Inconfidências | O Desrespeito nas Redes Sociais

Fotografia da minha autoria

«Quando tudo for pedra, atire a primeira flor»

As redes sociais podem ser a extensão - e nunca a substituição - de uma mesa redonda de amigos, onde se partilham pensamentos, pareceres, memórias e ideias. É nesta troca que evoluímos, porque aprofundamos pontos de vista singulares e, inclusive, aprendemos que não há apenas uma maneira de observar o mundo. E por mais que as nossas perspetivas divirjam, existe uma base que não se pode perder: a do respeito. Esta componente é essencial, quer nas conversas ao vivo, quer naquelas que estabelecemos à distância de um comentário.

Causa-me uma certa angústia quando me deparo com mensagens pouco simpáticas - mesmo que não me sejam endereçadas. Porque não compreendo a sua necessidade. É-me completamente impossível acompanhar o seu propósito, até porque defendo que o nosso tempo deve ser ocupado, unicamente, com aquilo que nos interessa e que nos move. Porquê desperdiçá-lo a propagar ódio? Será que não temos outra maneira de alimentar - ou de gastar - a nossa energia? É perfeitamente natural discordarmos e não gostarmos de determinados assuntos. E é aceitável demonstrá-lo, desde que o façamos com fundamento e sem recorrer a algo tão primário como o insulto. Porque uma coisa é criticarmos como mera análise, outra totalmente diferente é perdermos o foco e a integridade. E isto leva-me a concluir que, atualmente, uma fração da sociedade não sabe partilhar opiniões, não sabe manifestar apreciações contrárias, sem fomentar a divisão. Porque há uma recusa clara de espaço para a diferença e porque há sempre alguém a reprovar a nossa postura e as nossas demonstrações públicas - de perceções, de afetos, de sentimentos - como se existissem donos da verdade.

As plataformas digitais são uma porta aberta para esse escrutínio. E o certo é que há pessoas que conseguem ser bastante desagradáveis e, pior, cruéis. Muitas vezes, escondidas no anonimato, sentem um enorme poder ao expressarem o que querem sem lhes podermos atribuir um rosto. No entanto, a ousadia já é tanta que essa questão não as preocupa. Atrás de um computador, julgam-se no direito de escrever o que pensam sem atenderem aos limites, porque se desresponsabilizam a troco de uma falsa liberdade de expressão. E isso não é só desnecessário, é também ridículo e triste. E só evidencia a pouca abertura que temos [sem querer generalizar] em relação ao outro: aos seus gostos, às suas criações, à sua criatividade. Porque na mente fechada de alguns, que permitem que seja a mesquinhez a ofuscar o seu coração, se não é do seu agrado, então, é porque não tem qualidade. Em que universo? É preciso que desçam do pedestal, que percebam que uma opinião não faz um artista e que há sempre uma forma mais cortês de lhe fazer chegar esse parecer negativo. Não somos obrigados a gostar de tudo. Mas isso não nos atribui sinal verde para verbalizarmos injúrias e, em situações extremas, ameaças.

Outra sensação com que fico é que há uma grande necessidade de atenção. Caso contrário, não enveredariam por esses comentários que em nada acrescentam na jornada - de quem os constrói e de quem os lê. E quanto maior for a exposição do visado, maior é o número de tentativas maldosas, cujo único objetivo é beliscar a sua paz interior. Além disso, se pesar a balança, sinto que perdem mais tempo a diminuir o trabalho de quem não apreciam do que a valorizar aqueles que admiram. Qual é a lógica? A convivência online seria muito mais vantajosa e prazerosa se cada um aprendesse - e colocasse em prática - que a ofensa não é, de todo, uma opção viável. E que, independentemente de nos identificarmos ou não com certos conteúdos, continuamos a ser pessoas: com metas e com sentimentos. Impormos uma perspetiva através da falta de respeito gratuita é errado a vários níveis.

O discurso de ódio - com que tantas vezes nos deparamos nas secções de comentários das inúmeras plataformas - é uma consequência direta da intolerância. E revela uma falha socioestrutural profunda, promovendo a violência verbal e a discriminação. Porém, isso não é um problema exclusivo das redes sociais. É um problema da raiz do ser humano, tão cego por cinco segundos de fama, que compromete todo o seu caráter. Ou será que nunca o chegou a ter?