensava que o mais importante era caminhar dali embora. Não me deixava muito tempo a contemplar o desalento ou a sentir qualquer abandono»

Com várias passagens que comovem, o autor retira-nos de um lugar de conforto, para nos fazer refletir sobre várias componentes. Assim, aqui, não vemos só uma ode ao amor materno (com a possibilidade de ser manifestado noutros elos), mas também ao papel do cuidador e à importância de cuidar. Assistimos a um vínculo familiar fortalecido a cada instante. Mas também ficamos a debater até onde pode (ou deve) ir o nosso amor pelas nossas pessoas. Quais serão os limites a estabelecer?

Deus na Escuridão é um ato permanente de descoberta. Por isso, avancei lentamente, para desfrutar da melodia das palavras, para me maravilhar com este lugar íngreme onde se exploram as diferenças, o medo, a culpa, a vergonha, a fé e a lealdade.


🎧 Música para acompanhar: Alma Nua, Van Zee



Disponibilidade: Wook (Livro | eBook) | Bertrand (Livro | eBook)

Nota: Esta publicação contém links de afiliada da Wook e da Bertrand

8 comments

  1. Excelente sugestao! Quero muito ler *.*

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  2. Ainda não li, mas fiquei curiosa 😊

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    1. Tem partes mais densas, mas a escrita é bastante poética e as relações familiares/afetivas desarmam

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  3. Até agora só li um livro do autor, confesso que não me deslumbrei.

    Já vi aqui boas sugestões, tenho de lhe dar nova oportunidade.

    Beijinho grande, minha querida.😘

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    1. Podes não ter lido na melhor altura ou, então, não ser mesmo um autor que funcione para ti. Aconselho dar uma nova oportunidade 😊

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  4. This sounds like an interesting read, though may be challenging for some. Love the cover desgin.

    Allie of
    www.allienyc.com

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