Stand Up Comedy | Roda Bota Fora

Fotografia da minha autoria

«Seis comediantes arriscam a sua vida para testar material inédito e fresco»

O humor é uma arte - e uma arma. Tão subjetiva e tão fascinante. Muitos discutem quais são os seus limites e eu continuo a defender que são os nossos preconceitos que os estreitam ou que fazem cair esses muros. Há ocasiões nas quais, se calhar, inconscientemente, não estamos preparados para determinadas piadas. Porém, isso não as torna más ou desrespeitosas. Apenas não desencadearam uma identificação em nós. O que é necessário é compreender que o alvo não é, propriamente, o sujeito, mas a situação. E quando formos capazes dessa desconstrução, o julgamento gratuito deixará de ser uma constante. Porque mentes fechadas não têm graça.

Sinto que, regra geral, os humoristas são pessoas muito bem resolvidas de dentro para fora, por isso é que têm essa predisposição quase natural para satirizar opiniões, comportamentos, acontecimentos. E é incrível o quanto nos deixam a pensar sobre determinadas questões. Porque o humor tem esse lado didático de evidenciar problemáticas que continuam a acompanhar a sociedade. E acredito, cada vez mais, que a maneira como reagimos ao que escutamos nos expõe, na medida em que demonstra o quanto estamos seguros com quem somos e com as nossas escolhas - se causar desconforto, talvez, seja pertinente refletirmos sobre a nossa postura.

Uma das falhas que pretendo colmatar é a de não ver tanto Stand Up ao vivo quanto gostaria, não só porque adoro, mas também porque a dinâmica é muito mais impactante. As emoções são sentidas no momento, sem filtros e com autenticidade. Não há cortes. E partilhá-las com uma plateia é completamente diferente. Porque a comédia preserva traços humanos, trejeitos distintivos, que funcionam muito melhor sem edição e sem estarmos atrás de um ecrã - do computador ou da televisão. É como se fosse tudo muito mais real. Naturalmente, quando o produto é de qualidade, não é o formato em que é apresentado que lhe retira mérito, apenas tem outro encanto. E há projetos que, de facto, nos aumentam a vontade de estarmos presentes, seja pelo[s] artista[s], seja pela originalidade da ideia.

Roda Bota Fora tem seis protagonistas: Guilherme Fonseca, Daniel Carapeto, Pedro Durão, Pedro Sousa, Duarte Correia da Silva e Diogo Abreu. E um palco de combate: o Teatro Ibérico, em Lisboa. Mas, afinal, em que consiste o espetáculo? Em traços gerais, «na primeira parte, cada um tem dez minutos a solo, na segunda, há um combate de oneliners [piadas curtas], onde os lutadores têm duas vidas cada. Ganha quem tiver mais risos». E é assim que, através de algo, aparentemente, simples, se cria conteúdo novo, singular e cativante. Felizmente, após quatro datas exclusivas esgotadas, decidiram disponibilizar outra, marcada para dia quatro de dezembro. Parte de mim, mesmo que seja complicado, acalenta a esperança de estenderem o projeto numa tour que passe pelo Porto. Porque me rendi ao conceito e porque confio no seu sucesso, inteiramente, merecido. Embora só siga, com maior atenção, o percurso individual de um deles, sinto que se reuniu um grupo incrível!

A descrição do projeto é, por si só, admirável, mas tem mais pontos positivos: cada sessão traz um convidado especial. E todos respeitam o código de honra: «ninguém copia o texto do outro, não há marcações, mas há um cronómetro para respeitar». E um aspeto curioso é que o que não resulta nos bastidores, «não segue para o palco». Neste ritmo alucinante, testam texto novo, sem rede, sempre dependentes da aceitação da assistência. Além disso, «nunca há termo de comparação, porque apesar de os protagonistas serem os mesmos, as armas - leia-se os textos de cada um - vão mudando». Como mencionou Guilherme Fonseca, «todos têm o seu espaço, o seu público, mas ali despem o fato que esconde o humorista atrás de caracteres e dão o salto cru e genuíno, mano a mano, para o palco». Genial!

A comédia em Portugal está «mais forte do que nunca». Sólida. Com uma excelência irrefutável. Porque os novos talentos chegaram com passos firmes, enquanto os da Velha Guarda têm a sensibilidade e a mestria de se saberem reinventar. E são criações com esta magnitude que lhe atribuem todo o sentido. Neste duelo com piada, não deixem de ler o artigo de José Paiva Capucho, que acompanhou o antes, o durante e o depois. Para quem, como eu, não pode estar presente, ainda há esperança, porque os três primeiros Roda Bota Fora já estão disponíveis online. Preparados para o combate?