SÉTIMA ARTE |
UM CRIME NO EXPRESSO DO ORIENTE

Fotografia da minha autoria


«O assassino ainda está no Expresso do Oriente»


A melodia ondulante do ano que nos envolveu - vinte vinte - trouxe-me uma motivação acrescida para abraçar componentes artísticas que não priorizo. Por essa razão, procurarei abrir mais vezes a porta ao mundo do cinema, permitindo-me ser surpreendida pelas histórias que se desenrolam através do meu olhar, numa cadência emocional em movimento.

É frequente preferir o livro ao filme, até porque o primeiro formato - para além de representar uma das minhas paixões - tem uma densidade e uma liberdade [quase] inesgotáveis, impressionando-me sempre. No entanto, confesso, há enredos que me apaixonam tanto, que sinto necessidade de os ver representados no ecrã, embora possa adiar esse encontro, porque é maravilhoso ver o nosso imaginário a adquirir uma forma. E um caminho. Em janeiro, do ano transato, partilhei uma lista de argumentos prioritários, sendo um deles Um Crime no Expresso do Oriente - uma adaptação cinematográfica da obra da Rainha do Crime.

Agatha Christie é fabulosa na construção de detalhes. Por isso, estava bastante expectante para ver o resultado no meio audiovisual. O enredo, por si só, é altamente improvável, levantando algumas questões. Sobretudo, como é que tantas pessoas no mesmo espaço não percebem que ocorreu um homicídio? Revestido numa onda de mistério, a dúvida é permanente. Impera a desconfiança, pistas que confundem e ligações que, transparecendo uma certa tensão, demonstram que são várias as camadas a caracterizar este contexto - porque nada é o que aparenta ser. Com um elenco de luxo, sentimos energias particulares, personalidades excêntricas e uma história muito mais profunda.

O ritmo inicial é frenético e elucidativo das competências de Poirot - a personagem mais carismática. Contudo, chegou a um ponto da ação em que se perderam pormenores importantes, tornando-a demasiado célere e, até, menos impactante. Atendendo a que houve cortes que, para mim, seriam imprescindíveis para compreender melhor as motivações do assassinato e do próprio processo minucioso do detetive. É claro que não é concebível reproduzir toda a obra literária - nem era o que aguardava. Porém, as cenas beneficiariam se se apostasse noutra construção. Neste registo, ficam várias pontas soltas, que só consegui unir porque tinha um conhecimento prévio dos acontecimentos.

Um aspeto, ainda assim, que considerei interessante foi o facto de associarem uma abordagem mais sentimental a Poirot, mostrando-nos outra faceta da sua identidade. Além disso, a idealização do plano é brilhante e o final é, também ele, maravilhoso, pois comprova o quanto a vida não é a preto e branco - há muitas áreas cinzentas -, que nem sempre existe equilíbrio e que boas pessoas também fazem coisas más. Mas há segundas oportunidades que nos permitem curar as feridas.

Um Crime no Expresso do Oriente, como é percetível, não me arrebatou. Mas entretém. Só sinto que merecia mais coerência e cuidado. E menos precipitação, de modo a não perder o foco da sua vertente policial.


Já viram o filme? 

Comentários

  1. Respostas
    1. O livro é fabuloso! O filme deixou-me um bocadinho desiludida

      Obrigada e igualmente*

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  2. Perdi a vontade de ver... filmes das obras de Agatha Christie, onde são desprezados detalhes, ainda mais com o mestre e as suas celulazinhas cinzentas, sempre atentas ao mais ínfimo pormenor, não são para eu ver!

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    1. Foi exatamente isso que senti! Cortaram detalhes fundamentais, que tornavam a história original e ainda mais misteriosa. Perdeu o encanto por isso :/

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  3. Já li o livro, e também senti o mesmo ... Entretém, assim como o filme, gostei mas não tem um lugar especial na minha memória
    Beijinhos,
    Anita On

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    1. O livro encheu-me completamente as medidas, até porque a escrita de Agatha Christie é viciante. E a narrativa está mesmo original. O filme é que, para mim, deixou a desejar. Tem partes interessantes, mas tornou-se tão célere que algumas coisas se perderam

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  4. Vi o filme de Kenneth Branagh (2017) nas salas do cinema, quando da sua estreia. Há cerca de duas semanas vi-o novamente na TV. Gosto mais do filme de Sidney Lumet (1974) com Albert Finney como Poirot, que vi diversas vezes na TV. O livro não li.

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    1. Também foi o de Kenneth Branagh que vi, precisamente por ter dado na televisão. Tenho que procurar a versão de Sidney Lumet.
      O livro adorei!

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  5. Adoro este filme :) Sou capaz de o ver vezes sem conta :)
    Beijinhos*

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  6. Por acaso nunca li nem vi o filme. Sempre ouvi falar dele mas aconteceu-me o típico "tenho mesmo de ver" que foi sendo adiado. Mas, após ler o teu post, recordei-me que tenho mesmo de o pôr em dia porque sempre tive uma curiosidade imensa por ele!

    http://bloguedacatia.blogspot.pt/

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    1. Li o livro há dois anos e adorei! O filme vi há umas semanas, na Sic, e, confesso, esperava mais. Porque tornaram o argumento demasiado célere e cortaram pormenores que, para mim, faziam toda a diferença

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  7. Quero muito ler o livro e ver o filme, mas vou sempre adiando... Tenho mesmo que resolver essa questão!

    Bjxxx
    Ontem é só Memória | Facebook | Instagram | Youtube

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    1. Neste caso, se calhar, aconselho primeiro a ver o filme. Porque, depois, podes ser surpreendida pela narrativa extraordinária.

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  8. Mais um que não conhecia, mas parece ser bastante interessante

    Beijinhos
    Novo post
    Tem post novos todos os dias

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    1. Apesar de não me ter enchido das medidas, não é uma perda de tempo vê-lo. Há momentos interessantes :)

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  9. Tudo o que é bom não cansa. Dá sempre gosto ver. Embora seja de outra época. Para quem o aprecia, talvez o considere sempre atualizado?

    Tenha uma boa noite Andreia.

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    1. Vale sempre a pena ver aquilo que gostamos. Neste caso, embora não tenha achado uma perda de tempo, é um filme que sei que, dificilmente, voltarei a ver

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  10. Vi e não gostei.
    Fiquei decepcionada com a realização do Kenneth Branagh.

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    1. Tentei mesmo não me deixar influenciar pelo facto de ter lido o livro, mas a verdade é que senti que o filme deixou a desejar. Tornou-se célere nas partes que mereciam mais desenvolvimento, acabando por não fazer justiça à história tão original e misteriosa

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  11. Aqui há tempos escrevi sobre o mesmo tema.
    https://oultimofechaaporta.blogs.sapo.pt/o-filme-um-crime-no-expresso-do-oriente-107136
    O filme não me convenceu ...

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    1. Como disse à Magui, tentei mesmo esquecer o facto de que já tinha lido o livro, para evitar fazer comparações desnecessárias. Mas senti mesmo que a adaptação não foi bem conseguida. Houve sequências muito céleres, que retiraram todo o brilhantismo do enredo

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  12. Nunca li o livro, só vi o filme e até fiz review no blogue. Eu gostei, porém, também achei que há algumas pontas soltas, uma apresentação demasiado breve das personagens, o que nos confunde por vezes. Vê-se bem, mas não devo repetir :p

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    1. Houve partes que também gostei, mas, no geral, acho que apressaram muito a ação e acabou por se perder o mistério de todo o drama policia.
      Pois, é isso, vê-se até bem, mas não nos inspira a rever

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