ENTRELINHAS | NA BOA!

Fotografia da minha autoria


«O segredo português para a felicidade»


A felicidade é um conceito entusiasmante. E passamos uma vida inteira a correr para os seus braços. Num país que trata a melancolia com proximidade - como se fosse uma extensão da sua identidade -, onde o «salário mínimo é mesmo mínimo, os transportes públicos estão sempre atrasados e é preciso dormir à porta da Segurança Social para se ser atendido», torna-se intrigante compreender como é que existem tantos portugueses felizes. Mas, afinal, a resposta é simples e concentra-se numa «expressão singela», que nos caracteriza enquanto comunidade.

Diogo Faro, na qualidade de fundador e presidente do Instituto Português dos Altos Estudos para a Felicidade [IPAEF], com sede na sua cabeça, realizou uma série de pesquisas e descobriu o segredo deste povo, que vive num jardim à beira-mar plantado. O resultado de todas as informações recolhidas surgiu compilado numa obra literária, numa espécie de manual, bem ao estilo d' O Livro do Hygge. Na Boa!, com uma linguagem rigorosa e acessível, permite-nos encarar o seu conteúdo a partir de duas perspetivas: como uma representação da realidade ou, então, como uma sátira. Pessoalmente, fui capaz de estabelecer uma ponte entre ambas, até porque há comportamentos tão enraizados, tão nossos, que se torna impossível não ironizar sobre os mesmos.

Esta coletânea apresenta, portanto, um conjunto de sugestões e dicas em várias áreas da vida humana. E, aparentando um registo sério, que rapidamente se desconstrói, embarcamos numa viagem «ao mundo da filosofia dos portugueses», ao portugotimismo, ao traço descomplicado e à postura do «deixa andar». Porque, como o próprio autor evidencia, é muito fácil sermos felizes em países como a Dinamarca, onde tudo é próspero, mas, em Portugal, exige-se um nível de criatividade elevado. Ao qual correspondemos, tendo em consideração que somos exímios na arte do desenrasque. E isto não é uma crítica à nossa essência [talvez, um pouco], é a constatação de um facto [ou vários] que pode ser mais ou menos caricaturado, dependendo da figura que for protagonista. Porque todos temos formas de estar no mundo diferentes. E é, também, por essa razão que acredito que esta narrativa funciona como um despertar de mentes e contextos, possibilitando-nos um entendimento basilar: a comparação é uma tarefa inglória, pois partimos com bagagens e ferramentas de [sobre]vivência distintas. E a maneira como as aproveitamos é, igualmente, singular.

A tomada de consciência é palpável, mas, em primeira instância, divirto-me sempre a ler as crónicas e as observações de Diogo Faro, sobretudo, pela análise interessante e pouco influenciável da realidade. Além disso, conversa num dialeto que me é caro: o sarcasmo. Este Na Boa!, que foi um desafio proposto pela editora, apresenta uma leitura rápida e descontraída, vagueando - de minis e tremoços na mão - por camadas que vão desde as redes sociais ao sexo, da família aos amigos, do Fado ao Futebol, passando pelo Festival da Canção, sempre de mente aberta. E é uma clara prova da criatividade do humorista.


Deixo-vos, agora, com algumas citações:

«A única altura em que vemos o copo meio vazio é quando não é uma metáfora e o conteúdo é vinho. De resto, há sempre um lado bom em cada situação, do qual fazemos por tirar o máximo partido» [p:23];

«Alguns dos momentos mais felizes da minha vida, e acredito que também da vossa, foram ao ar livre» [p:51];

«Sentirmos, de vez em quando, pena de gente mais pobre, mais doente, com mais azar generalizado, mas que no fundo não nos importa quase nada, vai apenas contribuir para o nosso bem-estar porque vamos pensar "pelo menos, não é comigo". E este sentimento, apesar de parecer um pouco frio, é perfeitamente natural no ser humano e não temos de nos sentir más pessoas por causa disso» [p:75];

«Claro que estes critérios são muito pessoais e é natural que não os comunguemos. Mas é realmente importante que olhem para o vosso trabalho e percebam quem é que vos traz boas e más energias» [p:92];

«[...] faz-nos bem entrar em discussões. Podemos ser sérios e argumentar de forma cuidada, mas o ideal é optar pelo insulto aleatório e gratuito» [p:102].


Disponibilidade: Wook || Bertrand

Nota: O blogue é afiliado da Wook e da Bertrand. Ao adquirirem o[s] artigo[s] através dos links disponibilizados estão a contribuir para o seu crescimento literário - e não só. Obrigada ♥

Comentários

  1. Não conhecia, mas vou tomar nota.

    Isabel Sá  
    Brilhos da Moda

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  2. Já tinha ouvido falar de Diogo Faro, mas desconhecia o livro. Mais um para a longa lista.

    Beijinho grande!

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    1. Sou suspeita, porque gosto bastante do seu trabalho, mas vale muito a pena :)

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  3. Mais um que ainda não conhecia mesmo
    Beijinhos
    Novo post
    Tem post novos todos os dias

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  4. Realmente, isto é tão verdade e concordo com o Diogo :) Sou a Feliz porque levo tudo na boa :) à boa maneira tuga :) Fiquei curiosa em relação ao livro ;)
    Beijinhos

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    1. Muitas vezes, é preciso levar as coisas na boa, até para não nos saturarmos. É um livro bastante engraçado :)

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  5. «O segredo alemão para a felicidade» é o tema do meu próximo livro!!!

    Um Dia de São Nicolau muito feliz. Há maneira portuguesa, está claro!!!

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  6. Deixaste-me curiosa com a obra! :)

    www.amarcadamarta.pt

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  7. O escritor brasileiro Guimarães Rosa escreveu que "felicidade se encontra é em horinhas de descuido", penso que ele quis dizer que às vezes, muitas vezes, quando menos esperamos é que ela aparece. Pode ser assim. Mas pode ser, também, é claro, uma busca consciente, um movimento em direção ao sentimento esse, aliás, movimentar-se, abrir possibilidades, margens, isso é propício para atrair momentos de felicidade, porque não é algo constante. Nada é, tudo está: existir é transmutar. :)

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    1. Também acredito nisso. Há alturas em que, sem contarmos, somos invadidos por uma enorme felicidade e isso é fantástico.
      Concordo totalmente consigo, Ulisses. São ambas possibilidades válidas, que nos enchem o coração

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  8. Sigo o Diogo Faro no instagram e gosto dele, por isso, acho que este deve ser um bom livro :p

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    1. Tem uma expressão muito particular e sarcástica, adoro :D acho que ias gostar deste livro

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  9. Esse livro está na minha lista do próximo ano *-*

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