Avenida dos Aliados | Diogo Piçarra

Fotografia da minha autoria

«E voltamos ao nosso Era uma vez»

A noite estava fria. As luzes da cidade cobriam o céu de um tom quente. E, ao longe, enquanto me despedida da estação de S. Bento, avistava uma Avenida dos Aliados - tão familiar e sempre tão intensa na forma como nos acolhe no seu regaço - a ser preenchida por uma moldura humana plural, distinta e unida por um motivo comum: o concerto do Diogo Piçarra, que voltou a fazer história.

Silêncio. Mesmo em andamento e a trocar breves opiniões com terceiros, o meu coração necessitou desta pausa, deste sossego interior, para absorver a magia transferida do palco para o meio da multidão. Éramos muitos, tantos que não saberia precisar, de várias idades, nacionalidades e experiências de vida. Ao meu lado, numa fase inicial, estava um casal que, atendendo ao seu ar mais maduro, teria idade para representar os meus avós. E, ternamente, estavam abraçados e embalados por canções que sabiam de cor. Não trocamos uma única palavra, mas o brilho no olhar foi bastante esclarecedor. E terminei a noite perto de uma Francesa, a pedir-me, se possível, para lhe escrever o nome do artista no telemóvel, porque estava rendida. Este é o encanto umbilical da música. É este despertar de sensações e emoções, ainda que possamos não partilhar o mesmo idioma. E sem dar conta, este calor humano e artístico afastou qualquer brisa mais forte, porque a energia teve um impacto muito mais grandioso. E inspirador!

O palco é o mundo do Diogo. E ele cuida-o como nenhum outro. Por mais que me repetia, não é só a voz dele que é especial. Não são só as letras que nos tocam. Não é só o espetáculo que ele cria que nos deixa sem palavras. É a sua humildade. É a sensibilidade com que interpreta cada tema. É o respeito que demonstra pelo público. E é, também, a sua capacidade de superação e a habilidade de se reinventar. Conhecia cada uma das músicas como a palma da minha mão, mas é extraordinário escutá-las e perceber que, por mínima que fosse, havia uma mudança. Mesmo preservando o seu traço familiar, todas tinham uma nova roupagem, uma nova abordagem. E isso é um claro sinal de trabalho, de entrega, de compromisso.

A generosidade é, igualmente, uma constante. E dividiu protagonismo com o Agir e o Jimmy P, que vieram abrilhantar a ocasião. E houve ainda tempo para uma homenagem comovente e genial aos Linkin Park. E, claro, perante uma enorme parede de afeto, foi impossível não me arrepiar a ouvir este medley. E nem me preocupei em esconder o quanto estava emocionada por ter a oportunidade de, presencialmente, perder-me nos encantos do EP Abrigo. Porém, como esta ligação nunca é unilateral, foi reconfortante sabê-lo atento quando, a uma só voz, entoamos, por exemplo, a Paraíso. Há situações que nos desarmam. E eu sinto que todos os seus concertos terão esse efeito em mim, porque transparecem verdade. E porque, inevitavelmente, acompanhando os seus passos firmes, o admiro cada vez mais.

O Porto é a minha cidade-casa. E este momento foi amor no estado mais puro. Só podia terminar o ano com um enorme sentimento de gratidão, porque partilhamos algo verdadeiramente memorável. Embora cada espetáculo seja único, espero repetir este privilégio infinitamente. Que os nossos caminhos se cruzem sempre que for possível, porque «se isto é o paraíso, então, já não preciso de outro lugar». Obrigada ❤