fósforo, ana pessoa
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Fotografia da minha autoria |
Gatilhos: Conteúdo Explícito
O químico e físico russo Dmitri Mendeléev, em 1869, escreveu uma carta para «cada um dos 63 elementos químicos». Com o intuito de comemorarem os seus 150 anos, a Flan de Tal e a Flanzine criaram a elemeNtário, uma coleção de poesia para a qual cada autor convidado teria de escrever «a partir dos atuais 118 elementos da tabela». Curiosa, entrei neste laboratório poético pelas mãos de uma autora-casa: Ana Pessoa.
dores solitárias que se reacendem
Fósforo é sobre «parir, ser mãe e ser animal». É sobre a vida e, creio, sobre o que fazemos com ela quando perdemos uma parte vital de tudo o que estamos a construir - inclusive, a amar. Além do mais, acho que também faz um retrato sobre a solidão.
Tenho lido a autora num registo muito diferente, em novelas gráficas e livros destinados a um público mais infantojuvenil, portanto, foi fascinante descobri-la na poesia. E fiquei com a sensação de que há elementos transversais, quer na escrita, que continua sem floreados, quer nos temas. Embora nunca a tenha visto abordar este em concreto noutro livro, a verdade é que parte de uma base comum: a humanidade.
Não senti na pele o que retrata, mas parece-me impossível ficarmos indiferentes, até porque, de uma forma geral, independentemente do sucedido, é provável que já todos tenhamos experienciado o medo de reviver uma situação traumática, a dureza de ter de expor o assunto e/ou de o partilhar com terceiros, quando a vontade talvez fosse ficarmos encolhidos na nossa bolha, em silêncio, sem haver a necessidade de voltar às mágoas, aos desgostos, às feridas que demoram a sarar. Por outro lado, conhecemos o impacto do luto e a inevitabilidade intrínseca à perda, mesmo que nos pareça extrema.
«que coisa tão estranha dar um nome a um filho
que coisa tão concreta tão abstrata
um nome entre outros nomes
uma hipótese entre outras hipóteses»
Este poema, pela sua estrutura, assemelha-se mesmo a um fósforo aceso: pela luz que se vai esfumando e pelo ato contínuo de consumir a madeira, em poucos segundos. A faísca entra em combustão e acredito que existem notícias que nos fazem seguir este processo. Inflamam-nos e vamos enfraquecendo, tal e qual a chama a desaparecer. Sem qualquer pausa, avançamos neste livro com urgência, sentindo o desconforto, o desnorte e a escuridão de momentos difíceis, de realidades que nos fazem questionar, sobretudo, que problema nos habita, ao ponto de minar tudo o que desejamos.
Fósforo é duro, porque nos mostra que, por maior que seja a nossa rede de apoio, há dores solitárias, muito individuais. No entanto, também é belo, porque há chamas que se reacendem, que nos trazem esperança. Passando por várias privações, por várias ocasiões de dúvida e de anseios, este livro, sinto, também é um longo poema sobre a liberdade: a liberdade que chega quando o nosso propósito, por fim, se restabelece.
🎧 Música para acompanhar: E Depois do Adeus, Paulo de Carvalho
📖 Outras livros lidos: Mar Negro | Mary John | Aqui é Um Bom Lugar | O Caderno Vermelho da Rapariga Karateca | Supergigante | Desvio | Tu És Livre? (com Mariana Malhão)
Parece ser o tipo de livro que me vai prender! Já o coloquei na minha lista de leitura!
ResponderEliminarBjxxx
Teresa Isabel Silva
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Foi mesmo interessante conhecer a autora neste registo poético.
EliminarBoas leituras, Teresa
Achei a ideia do ElemeNtario muito original.
ResponderEliminarComo sempre, levo a sugestão.
Beijinho grande, minha querida.
É, não é? Também achei! E quero ver se, depois, exploro mais títulos
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