A [nossa] mesa do bar

Imagem retirada do google

«Lugares maravilhosos são aqueles onde vivemos histórias inesquecíveis»


Ingressamos no ensino superior e a faculdade/universidade passa a ser a nossa casa. Para muitos, a primeira; para outros, a segunda; e para um grupo muito restrito, um lugar (quase) a evitar. Independentemente disso, todos acabamos por descobrir uma espécie de nicho, que passa a ser mais nosso do que aquilo que muitas vezes percebemos.

Quando entrei na ESE, não tinha propriamente um lugar fixo. Acho que fui descobrindo, em conjunto com os meus, vários pontos que nos deixavam confortáveis enquanto trocávamos longas conversas. E era para lá que íamos, sem grandes questões, quase como se ouvíssemos um chamamento silencioso. E quando chegávamos, sentíamos que era ali que pertencíamos. Era a nossa imagem. E já era inevitável associarem as nossas caras aos locais em questão. Inconscientemente, fomos testando vários, até nos acomodarmos na rampa. E até era estranho quando não nos viam por lá. Só que todos passamos por mudanças. Umas mais visíveis do que outras. E nos últimos três/quatro anos até o nosso lugar mudou! Não me recordo do primeiro dia. Algo me diz que foi uma transição suave e, talvez, necessária. Mas a nossa presença tornou-se regular. Natural. E, uma vez mais, identificável: porque já era nosso. E muitos passaram a reconhecer-nos ali, naquela mesa do bar, que para os desconhecidos era só mais uma. Para nós, passou a ter história. E uma infinidade de vivências.

Passávamos a porta, virávamos à esquerda, descíamos os degraus e lá estava a primeira grande mesa redonda. Fisicamente, não tem nada que a diferencie, mas emocionalmente guarda mais do que qualquer outra. Podem discordar. Já eu tenho toda a certeza disso. Ainda que de uma forma figurada, vi-a a aumentar e diminuir de tamanho, pelas pessoas que ficaram e pelas que acabaram por partir. Pelas confidências. Pelas horas de almoço em que eram corpos a mais para aquele pedaço de madeira, mas a verdade é que se arranjava sempre lugar para mais um. E por todas as horas mortas em que éramos apenas duas à espera do regresso daqueles que ocupam as cadeiras. E o nosso coração.

Sempre cheguei cedo. Às 8h20 já estava a sentar-me naquele lugar que me dava uma visão periférica de tudo, mesmo nos dias em que não tinha aulas. Passaram, consequentemente, várias gerações pela minha capa traçada. E quase todas elas, por frete ou por vontade, chegavam com um «Bom dia Excelentíssima Doutora/Veterana Andreia Morais», como se aquele lugar fosse uma receção. Hoje, alguns sentam-se ao meu lado. E partilhamos mais do que um simples cumprimento. Partilhamos abraços, novidades, dias menos bons e muita estupidez à mistura. Vi tanta coisa. E ouvi na mesma medida. Ri muito. E ri alto. Chorei. Calei algumas desavenças. Troquei olhares cúmplices. Deixei de parte o orgulho. Escrevi o meu Relatório de Estágio. Estudei (e fiz de conta também, porque nem sempre a nossa concentração colabora). E até um teste já fiz sentada naquela mesa, a ser interrompida de cinco em cinco segundos com os tais «Bons dias» personalizados e a sentir o tempo contado, porque queríamos terminá-lo o quanto antes e ir para o batismo de consciência tranquila. Pode ser um cliché, mas se aquela mesa falasse havia matéria suficiente para três livros, cinco filmes e uma dramatização. 

Eu sei, «é só uma mesa», «podia viver tudo isto noutro lugar qualquer»... Não, na realidade não podia, porque não há nada que pague um «estranhei não te ver na mesa do bar» ou, então, um «vou cedo, pois sei que quando chegar a Andreia já lá está». E até podemos não ter trocado mais do que silêncio, mas a presença conforta. E, quer queiram quer não, perceber que sentiram a nossa falta sabe bem. Claro que haverá sempre alguém a dizê-lo por conveniência, mas a verdade dos nossos nós aprendemos a distinguir.

Há um tempo para tudo. O meu, este ano, foi de despedida. E em jeito de brincadeira, quando nos perguntavam quem iria ficar na mesa depois de irmos embora, respondia que íamos instalar um sistema de choque, para impedir intrusos. A gargalhada vinha logo de seguida. Mas, pensando mais a fundo, não gostamos que nos ocupem aquilo que sentimos como nosso. Mas percebemos que o legado está bem entregue quando nos devolvem um «desmontam-na e levam-na com elas». E é este grau de parvoíce que nos demonstra que encontramos as pessoas certas para nos acompanhar. Inevitavelmente, deixarei de pertencer ali. Por mais visitas que faça, acabarei por não ouvir mais «quem está na nossa mesa?». E mesmo que nunca se venha a escrever a biografia de uma mesa do bar, nós ficaremos sempre ligados àquele lugar, como um imagem congelada no tempo, com a diferença de que a vida continua. E nós continuaremos a percorrer os nossos caminhos, se possível, bem perto uns dos outros. 

O meu lado saudosista talvez não esteja preparado para esta nova fase. E, não sabendo o que me reserva o futuro, talvez me peça um regresso constante. De uma coisa tenho a certeza: não é apenas uma mesa do bar. É a nossa. Que nos viu crescer e aumentar esta família de loucos, que cuida de todos com o seu jeito peculiar. Correndo o risco de soar a José Carlos Malato, já fui muito feliz ali. E espero voltar. Em breve, ou daqui a uns tempos, enquanto sentir que faz sentido fazê-lo.

O tempo não espera. Mas seja ali ou noutro lugar qualquer, espero que encontremos sempre uma mesa do bar para nos acolher!

Comentários

  1. Gostei de conhecer esse sítio tão especial.

    É curioso quando um lugar especial se transforma na nossa segunda casa. =)

    Beijinhos, minha querida!

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  2. Há um tempo de adaptação um tempo para desfrutar e depois um tempo de despedida.

    «Lugares maravilhosos são aqueles onde vivemos histórias inesquecíveis»
    Bela frase e estou de acordo.

    Um abraço, boa semana.

    Andarilhar
    Dedais de Francisco e Idalisa
    O prazer dos livros

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  3. Pode ser só uma mesa mas vai fazer parte das tuas memórias pra sempre e isso é tão bom :)
    Bjinhosss minha querida

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  4. Há lugares que contam historias...
    boa sorte e que o futuro te reserve coisas boas!


    Isabel Sá
    Brilhos da Moda

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  5. Porque, sendo essa, sim, uma verdade,
    para quem na vida possibilidades tem
    homem se forma doutor na universidade
    pelos mesmos direitos a mulher também!

    Tenha uma boa tarde Andreia, um abraço.

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  6. Tenho pena de não conhecer a vida de universitário. Deve ser uma experiência muito boa!

    Beijinho || Daniela Silva | Blog

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  7. Há lugares que serão para sempre nossos. Eu e os meus colegas costumávamos encontrar-nos sempre no átrio da universidade, aquele era o "nosso sítio", onde por vezes decidíamos não ir àquela aula chata e ficávamos ali horas e horas a conversar até cada um partir para a sua casa :)

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  8. Era a tua mesa. Opa, Andreia, juro que agora me fizeste transportar no tempo. Que saudades dos tempos de escola

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  9. Obrigado meu anjo. Sim, é mesmo isso :P Temos de cuidar muito dele!

    Que saudades. Eu e a minha grupeta também tinhamos um sítio específico no bar. Tínhamos um sítio fixo nas escadas quem subia para o primeiro andar. Tínhamos, ainda, um lugar primordial no jardim frente à escola. Há dias em que passo por diversos sítios que fazem lembrar de várias pessoas. E é tão bom sentir ainda alguma ligação. Sei lá... Talvez à imagem refletida e que me teletransporta para aquele dia, aquele lugar, com aquelas gentes :)

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  10. Quase me senti ao vosso lado, nessa mesa de bar. Que texto tão bonito!

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  11. Que texto fantástico Andreia, consegui imaginar a mesa, imaginar-te lá sentada e com o teu grupo de amigos a ter conversas e a contar piadas.
    Fiquei mesmo encantada, e, apesar de só estar no segundo ano fizeste-me sentir já tantas saudades do ano que passou, da minha outra casa, onde histórias foram escritas e muitas conversas se tiveram. Há sítios que ficaram para sempre marcados na nossa memória, que nos fazem sorrir e ter saudades de tudo que por lá se passou. Obrigada por este momento, foi mesmo agradável de se ler. Parabéns <3

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