MORRER A RIR: A IMPORTÂNCIA DE UM ROAST AO CANCRO

Fotografia da minha autoria



«Cancro com humor»


O humor não tem limites. No entanto, esta afirmação divide opiniões, porque ainda há assuntos tabu. E, intensificando a certeza de que é errado, evita-se brincar com os mesmos. Apesar disso, acredito que todos os temas têm o seu lado risível, porque tenho a tendência de observar a vida com leveza, para não correr o risco de a levar demasiado a sério e perder o controlo do bom senso. Portanto, não tenho pudor em rir-me de assuntos delicados, até porque, no panorama da comédia, sigo humoristas que sabem colocar o tónico no lugar certo.

O Tiago André Alves foi diagnosticado com cancro. E, enquanto doente oncológico, propôs-se a um Comedy Roast, com o intuito de, também, angariar fundos para o IPO de Lisboa. Para tal, convidou um grupo de comediantes, que «tiveram carta branca para dizer aquilo que muito bem lhes apeteceu sobre os intervenientes, o Tiago e a sua doença». O espetáculo aconteceu no dia 21 de março de 2018, no Cinema S. Jorge, e, recentemente, foi disponibilizado no Youtube, proporcionando a oportunidade de [re]ver o que se passou naquele palco. Durante pouco mais de duas horas, todas as barreiras foram quebradas, culminando num momento introspetivo e desarmante, atendendo a que convém estarmos bem resolvidos, caso contrário, encararemos cada piada como uma ofensa. Talvez seja necessária alguma coragem, mas sinto que, acima de tudo, é uma forma saudável de viver - mesmo que a luta aparente estar perdida.

É verdade que todos temos métodos distintos para gerir contratempos e que não é justo procurarmos assumir reações padronizadas perante a mesma adversidade. O cancro levou-me pessoas importantes e nunca as vi desistir. No entanto, pela idade avançada em que o descobriram, não posso garantir que agiram por otimismo ou por conformismo - porque o fim estaria sempre mais perto. O Tiago é pouco mais velho do que eu e, supostamente, o seu tempo nesta estrada deveria ser longo. Contudo, em 2017, trocaram-lhe as voltas. E, dentro de um conjunto de opções comuns, decidiu encarar a notícia com outra abordagem, porque, «se é para acabar, tem de ser em grande». Além disso, «não há nada melhor que uma boa punchline» - seja em que contexto for. É por essa razão que creio que um Roast ao cancro é genial e imprescindível - sobretudo, numa sociedade pouco preparada para abraçar esta filosofia.

Só para contextualizar, um Roast consiste «em juntar comediantes, que fazem piadas agressivas sobre o alvo - por norma, uma personalidade, neste caso, a doença do protagonista». No final, invertem-se os papéis. Assim sendo, porque é que considero que este género de eventos é fundamental? Porque, em primeira instância, nos faz perceber que há outro caminho e, depois, porque nos ajuda a reunir outras armas para o combate, mostrando-nos que nem um sacana como o cancro nos rouba a dignidade e o sentido de humor. Há perdas incalculáveis, medos e novas prioridades, mas também há um manifesto poderoso: a recusa de ficar no chão, a lamber as feridas. Portanto, como o próprio reforçou no fim do espetáculo, levar o cancro a rir não significa não o levar a sério.

Morrer a Rir é, então, uma espécie de catarse. É um mecanismo de defesa. E demonstra que a doença pode limitar-nos, porém, não tem de definir a nossa identidade - e que, afinal, talvez não existam temas intocáveis. O prognóstico do Tiago permanece pouco animador, mas o vídeo desta noite mítica arranca-nos gargalhadas sentidas. Se calçasse os seus sapatos, reconheço, não sei se teria a mesma força, mas é um exemplo que nunca esquecerei, até porque precisamos de encarar mais a vida com este filtro que equilibra o respeito e a vontade de gozar com as circunstâncias, num dialeto sarcástico que alimenta a nossa estratégia. Como alguém escreveu, «se é para morrer, que seja a rir». 

O riso pode não curar, mas, pelo menos, torna a nossa viagem mais agradável e menos inglória. Obrigada por esta preciosa lição de vida!

Comentários

  1. Se é por uma boa causa quero ver :) Porque rir é mesmo o melhor remedio :D

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  2. Vou ter mesmo que ver, deve ser muito bom.

    Beijinho grande!

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  3. Acho que vou ter de assistir mesmo, porque nada melhor que tirar um pouco do nosso tempo para nos rir.
    Beijinhos
    Novo post
    Tem post novos todos os dias

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  4. Admiro pessoas com essa capacidade e concordo que tudo tem o seu lado humorístico
    Boa semana

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    1. É preciso estarmos mesmo muito bem resolvidos por dentro, é por isso que acho inspirador criarem eventos assim. Também acho que si

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  5. Mais vale rir do que chorar. O humor gera animação. Penso que ninguém se devia sentir ofendido. Quer queiramos ou não, a morte é sempre triste. Por ser o fim da vida.

    Se possível com humor, continuação de boa semana Andreia.

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    1. A situação já é tão difícil e desgastante, que não é necessário afundá-la ainda mais nesse lado sombrio. Agora, é claro que todos temos mecanismos distintos para gerir a situação e é perfeitamente compreensível que nem todos consigam olhar um cancro com este otimismo todo. Mas pode ser que vídeos como este ajudem a amenizar a dor

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  6. Nunca tinha ouvido falar...mas brincar com doença, não me cai bem....

    Isabel Sá  
    Brilhos da Moda

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    1. Entendo perfeitamente, mas confesso que não me faz confusão, porque não é por estarem doentes que as pessoas perdem o seu sentido de humor

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  7. Não tinha conhecimento desta causa, mas a ver se tenho um tempinho e vou espreitar no youtube...

    Beijos e abraços.
    Sandra C.
    Bluestrass

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  8. Tive conhecimento disto através da página do Diogo Faro e admito que fiquei emocionada, mas, ao mesmo tempo, feliz, por ver estas lições a serem partilhadas!

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    1. Para além do espetáculo estar incrível, sinto que tem uma mensagem mesmo poderosa e inspiradora!

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  9. Não conhecia, mas acho que vou muito ver. Gosto deste tipo de amor por isso mesmo, por nos fazer ver um outro lado bom da vida, por nos fazer rir de uma forma que nos faz bem. No meio do riso, acredito que a mensagem esteja lá, de um jeito menos forte e mais iluminado. Obrigada pela partilha <3

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    1. Eu sei que este género de eventos/conteúdo/humor não é do agrado de todos, mas acredito que ajuda a desmistificar vários pontos, a começar pelo facto de mostrar que as pessoas não perdem o sentido de humor porque estão a lidar com uma doença. Além disso, acredito mesmo que estas partilhas ajudam quem estiver a passar pelo mesmo, porque ou validam uma filosofia de vida ou mostram que há outros caminhos

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