Entre Margens

Fotografia da minha autoria



As minhas leituras de março, à semelhança do que tem acontecido nos últimos anos, só tinham uma condição: serem escritas por mulheres, numa forma simbólica de as celebrar e homenagear. Não obstante, já na reta final do mês, abri uma exceção para ler um autor. 

Cruzei-me com algumas histórias impactantes e acho que encontrei possíveis favoritos do ano.


a tbr de março: expectativa
  • Os Esquecidos de Domingo, Valérie Perrin;
  • O Caderno Proibido, Alba de Céspedes;
  • Gente Feita de Terra, Carla M. Soares;
  • Solitária, Eliana Alves Cruz;
  • História de Quem Vai e de Quem Fica, Elena Ferrante;
  • Mulheres Invisíveis, Caroline Criado Perez.

a tbr de março: realidade

Dos seis livros anteriores, li cinco e optei por deixar o da Carla M. Soares para outra altura, porque comecei e não senti que fosse o melhor momento para o descobrir. Ainda acrescentei:
  • Minha Senhora de Mim, Maria Teresa Horta;
  • Teoria das Catástrofes Elementares, Rita Canas Mendes;
  • Um Jogo Bastante Perigoso, Adília Lopes;
  • O Livro das Tréguas, Lídia Jorge;
  • Notas Sobre a Impermanência, Paula Gicovate;
  • O Aquário, João Pedro Mésseder & Célia Fernandes;
  • As Palavras do Corpo, Maria Teresa Horta. 

algumas curiosidades

Em março, li:
  • 12 livros: 6 romances, 4 de poesia, 1 de não ficção e 1 infantil:
  • 10 autoras e 1 autor: uma francesa, cinco portugueses, duas italianas, duas brasileiras e uma britânica;
  • cinco autoras pela primeira vez: Alba de Céspedes, Eliana Alves Cruz, Caroline Criado Perez, Rita Canas Mendes e Paula Gicovate.
Favoritos do mês:
  • Os Esquecidos de Domingo, Valérie Perrin;
  • O Caderno Proibido, Alba de Céspedes;
  • Notas Sobre a Impermanência, Paula Gicovate.
Não estabeleci um elo entre todas as histórias, mas houve algo transversal a O Caderno Proibido, Notas Sobre a Impermanência, Mulheres Invisíveis e Solitária (e ainda acrescentaria a esta lista Limpa, que li no mês anterior): a invisibilidade que continua a pairar sobre as mulheres, o facto de continuarem a ser diminuídas apenas por serem mulheres.


vamos a contas?

Em março, estive muito regrada nas minhas compras, talvez por antever o caos que se aproxima, visto que faço anos no próximo mês. Assim:
  • Comprei um livro físico, o da Lénia Rufino, que entrou em pré-venda quase a meio do mês, pelo qual paguei 15,21€;
  • Ativei a subscrição do Kobo Plus, que me custou 6,99€. Li 6 eBooks, o que me permitiu poupar 77,09€ (para referência, usei o valor dos livros físicos na Wook);
  • Comecei março com 61€ na Apparte. Uma vez que li 12 livros, adicionei 12€, partindo para abril com 73€.

banda sonora














tbr de abril
  • Os Loucos da Rua Mazur, João Pinto Coelho;
  • Filho do Pai, Hugo Gonçalves;
  • Nem Todas as Árvores Morrem de Pé, Luisa Sobral;
  • O Silêncio no Coração dos Pássaros, Lénia Rufino;
  • História da Menina Perdida, Elena Ferrante;
  • O Hóspede de Job, José Cardoso Pires

Fotografias da minha autoria


A Florbela Pâtisserie, uma pastelaria de inspiração francesa, localiza-se na biblioteca do hotel literário Torel Palace Porto. Para além de nos permitir uma viagem a França sem sairmos da cidade, é uma assumida homenagem à poetisa Florbela Espanca.

O convite para mergulharmos neste universo literário é feito através de detalhes particulares, como um teto forrado de livros suspensos ou estantes cheias de obras distintas. Já me tinha cruzado com algumas fotografias do espaço, mas ainda não tinha tido a oportunidade de o visitar. A propósito de edição especial do Torel Book Club, acabei por colmatar essa falta e rendi-me completamente àquele lugar mágico.

Creio, inclusive, que o encanto da sessão se tornou mais evidente pelo ambiente da sala, uma vez que nos faz sentir em casa. Aliás, ainda que não sejam comparáveis na estrutura, senti-me na casa dos meus tios, onde os livros sempre tiveram um lugar especial para habitarem. E, de repente, parecia uma personagem de uma história.

Já estou a divagar, perdoem-me, no entanto, acho mesmo fascinante como um lugar consegue ter tantas vidas dentro e transportar-nos para cenários que nos são tão próximos. Voltando ao motivo que nos levou até à Florbela Pâtisserie, quando vimos a iniciativa focada no dia da mulher, cujo propósito era promover uma conversa entre as escritoras Maria Isaac, Susana Amaro Velho e Íris Bravo acerca da «presença feminina na literatura, [d]a força das protagonistas e [d]a entreajuda entre mulheres no mundo literário», não quisemos desperdiçar a oportunidade de assistirmos a este momento.


Foi uma partilha muito plural e rica, que estabeleceu pontes entre vivências pessoais, plano nacional de leitura, expectativas, o caminho percorrido e o que falta percorrer e mais uma série de tópicos soltos, que acabaram por se alinhar com naturalidade. Mais do que destacar frases/pensamentos que me marcaram nesta conversa, e tenho vários que me deixaram a refletir, interessa-me mais focar-me no privilégio que é/foi ver este evento a ganhar forma, porque sabemos que isto não seria possível, por exemplo, na altura de Florbela Espanca, porque as mulheres ainda precisam de batalhar para ter o seu lugar de fala, porque também é um abrir de portas cultural, que não reservam iniciativas desta magnitude apenas à capital do país. E, sendo-vos honesta, enche-me o coração perceber que o Porto é palco de eventos bonitos e importantes como este.

Na qualidade de leitora, também acho fascinante ter este contacto com autoras que leio e que fazem parte das minhas escolhas - das três, reconheço, a Íris Bravo é a que conheço menos, mas a Susana Amaro Velho e a Maria Isaac são presença recorrente -, isto porque permite descobri-las para lá dos seus enredos e perceber como é que olham para a literatura e como é que a vivem, sabendo que têm outras profissões.

Cada uma das autoras está a fazer a sua parte para continuar a abrir portas neste meio e eu sinto que isso é absolutamente inspirador: para quem lê e para quem escreve.

Fotografia da minha autoria


O livro da Rita Canas Mendes esteve quase a vir comigo da Feira do Livro do Porto, no ano passado, mas acabei por alinhar as minhas compras noutro sentido. A verdade é que estava curiosa, mas não completamente certa de que seria o momento ideal para o acrescentar à estante. Assim, alguns meses depois, aproveitando que estava disponível no catálogo da BiblioLED, achei que seria a desculpa ideal para o requisitar/descobrir.


uma manta de retalhos

Teoria das Catástrofes Elementares posiciona-nos entre os anos de 1990 e 2000, entre Lisboa e Cascais, para acompanharmos «a identidade, a memória, os traumas íntimos e geracionais de uma família portuguesa». Portanto, focando-se em pessoas comuns, com todas as nuances que as caracterizam, embarcamos numa viagem pouco linear.

A escrita conquistou-me de imediato e dei por mim a recordar algo que a Rita da Nova destacou acerca deste romance, e que fui confirmar para citar sem falhas, uma vez que a autora sabe «perfeitamente onde ser sarcástica, onde ser mais cuidadosa, onde ser mais bruta». Sem hesitação, foi um dos meus aspetos favoritos, porque não acho que seja assim tão simples conseguir esse equilíbrio e que ele soe sempre natural. E sinto que acaba por fazer a diferença no modo como nos relacionamos com as situações.

A obra tem uma estrutura muito própria, atendendo a que não seguimos uma história cronológica, tradicional, cujas pontas soltas se vão entrelaçando, e isso também me agradou. Aliás, a certo ponto, senti que estávamos a montar um puzzle de recordações, ora cómicas ora trágicas, a ter uma conversa com amigos, onde saltitamos entre temas sem reservas e amarras. Há a responsabilidade de os relatarmos com verdade, mas nada nos impede de não lhes darmos seguimento, porque abrimos portas paralelas. Por outro lado, embora tenha gostado muito desta dinâmica, admito que me deixou com um sentimento agridoce, porque queria que houvesse um fio condutor maior.

«Não há volta a dar. Por mais que queiramos esquecer o passado, ele não se esquece de nós»

Cada um dos episódios ajuda-nos a compor o quadro geral desta família e, inclusive, a estabelecer pontes com a nossa realidade, ao mesmo tempo que recupera traços da Guerra Colonial, da crise financeira, daquilo que é necessário esconder, no entanto, senti falta de compreender o verdadeiro impacto daquelas transformações a longo prazo, porque ninguém passa por tudo o que é descrito sem sentir que algo se quebra e/ou se regenera por dentro. No fundo, é como se nos deixasse a porta entreaberta, mas, admito, gostava que me convidasse a entrar, a sentar e a ficar mais tempo no sofá.

Teoria das Catástrofes Elementares centra-se em tudo aquilo que nos molda e que nem sempre é visível para quem está de fora (nem tem de ser). Embora não me tenha tirado o fôlego, acredito mesmo que é uma boa leitura e que nos permite refletir sobre «o que julgamos fixo», deixando-me com vontade de ler mais coisas da Rita Canas Mendes. Há aspetos que não controlamos, mas são estas variantes que sustentam a nossa vida.


notas literárias
  • Gatilhos: Linguagem Gráfica e Explícita
  • Lido entre: 11 e 13 de março
  • Formato de leitura: Digital
  • Género: Romance
  • Pontos fortes: O equilíbrio entre os tons cómico, sarcástico e dramático, a escrita
  • Banda sonora: Desfolhada, Simone de Oliveira | Circle Of Life, Elton John | Cachito, Nat King Cole | Born Of Frustration, James | Não Gosta, Bárbara Bandeira

Disponibilidade: Wook (Livro | eBook) | Bertrand (Livro | eBook)
Nota: Esta publicação contém links de afiliada da Wook e da Bertrand

Fotografias da minha autoria


A música do Bispo foi entrando nas minhas playlists devagar e de um modo pontual. Já não sei se o conheci graças ao Aviola ou ao Lembra-te, mas foi o NÓS2 (feat Deezy) que ecoou mais tempo. Ainda assim, não era uma escolha recorrente, era, talvez, um reencontro que me fazia questionar sempre o motivo de não o escutar mais vezes. O ponto de viragem aconteceu com Essa Saia (feat Ivandro), no entanto, foi Monarquia (feat Diogo Piçarra) que estreitou os laços e me deixou mais atenta ao seu percurso.

Uma vez que não era um dos meus artistas-casa, confesso que marcar presença num dos seus concertos não era uma prioridade, mas até essa intenção foi mudando. E, no natal de 2024, fui surpreendida pela minha comadre, que me ofereceu um bilhete para o concerto no Coliseu do Porto. Tenho adorado a experiência de ir sozinha a eventos deste género e, por isso, estava confortável com o facto de ser outro momento assim, mas teve graça quando, ao conversar sobre a surpresa, percebi que era intenção da Sofia perguntar se queria ir. E fomos juntas ouvir os nossos temas favoritos ao vivo.

   

Estava curiosa com a produção, com o alinhamento e com os convidados que poderia trazer. Tentei calibrar as expectativas, porém, estava confiante que se transformasse num espetáculo bonito e, talvez, emocional, atendendo a que estava a pensar no impacto que teria para mim escutar a Aviola II numa sala esgotada e com várias letras na ponta da língua. Por falar nas letras, tenho de confessar a minha admiração pela quantidade de palavras que o Bispo consegue cantar por segundo, sem perder o fôlego, e, sobretudo, pela intensidade com que o faz. Sei que não tenho agilidade para o acompanhar, mas isso é irrelevante, porque a mensagem chega e tão depressa toca nas feridas todas, como também parece curar muitas coisas cá dentro. Por mais que tenhamos experiências de vida distintas, é a verdade das palavras que nos comove.

Adorei como, no decorrer do concerto, nos transportou para um espaço pessoal, para a intimidade do estúdio e da sala ou do quarto de sua casa. De repente, foi como se ele estivesse sozinho, a passar cá para fora o que lhe grita no peito, sem pensar naquilo que as pessoas poderão dizer. Achei mesmo generoso que nos convidasse a entrar nesse mundo e nos mostrasse um caminho com altos e baixos, uma estrada acidentada que, apesar de tudo, nunca o desvirtuou dos valores certos e dos seus maiores pilares.

   

Nesta travessia que compilou os seus primeiros temas e os mais recentes, não esteve sozinho em palco. Para além da banda, fez-se acompanhar pelo Diogo Piçarra, com quem cantou Agradecido e Monarquia (a última ainda serviu de ponte para um pedido de casamento), pelo Kappa Jota, com quem cantou Fim da Noite, pelo Julinho KDS, com quem cantou Contra Probabilidades, pelo Van Zee e pelo Mizzy Miles, com quem cantou uma das minhas músicas favoritas do ano passado (e de vida), Bênção. E ainda teve espaço para recordar a Bárbara Tinoco, com Planeta, e o Ivandro, com Essa Saia.

Foram quase duas horas e meia de concerto, do qual saí emocionalmente destruída, não só pelo poder das palavras cantadas, mas também pelo poder das palavras ditas. Sinto que o Bispo conseguiu o equilíbrio perfeito entre o espetáculo em si e as alturas de interação com o público, sempre de um modo natural, e por isso é que dei por mim lavada em lágrimas quando nos falou da importância que a avó tem na sua vida. Não sei que mania é esta dos rappers passarem a imagem de que são uns durões e fazerem-me acreditar que será um concerto tranquilo, mais revolucionário do que sentimental, para depois me tirarem o tapete por terem o coração ao pé da boca. Estou a brincar, naturalmente, mas a verdade é que não estava a contar emocionar-me tanto.


A escrita/a música pode ser um exercício criativo, no qual podemos libertar tudo o que nos inquieta ou criar cenários hipotéticos ou antagónicos à nossa realidade, mas as suas letras espelham muito daquilo que é a sua trajetória, portanto, parece-me óbvio que seja mais difícil ocultar emoções - nem acho que o propósito seja escondê-las. E, no caso do Bispo (mas não só), sinto que ainda acresce o facto de ele ser mesmo grato pelas pessoas que estão ao seu lado e pelo rumo que a sua vida tomou. Ademais, creio que ele é bastante feliz em palco e a compor, porque foi isso que eu senti ao ouvi-lo. Fui para o Coliseu do Porto com essa ideia e reforcei-a em cada pormenor do concerto.

Houve músicas que não fui capaz de cantar, houve outras que acompanhei com tudo de mim. Dancei, gritei muito e corroborei o privilégio que é assistir à ascensão de artistas tão talentosos, que nunca se esquecem de onde vêm. Sinto que o Bispo nos contou uma história de humildade e superação e, por esse motivo, está a colher todos os frutos disso. Espero que a vista seja bonita, porque continuarei aqui a vê-lo voar.

Fotografia da minha autoria


O mundo em clara ascensão talvez não estivesse preparado para o projeto ambicioso de Sacadura Cabral. No entanto, ainda que todos ao seu redor o considerassem uma loucura, o aviador português foi traçando um plano, limando arestas e as técnicas necessárias para que a sua ideia saísse do papel. Com o apoio de Gago Coutinho, alcançaram uma revolução tecnológica na navegação aérea, há mais de cem anos.


breve contextualização

A Travessia, nova aposta audiovisual da RTP, concentra-se, então, na viagem que estas duas figuras realizaram e que ficou conhecida como a primeira ligação do Atlântico Sul, unindo Lisboa ao Rio de Janeiro. A preparação foi exigente e percebeu-se que o espírito de aventura veio desafiar «os limites do esforço humano». Ainda assim, há alturas em que é necessário um salto de fé, para que se alcancem novos horizontes.

O desejo de navegar por céus desconhecidos não só potenciou inovações científicas, «revelando o caminho para outros planetas do universo», como também permitiu estabelecer um vínculo curioso entre homem e máquina, já que é preciso que estejam em perfeita simbiose. E esse foi um dos objetivos do realizador da série, que também não escondeu a intenção de fazer uma homenagem ao «espírito pioneiro». Num plano paralelo, poderemos assistir à rivalidade evidente entre a Marinha e o Exército.


consideração final

Um dos pensamento que me ficou a pairar quando terminei o primeiro episódio de A Travessia foi que estaríamos perante diferentes tipos de travessias. Claro que a viagem épica dos maiores pioneiros da aviação portuguesa, Sacadura Cabral e Gago Coutinho, é o elemento central de todo o argumento, no entanto, permite que se explorem várias reflexões, até porque num projeto desta natureza há muitas movimentações paralelas.

A produção é ambiciosa e o texto estimulante, ainda assim, sem tirar crédito a essas valências por si só, creio que sobressaem pelo elenco de luxo. Não sei como é que se processou a seleção, no entanto, parece que foi tudo escrito a pensar naqueles atores, principalmente Gonçalo Waddington e Miguel Góis, que interpretam, respetivamente, Sacadura Cabral e Gago Coutinho, pela amizade, pelo respeito e pelas provocações, mas também Júlia Palha, no papel de Tibita, uma jovem desprendida, leve, muito à frente da mentalidade da época. Não obstante, foi o coletivo que fez brilhar a série.

O único senão, para mim, é que a história merecia ter mais episódios: por um lado, evita que a narrativa se estenda por detalhes pouco relevantes e que se afastem do propósito inicial, mas, por outro, faz com que alguns cenários se percam e eu queria muito continuar mais tempo na companhia destas personagens, porque é impossível não darmos por nós a vibrar com o avançar de uma ideia que mexeu com o país. E, admito aqui, houve lágrimas no episódio final, porque fica um sentimento agridoce.

É impressionante como há tanto que se ganha com este projeto, mas como questões da nossa vida pessoal sofrem com essas decisões: o objetivo é claro e o esforço que se está disposto a abraçar para o alcançar também, no entanto, não deixa de entristecer a noção de que para chegar àquele patamar é necessário abdicar de certas coisas, quase como se fossem incompatíveis. Porém, talvez seja apenas uma questão de prioridades.

Regressando ao tema das travessias que esperava encontrar, permitam-me listar tudo aquilo em que cada um dos episódios me fez pensar, para além da coragem nacional.

  • Episódio 2: A aviação como ponte entre povos, a vontade/o desejo de trazer esperança a muita gente e a diferença entre fazer coisas com alma ou por ego;
  • Episódio 3: O papel da mulher na sociedade, as burocracias que, embora sejam necessárias, atrasam sonhos, as relações que ficam comprometidas (porque não dá para esperar por quem está só de passagem), o medo de ficar parado;
  • Episódio 4: O quanto termos alguém que acredite em nós, nas nossas capacidades, é uma força extra, a inteligência emocional para gerir percalços;
  • Episódio 5: O mundo parece em suspenso por causa da travessia, mas a verdade é que a vida das pessoas que ficaram em terra não parou;
  • Episódio 6: A importância de não recuar, mesmo que o desfecho não seja o idealizado, tentar esconder fraquezas, mas não permitir que a teimosia leve a melhor sobre aquilo que será melhor para nós, para algo maior do que nós.

Acredito que A Travessia possa abrir uma porta para períodos pouco falados.

Fotografia da minha autoria



O Dia Mundial da Poesia é uma efeméride que gosto sempre de assinalar. Este ano, não lhe dediquei uma publicação particular, mas celebrei-o na companhia de dois livros dentro do género - e que me permitiram regressar à escrita de Adília Lopes e de Lídia Jorge.


um jogo bastante perigoso, adília lopes

Um Jogo Bastante Perigoso marca a estreia de Adília Lopes no universo literário (e poético) e o título não podia ser mais claro quanto à sua intenção, porque as palavras, principalmente aquelas que colocamos em versos, podem insinuar uma certa ameaça, já que as suas entrelinhas são capazes de esconder um mundo cheio de camadas e interpretações.

Adelaide Ivánova, na nota introdutória, referiu que ler Adília Lopes é uma tentativa de «juntar as pistas de uma charada que nunca nos é posta», porque ela brinca com o que nos entrega, com os significados que nos parecem claros, mas que, ainda assim, nos levantam várias questões. Os seus poemas transmitem uma certa simplicidade, no entanto, há um jogo de contrastes que nos deixa sempre na dúvida. E, apesar de ser apenas o segundo livro que leio da autora, estou fascinada com esta dinâmica.

Com um tom que interliga uma escrita próxima com observações complexas, sinto que não há qualquer inocência nestes versos. Há, sim, uma certa desconfiança em relação ao que conhecemos, ao que assumimos como inquestionável, aos padrões que vamos construindo e deixando para trás. Talvez por essa razão oponha sempre o «divino e o mundano», «a perversão e a compaixão», «a tesão e a repressão», mostrando-nos que a forma como expomos as nossas observações pode alterar-se pelas palavras utilizadas.

Adília Lopes brinca com as palavras de um jeito quase descomprometido, como se só estivesse a partilhar pensamentos inconsequentes, mas cada um deles fica a ecoar por dentro. Na lista de poemas favoritos de Um Jogo Bastante Perigoso destaco Um Quadro de Rubens, A Propósito de Estrelas, As Flores de Papel e A Salada Com Molho Cor-de-Rosa.

🎧 Banda Sonora: A Cidade (Até Ser Dia), Anabela | Entre as Estrelas, Jimmy P & Diogo Piçarra | A Vida Segue Lá Fora, Lúcia Moniz



o livro das tréguas, lídia jorge

O meu primeiro e único contacto, até ao momento, com Lídia Jorge tinha sido através do extraordinário Misericórdia. Ao percorrer o catálogo do Kobo Plus, cruzei-me com o seu livro de poesia e achei que seria interessante descobri-la também neste género.

O Livro das Tréguas compila 50 poemas escritos em diferentes datas e respeitando estados de espírito distintos. Dividido em cinco partes - Com a Origem, Com os Preceitos, Com os Factos, Com as Fábulas, Com o Tempo -, estamos perante uma espécie de autobiografia consentida, de acordo com as palavras da autora. Por isso, fazemos uma travessia pelo início do percurso, pelo futuro e por todos os limites entre eles.

A cadência da escrita agradou-me, até porque fiquei com a impressão de que une um lado utópico a um lado mais provocatório. E a verdade é que, de um modo mais ou menos evidente, a vida vai-se construindo nestes contrastes, como se fossem metades de uma mesma moeda. Assim, transitamos entre vivências, inquietações e emoções; transitamos entre espaços e tempos, reconhecendo que é essa linha cronológica que conta a sua história, ainda que não saibamos identificar as partes que são verídicas.

Não obstante, admito não estar certa de ter compreendido bem alguns dos poemas, porque acho que a intenção é menos clara. A escrita não me parece complexa, mas as imagens que os versos criam levantam mais dúvidas quanto à sua mensagem. Apesar disso, acho que é esse jogo que torna a obra interessante, visto que podemos chegar a várias interpretações/conclusões e adequá-las às nossas perspetivas e fases de vida.

O Livro das Tréguas é, no fundo, um espelho da nossa existência, embora nem todos queiramos seguir as mesmas rotas. Partindo da sua experiência, conversa connosco acerca da natureza, da sociedade, da maternidade, do próprio processo de escrita, de paradigmas, da esperança, das trevas e de como vamos ruindo e renascendo. No grupo de poemas favoritos destaco três: Correio da Tarde, Criatura e Inventário da Feminista.

🎧 Banda Sonora: Haja o Que Houver, Madredeus | Tempestade, Márcia | Criatura, Rita Onofre | Aprender a Ver, Jasmim



Morrem os poetas e a alma fica vazia
[Capicua & Toty Sa'Med]

Fotografia da minha autoria



A Caroline Criado Perez foi outro dos nomes que inclui na publicação das onze mulheres que gostava de ter lido em 2024. Como sabia que precisava da disposição certa para embarcar na leitura do seu livro, adiei a compra e em janeiro pedi à Sofia para me emprestar o seu exemplar, sendo companheiro de cabeceira durante quase dois meses.


um mundo feito para homens

Mulheres Invisíveis tem uma premissa clara: mostrar-nos como o mundo está pensado para os homens, como tudo é construído tendo em atenção as suas características. Por esse motivo, é uma obra que espelha a desigualdade de género e o quanto precisamos de continuar a derrubar muros neste caminho tão curvilíneo, vendido como unilateral.

Eu entendo que algumas condicionantes nos possam passar despercebidas, porque não se inserirem no nosso contexto/quotidiano, porque não nos pesam e não nos magoam/limitam. E isto não tem de representar falta de empatia, apenas demonstra que temos realidades distintas e que há pontos que não se cruzam. Num pólo oposto, já tenho mais dificuldade em compreender e aceitar que o mundo seja pensado para um padrão único: seja em coisas tão simples como o tamanho de um telemóvel, seja em áreas essenciais como a saúde.

«Em resumo, planear os nossos espaços públicos de um modo que exclua a metade feminina do mundo não é uma questão de recursos. É uma questão de prioridades, e, neste momento, irrefletidamente ou não, não estamos a dar prioridade às mulheres. Isto é manifestamente injusto e um caso de iliteracia económica. As mulheres têm igual direito aos recursos públicos: temos de deixar de planear a sua exclusão»

As sucessivas reflexões e pontos de debate têm em comum histórias de ausência, de desculpas para justificar a exclusão, de desrespeito, mas, por outro lado, também traz um discurso de mudança e esperança. Por causa disso, senti-me frustrada e compreendida em partes iguais, revoltei-me, apeteceu-me gritar e, depois deste caos interno, consegui sossegar. Acho impossível ficarmos indiferentes a esta obra, ainda para mais quando a autora explora diferentes áreas e ângulos e temos bem presente que os nossos direitos são colocados em causa todos os dias.

Mulheres Invisíveis toca nas feridas todas, porque expõe o quanto o mundo permanece afunilado. É um livro denso, para ser lido com tempo, tendo em conta a quantidade de informação reunida, mas necessário. Saímos mais ricos destas páginas, sobretudo se fizermos delas um impulso para invertermos a narrativa. Por mais que soe a um lugar comum, não podemos mudar o passado, mas podemos repensar o futuro: um futuro que não pode ser construído a pensar só numa das metades da humanidade.


notas literárias
  • Lido entre: 27 de janeiro e 12 de março
  • Formato de leitura: Físico
  • Género: Não ficção
  • Pontos fortes: A capacidade com que nos frustra e nos traz esperança
  • Banda sonora: Balada em Só Menor, Chopin por Miguel Proença | Louca, Gisela João | Blank Space, Taylor Swift | Invisible Woman, Owl Eyes

Disponibilidade: Wook | Bertrand
Nota: Esta publicação contém links de afiliada da Wook e da Bertrand

Fotografia da minha autoria



A capa deste livro chamou-me à atenção, no entanto, por qualquer razão que não sei explicar, fui adiando a sua compra. Depois de alguns desencontros, achei que faria todo o sentido incluí-lo na lista de leituras de março, onde apenas figuram mulheres.


dar voz a quem permanece invisível

Solitária chegou com poucas certezas e várias questões, isto porque, sendo uma história de esperança e superação, nos confronta com a sensação de estarmos aprisionados: «quantas prisões existem em cada um de nós? E de quantas ainda tem o mundo de se libertar?». É através de Mabel e Eunice, filha e mãe, respetivamente, que tentaremos obter respostas.

A viverem no quartinho dos fundos de um condomínio de luxo, porque Eunice é empregada doméstica de uma das famílias, este livro abre-nos a porta para um mundo de contrastes e de invisibilidade. A preocupação de não incomodar, de perturbar pouco o ambiente, está muito vincada na narrativa e, por isso, acabamos por assistir a dois cenários: por um lado, o da insistência de Mabel para que a mãe largue aquele emprego e, por outro, o das constantes justificações para permanecer. Transversal a ambos temos a certeza da precariedade, da dor, da identidade que se anula para satisfazer as necessidades de terceiros.

A escrita da autora é melódica e fluída, mas não filtra um contexto cheio de camadas. Aliás, de uma forma escorreita, faz-nos pensar sobre direitos laborais, luta de classes, violência e racismo estrutural. Em simultâneo, partindo de personagens credíveis, consegue dar voz a quem permanece tantas vezes na sombra, à espera de uma oportunidade digna.

«Levei anos para entender que não, ninguém quer viver assim, mas até eu assimilar tudo o que acontecia com ele muita coisa se passou. Foi preciso que eu crescesse para compreender que todo mundo tem uma história e que eu não podia cobrar coisas que ele nunca aprendeu a dar»

Também neste livro senti a necessidade de questionar o que a sociedade impõe como verdade absoluta, de quebrar padrões e alcançar algo que, infelizmente, ainda não está disponível para todos. E também aqui encontrei ciclos que se repetem, como se o caminho fosse apenas aquele - e fosse inevitável. Estas personagens vieram trazer um pouco de alento a lutas que permanecem diárias e imprescindíveis.

Solitária apresenta-nos várias perspetivas e foi neste aspeto que encontrei a sua maior fragilidade: gostei que a autora tivesse trazido narradores diferentes, mas acho que acabaram por não se diferenciar, principalmente as narradoras femininas. Apesar disso, acredito que é um livro valioso pela mensagem e por todos os simbolismos (a começar pelo título).


notas literárias
  • Gatilhos: Cenas Gráficas
  • Lido entre: 10 e 11 de março
  • Formato de leitura: Físico
  • Género: Romance
  • Personagem favorita: Jurandir, Mabel
  • Pontos fortes: A escrita e o facto de dar voz a quem continua invisível
  • Banda sonora: O Mundo é um Moinho, Cartola | Minha Preta, Bebeto | O Jardim, Cláudia Pascoal & Isaura | De Onde Vem o Baião, Gilberto Gil

Disponibilidade: Wook (Livro | eBook) | Bertrand (Livro | eBook)
Nota: Esta publicação contém links de afiliada da Wook e da Bertrand

Fotografia da minha autoria



O livro de Alba de Céspedes estava no meu radar desde que foi publicado em Portugal (maio de 2024). Ultimamente, andava a cruzar-me com a sua capa com frequência, mas foi o facto de a Rita da Nova o escolher para o Clube do Livra-te que me fez avançar para a sua leitura. E em boa hora o fiz.


impressionante como mudou tão pouco

O Caderno Proibido pertence a Valeria Cossati, que um dia «saiu de casa para comprar cigarros para o marido» e estava longe de imaginar que regressaria da tabacaria com um objeto que lhe colocaria a vida do avesso. Transformando o caderno num diário, assistiremos a uma emancipação, ainda que nada seja assim tão linear.

A escrita e as reflexões que as entradas do diário potenciam conquistaram-me com facilidade, porque nos aproximam. Aqueles problemas podem não ser os nossos, mas conseguimos compreendê-los, reconhecê-los e, inclusive, adaptá-los à nossa realidade. E, ainda que não o conseguíssemos, parece-me difícil ficarmos indiferentes aos dilemas que esta mulher enfrenta e que acabam por nos confrontar com a nossa identidade, com aquilo que nos deixa confortáveis e com a noção de termos a nossa privacidade condicionada, atendendo a que os outros têm sempre expectativas bem definidas sobre nós, sobre o que esperam de nós.

«Ao oferecer-lhes a minha experiência, tento compreender muitas coisas que aconteceram na minha vida e que aceitei sem questionar a respetiva causa»

Este livro foi publicado, originalmente, em 1952 e é impressionante perceber que mudou tão pouco em relação à condição da mulher, ao seu papel na sociedade. Por isso, permanece atual e agita-nos por dentro, mostrando-nos a importância de haver um nome, de usarmos os recursos à nossa disposição para não perdermos a nossa voz. Valeria parecia restrita à invisibilidade, ao papel de mãe e de esposa, mas encontrou uma maneira de não ficar pressa a essas amarras.

Neste seguimento, outro dos aspetos que mais me fascinou foi o poder da escrita, não só pelo ato de escrever em si, mas também por ser algo tão seu, um espaço seguro onde se podia desafiar, onde não precisava de ter medo, onde podia sonhar e traçar o caminho que quisesse. Assim, vai-se tornando mais certa da mulher que quer ser, ao mesmo tempo que encontra em Mirella, a filha, um impulso para questionar o que a sociedade impõe.

«Voltávamos para casa em silêncio, mas era justamente aquele silêncio que nos deixava atrapalhados»

Achei interessante haver sempre um jogo de contrastes, enquanto reflete sobre maternidade, casamento, ambições, dúvidas, desejos e o quotidiano. Além disso, adorei que em nenhum momento Valeria tentasse passar a imagem de mulher perfeita: pelo contrário, convidou-nos a conhecer todas as suas fragilidades, incoerências e fraquezas - e também por isso fez com que quisesse permanecer ao seu lado. Não sei se teria ensinamentos valiosos para partilhar com ela, mas quis confortá-la em vários momentos e incentivá-la a marcar a sua posição.

O Caderno Proibido superou todas as expectativas. Para além de ser uma história sobre emancipação, fez-me pensar que a vontade nem sempre é gatilho suficiente para agirmos, porque ainda há muitos pesos a impedir-nos de levantar voo. Terminar a leitura no Dia Internacional da Mulher, sinto, tornou-a ainda mais impactante.


notas literárias
  • Lido entre: 6 e 8 de março
  • Desafio: Clube do Livra-te
  • Formato de leitura: Físico
  • Género: Romance
  • Personagem favorita: Mirella
  • Pontos fortes: A escrita, as reflexões, o facto de nos fazer repensar o papel da mulher
  • Banda sonora: É Proibido, Mão Morta | Guglielmo Ratcliff: Ratcliff's Dream, Pietro Mascagni, Slovak Radio Symphony Orchestra, Ondrej Lenard | Run Away Girl, Alice Merton | Trying, Mercury | Why Am I Like This?, Cassyete

Disponibilidade: Wook (Livro | eBook) | Bertrand (Livro | eBook)
Nota: Esta publicação contém links de afiliada da Wook e da Bertrand

Fotografia da minha autoria



A Breve Vida das Flores fez-me apaixonar pela escrita de Valérie Perrin e perceber que seria uma autora para manter por perto. Quando eu e a Sofia definimos a lista para o nosso desafio de leitura, foi sem qualquer reserva que aceitei o seu nome, por isso, em março, fomos à descoberta da sua obra de estreia.


dinâmicas familiares, segredos e humor

Os Esquecidos de Domingo narra-nos a história de Justine, uma mulher de 22 anos que vive com os avós e o primo Jules, porque os pais e os tios faleceram num acidente. Para além desta informação, sabemos que a protagonista trabalha nas Hortênsias, um lar de idosos, e que este trabalho preenche os seus dias, até porque adora perder-se nas memórias dos residentes. Não obstante, é a história de Hélène, com quem cria um vínculo muito bonito, que a arrebata.

O presente destas personagens cruza-se de uma forma natural e harmoniosa, e é através da amizade que nasce entre elas que viajamos até ao passado e vamos reconstruindo silêncios, atando pontas soltas e preenchendo os vazios que insistem em ecoar.

«Temos de ser rápidos a ouvir, pois o silêncio nunca anda longe»

Fiquei fascinada com Justine desde o começo, porque acho que tem uma voz muito credível e descomplicada, com a qual me identifiquei. Achei-a empática, mas também sarcástica nos momentos certos. É muito lúcida, mas também se deixa deslumbrar. Acima de tudo, pareceu-me que tem um forte sentido de cuidado, mas sem se anular: antes pelo contrário, sabe as circunstâncias em que é necessário aparecer e aquelas em que mais vale ficar recolhida. Creio que a construção desta personagem fez toda a diferença na maneira como me relacionei com a história.

Em simultâneo, creio que a autora fez um trabalho belíssimo na maneira como nos envolve nas dinâmicas familiares, nos sonhos que ficam suspensos, nos segredos que se revelam devagar, na noção de fragilidade e na certeza de que tudo pode desmoronar-se sem aviso. Aliás, é de uma quebra que nasce uma das passagens mais memoráveis desta obra. Volta e meia dou por mim a recordar-me do quanto o destino de duas pessoas podia ter sido tão diferente.

«Diz-me que é como se ouvisse a história de outra pessoa, que as minhas palavras são mais bonitas do que a sua vida. Como me estão sempre a dizer que quando um velho morre é uma biblioteca que arde, eu salvo algumas cinzas»

Queria escrever sobre vários acontecimentos sem filtro, mas estragaria a vossa experiência de leitura. Por esse motivo, deixo-vos só com a indicação de que encontrarão detalhes arrebatadores, mistério e histórias dentro de histórias. A escrita é bastante cinematográfica e a narrativa vai crescendo página após página. Sem qualquer esforço, senti-me a caminhar ao lado de Justine e a torcer para que a sua vida chegasse sempre ao local (físico ou metafórico) desejado.

Os Esquecidos de Domingo tem um toque poético e creio que tudo surge na medida certa. Acho que não destrona A Breve Vida das Flores do lugar de favorito, mas cola-se a ele. E o final? Encantador! Não me importava nada de viver mais tempo dentro deste enredo.


notas literárias
  • Gatilhos: Saúde Mental, Morte
  • Lido entre: 1 e 4 de março
  • Desafio: 6 autores para 2025
  • Formato de leitura: Físico
  • Género: Romance
  • Personagem favorita: Justine, Jã-não-me-lembro-como
  • Pontos fortes: Tudo? A construção de personagens, o humor da protagonista, a forma como tantos pólos se interligam, a sensibilidade
  • Banda sonora: Gimme! Gimme! Gimme!, ABBA | Subzero, Ben Klock | Wonderful Life, Katie Melua | Imagine, John Lennon

Disponibilidade: Wook (Livro | eBook) | Bertrand (Livro | eBook)
Nota: Esta publicação contém links de afiliada da Wook e da Bertrand

Fotografia da minha autoria



A forma que encontrei para assinalar o Dia Internacional da Mulher em 2024, no blogue, foi através de uma lista de autoras que pretendia descobrir nesse ano. Cumpri com alguns dos nomes, outros fui descobrir em livros diferentes dos destacados e outros acabei por adiar. Neste último grupo ficou Etaf Rum, por isso, socorrendo-me da subscrição do Kobo Plus, procurei redimir-me.


mulheres que continuam a ser silenciadas

Uma Mulher Não é Um Homem leva-nos numa viagem até à Palestina de 1990 e à Brooklyn de 2008, para nos mostrar o impacto que «a cultura patriarcal pode ter no seu silêncio», apesar de o tempo avançar e de estarmos num contexto, aparentemente, mais evoluído.

É impressionante como existem histórias transversais, como existem destinos que parecem repetir-se, por mais que se procure quebrar a corrente. Deya tem 18 anos e, embora não queira casar, os avós insistem em encontrar-lhe um marido, porque o seu futuro só depende disso. Anos antes, a sua mãe Isra passou pela mesma privação. Perante esse cenário, acaba por crescer em Deya uma vontade de alcançar aquilo que não foi possível para a sua mãe: liberdade e a possibilidade de traçar o seu caminho sem estar dependente de tradições «violentas e misóginas».

«De onde venho, aprendemos a esconder a nossa condição. Somos ensinadas a manter-nos em silêncio, silêncio que nos salvaria. Só agora, muitos anos depois, descobri que isto não é verdade. Só agora, enquanto escrevo a minha história, sinto a presença da minha voz»

Sinto que este livro precisava de amadurecer um pouco na forma como alguns dilemas são abordados, para que fossem mais claras as repercussões. Além disso, sinto que alguns acontecimentos foram explorados de um modo superficial e/ou célere, o que provocou um certo distanciamento com a protagonista e a sua luta. Houve partes que me revoltaram, que me deixaram frustrada e com lágrimas nos olhos (sobretudo, pela impotência e pela injustiça), mas gostava de ter encontrado essa intensidade ao longo de toda a narrativa.

Uma Mulher Não é Um Homem é, ainda assim, uma obra de máxima importância para que não nos esqueçamos do nosso privilégio e do quanto há mulheres que continuam a ser silenciadas. Gostei particularmente da reflexão sobre o quanto é difícil ser mulher em certas zonas, mas, no fundo, ser difícil em todo o lado apenas por sermos mulheres.


notas literárias
  • Gatilhos: Violência
  • Lido entre: 17 e 21 de fevereiro
  • Formato de leitura: Digital
  • Género: Romance
  • Personagem favorita: Sarah
  • Pontos fortes: A contextualização das motivações e a comparação de realidades
  • Banda sonora: Raoui, Souad Massi | Bênção, Van Zee, Bispo & Mizzy Milles | Riverside, Agnes Obel | People Help The People, Birdy | Lose Yourself, Eminem

Disponibilidade: Wook (Livro | eBook) | Bertrand (Livro | eBook)
Nota: Esta publicação contém links de afiliada da Wook e da Bertrand

Mensagens mais recentes Mensagens antigas Página inicial

andreia morais

andreia morais

O meu peito pensa em verso. Escrevo a Portugalid[Arte]. E é provável que me encontrem sempre na companhia de um livro, de um caderno e de uma chávena de chá


o-email
asgavetasdaminhacasaencantada
@hotmail.com

portugalid[arte]

instagram | pinterest | goodreads | e-book | twitter

margens

  • ▼  2025 (117)
    • ►  junho (12)
    • ►  maio (21)
    • ►  abril (22)
    • ▼  março (21)
      • notas literárias março '25
      • florbela pâtisserie & torel book club
      • teoria das catástrofes elementares, rita canas mendes
      • bispo no coliseu do porto
      • a travessia
      • Um Jogo Bastante Perigoso (Adília Lopes) & O Livro...
      • mulheres invisíveis, caroline criado perez
      • solitária, eliana alves cruz
      • o caderno proibido, alba de céspedes
      • os esquecidos de domingo, valérie perrin
      • uma mulher não é um homem, etaf rum
      • memória um
      • enquanto lisboa arde, o rio de janeiro pega fogo, ...
      • melhor não contar, tatiana salem levy
      • minha senhora de mim, maria teresa horta
      • uma tulipa sem florescer
      • limpa, alia trabucco zerán
      • ainda compro discos e vinis
      • amar em tempo de pandemia, edgar martins valente
      • as coisas maravilhosas de fevereiro
      • notas literárias fevereiro '25
    • ►  fevereiro (19)
    • ►  janeiro (22)
  • ►  2024 (242)
    • ►  dezembro (24)
    • ►  novembro (17)
    • ►  outubro (17)
    • ►  setembro (18)
    • ►  agosto (12)
    • ►  julho (23)
    • ►  junho (20)
    • ►  maio (23)
    • ►  abril (22)
    • ►  março (21)
    • ►  fevereiro (21)
    • ►  janeiro (24)
  • ►  2023 (261)
    • ►  dezembro (23)
    • ►  novembro (22)
    • ►  outubro (22)
    • ►  setembro (21)
    • ►  agosto (16)
    • ►  julho (21)
    • ►  junho (22)
    • ►  maio (25)
    • ►  abril (23)
    • ►  março (24)
    • ►  fevereiro (20)
    • ►  janeiro (22)
  • ►  2022 (311)
    • ►  dezembro (23)
    • ►  novembro (22)
    • ►  outubro (21)
    • ►  setembro (22)
    • ►  agosto (17)
    • ►  julho (25)
    • ►  junho (30)
    • ►  maio (31)
    • ►  abril (30)
    • ►  março (31)
    • ►  fevereiro (28)
    • ►  janeiro (31)
  • ►  2021 (365)
    • ►  dezembro (31)
    • ►  novembro (30)
    • ►  outubro (31)
    • ►  setembro (30)
    • ►  agosto (31)
    • ►  julho (31)
    • ►  junho (30)
    • ►  maio (31)
    • ►  abril (30)
    • ►  março (31)
    • ►  fevereiro (28)
    • ►  janeiro (31)
  • ►  2020 (366)
    • ►  dezembro (31)
    • ►  novembro (30)
    • ►  outubro (31)
    • ►  setembro (30)
    • ►  agosto (31)
    • ►  julho (31)
    • ►  junho (30)
    • ►  maio (31)
    • ►  abril (30)
    • ►  março (31)
    • ►  fevereiro (29)
    • ►  janeiro (31)
  • ►  2019 (348)
    • ►  dezembro (31)
    • ►  novembro (30)
    • ►  outubro (29)
    • ►  setembro (30)
    • ►  agosto (16)
    • ►  julho (31)
    • ►  junho (30)
    • ►  maio (31)
    • ►  abril (30)
    • ►  março (31)
    • ►  fevereiro (28)
    • ►  janeiro (31)
  • ►  2018 (365)
    • ►  dezembro (31)
    • ►  novembro (30)
    • ►  outubro (31)
    • ►  setembro (30)
    • ►  agosto (31)
    • ►  julho (31)
    • ►  junho (30)
    • ►  maio (31)
    • ►  abril (30)
    • ►  março (31)
    • ►  fevereiro (28)
    • ►  janeiro (31)
  • ►  2017 (327)
    • ►  dezembro (30)
    • ►  novembro (29)
    • ►  outubro (31)
    • ►  setembro (30)
    • ►  agosto (17)
    • ►  julho (29)
    • ►  junho (30)
    • ►  maio (24)
    • ►  abril (28)
    • ►  março (31)
    • ►  fevereiro (28)
    • ►  janeiro (20)
  • ►  2016 (290)
    • ►  dezembro (21)
    • ►  novembro (23)
    • ►  outubro (27)
    • ►  setembro (29)
    • ►  agosto (16)
    • ►  julho (26)
    • ►  junho (11)
    • ►  maio (16)
    • ►  abril (30)
    • ►  março (31)
    • ►  fevereiro (29)
    • ►  janeiro (31)
  • ►  2015 (365)
    • ►  dezembro (31)
    • ►  novembro (30)
    • ►  outubro (31)
    • ►  setembro (30)
    • ►  agosto (31)
    • ►  julho (31)
    • ►  junho (30)
    • ►  maio (31)
    • ►  abril (30)
    • ►  março (31)
    • ►  fevereiro (28)
    • ►  janeiro (31)
  • ►  2014 (250)
    • ►  dezembro (31)
    • ►  novembro (30)
    • ►  outubro (28)
    • ►  setembro (23)
    • ►  agosto (13)
    • ►  julho (27)
    • ►  junho (24)
    • ►  maio (18)
    • ►  abril (16)
    • ►  março (14)
    • ►  fevereiro (11)
    • ►  janeiro (15)
  • ►  2013 (52)
    • ►  dezembro (13)
    • ►  novembro (10)
    • ►  outubro (9)
    • ►  setembro (11)
    • ►  agosto (9)
Com tecnologia do Blogger.

Copyright © Entre Margens. Designed by OddThemes