Mishlawi | Hard Club

Fotografia da minha autoria

«No nobody can even compare in the first place»

A perceção que temos sobre a passagem do tempo é sempre curiosa, porque é intima a relação que estabelece com a nossa ansiedade e com a nossa vontade de marcar presença em momentos especiais. Comprei o bilhete para o concerto do Mishlawi em novembro, no terceiro dia. E sinto que a espera foi longa - bem mais longa que os três meses correspondentes. Mas a data chegou, na passada sexta-feira, e passou num sopro. Com as emoções ainda à flor da pele, foi extraordinário. E dificilmente terei palavras que façam justiça a tamanha obra de arte.

A primeira parte do espetáculo ficou à responsabilidade de Hex, «que revela um som único, com mistura de influências entre Rap, R&B, Afrobeats e Rock, transmitindo uma batida brilhante, que desafia a dançar do início ao fim». Para mim, foi uma autêntica descoberta. Ainda ponderei ouvir algumas canções para me contextualizar, mas deixei que fosse surpresa. E rendi-me ao seu trabalho e à sua energia contagiantes. As duas primeiras músicas transportaram-me para uma sonoridade próxima a Sean Paul, mas é inegável o cunho muito próprio de Hex, que demonstrou uma versatilidade de estilos muito coesa e harmoniosa. Que excelente abertura.

Naturalmente, o meu coração bateu mais forte quando Mishlawi pisou o palco, até pela sensação de sonho realizado. Há muito que ambicionava esta oportunidade. E que privilégio fazer parte do seu primeiro grande concerto, em nome próprio, na cidade do meu coração. Sei que é sempre vertiginoso quando as nossas expectativas estão elevadas. Porém, não era possível mantê-las de outra maneira. E, por mais suspeita que seja, a verdade é que ele as superou a todas, proporcionando um espetáculo eletrizante, envolvente e inesquecível. Era percetível a empatia com a banda e com o publico. E, ainda, a felicidade estampada no rosto. É este compromisso que me comove e que me desarma. E é, também, por isso que o admiro.

Numa abordagem bastante visual e com experiências vocais, apaixonei-me muito mais pela sua voz, que é surreal ao vivo. Além disso, conseguiu um excelente equilíbrio entre os temas que exigiam mais adrenalina e aqueles que nos acalmavam, numa dicotomia de registos que se interliga através de linha sonora singular - o começo de Uber Driver, num tom mais acústico, teve um encanto particular. O álbum Solitaire foi, sem qualquer dúvida, o grande protagonista, mas houve tempo para regressar às origens, assinalando os seus primeiros temas. Ouvir, numa simbiose perfeita, a sala 1 a cantar All Night, Ignore e Limbo, por exemplo, foi arrepiante. Porque fez sobressair o começo de uma viagem, sinto, vitoriosa. E ele merece todo o reconhecimento possível, mesmo que me repita: pelo talento e pela identidade vincada.

O ambiente estava indescritível. E a minha vontade era de permanecer ali, a escutá-lo, a vibrar com cada interpretação, por mais um par de horas. Resumindo, cada detalhe encaixava na perfeição. E se estávamos todos em sintonia e ao rubro, essa sensação triplicou quando Richie Campbell subiu a palco para acompanhar Mishlawi na Boohoo - música que têm em conjunto. Logo de seguida, fomos contemplados com Rain. E foi a vez de Plutónio juntar-se à festa. Que trio poderoso! E eu continuo sem conseguir traduzir todas as emoções desta noite fabulosa, partilhada com a única pessoa que fazia sentido, a minha afilhada, uma vez que temos esta admiração comum. Mas acredito que a beleza e a magia das vivência passam, igualmente, por este lado indefinível, que nos fica marcado na alma e nas memórias. Para sempre!

É impossível enumerar o ponto mais alto do concerto, porque foi composto por infinitos fragmentos de qualidade máxima. Porém, não posso deixar de destacar quando cantou Honor Roll: este tema é o meu favorito do álbum, portanto, ouvi-lo ao vivo teve um impacto brutal. Em simultâneo, a interação e a envolvência despertaram uma familiaridade reconfortante, como se estivéssemos em casa, numa celebração entre amigos. No Hard Club fez-se história. E eu só espero pela próxima oportunidade de o reencontrar, para acompanhar mais capítulos da sua carreira em ascensão - o topo está tão perto.

Despedi-me de coração a transbordar de orgulho. No meio do nervosismo, consegui confidenciar-lhe o quanto foi incrível. E regressei a casa com uma fotografia a eternizar o momento. Há artistas brilhantes, com uma luz que nos conquista de imediato, como ele. Neste jogo [de] solitário, é preciso saber jogar bem as cartas. E eu acredito que as salas esgotadas passarão a ser uma constante. Obrigada por este concerto. Foi muito mais do que aquilo que imaginei ♥