![]() |
| Fotografias da minha autoria |
O livro abre-se e o som do mundo vai diminuindo. Esta imagem traz-me um certo nível de conforto, porque, por mais que os meses sejam cinzentos, parece que há sempre uma história para nos amparar, para apaziguar as nossas dores ou, então, para nos abrir os olhos e fazer perceber que, se calhar, podemos respirar porque temos mais motivos para sorrir.
Este ano não foi particularmente difícil, mas teve momentos desafiantes, com pequenos sustos pelo meio, e sei que a quantidade de obras lidas também reflete a necessidade de desligar e de encontrar um refúgio — sem esquecer, ainda assim, que parte da magia de ler é descobrir as histórias por aquilo que elas são e não apenas reduzi-las a uma espécie de penso emocional, pronto a curar feridas, a colar estilhaços.
Sinto que vou ficando mais exigente com as leituras que faço e, talvez por isso, 2025 não trouxe muitos livros arrebatadores. Foi uma travessia literária bonita na mesma, que me permitiu descobrir autores novos e enredos que não esquecerei, no entanto, tive menos dores de cabeça para chegar à lista final de favoritos do ano.
Este ano, não houve Alma Lusitana, mas abracei o desafio 5 autores para 2025 com a minha amiga Sofia. Descobri algumas propostas do Livra-te, priorizei os títulos que já tinha cá em casa, fui explorando o catálogo do Kobo Plus e da BiblioLED e iniciei um desafio que quero levar para 2026 (e que se prolongará para além dele). Portanto, creio que passei a maior parte do tempo mergulhada em histórias.
antes dos favoritos, algumas curiosidades literárias
No início do ano, criei duas páginas no Notion para ir registando estatísticas das minhas leituras, para além da componente numérica, porque são estes dados que me entusiasmam. Além disso, voltei a recorrei ao The Storygraph e ao Goodreads.
- Os moods de leitura com maior destaque: emocional, reflexivo e triste;
- Autores mais lidos: Elena Ferrante (5), Emily Henry (5) e Afonso Cruz (4);
- Este ano não fiz qualquer releitura;
- Cruzei-me com personagens memoráveis: Miranda Pritchard e Sarah Gross (Perguntem a Sarah Gross), Lia (Notas Sobre a Impermanência), Eduardo (Apesar do Sangue), Alice e Maria Elvira (A Árvore Mais Sozinha do Mundo), Freda Stefan (Lobos), Zee (Mártir!), Janina (Conduz o Teu Arado Sobre os Ossos dos Mortos) e Peppino (Um Tempo a Fingir); mas também o grupo de amigos que encontrei em 10 Minutos e 38 Segundos Neste Mundo Estranho e as personagens d' Os Transparentes;
- Li: 46 autores novos; 61 autoras e 33 autores; 54 portugueses e 40 estrangeiros.
agora, sim, as estrelas da companhia (e com duas menções honrosas)
Permitam-me, antes de avançar, fazer uma pequena ressalva: a lista que se segue é uma combinação entre ordem de leitura e lembrança, não corresponde a um pódio propriamente dito.
PERGUNTEM A SARAH GROSS, JOÃO PINTO COELHO
Creio que me cruzei com protagonistas que dificilmente esquecerei, porque, acima de tudo, o livro é sobre elas, sobre as suas histórias, sobre as suas dores, sobre a forma como resistiram às mais diversas circunstâncias. E sem que seja possível esquecer, também, este período histórico, fica evidente que não estamos perante mais um retrato dentro do tema: o autor trouxe uma perspetiva que parece estar em falta (opinião completa).

O CADERNO PROIBIDO, ALBA DE CÉSPEDES
Este livro foi publicado, originalmente, em 1952 e é impressionante perceber que mudou tão pouco em relação à condição da mulher, ao seu papel na sociedade. Por isso, permanece atual e agita-nos por dentro, mostrando-nos a importância de haver um nome, de usarmos os recursos à nossa disposição para não perdermos a nossa voz. Valeria parecia restrita à invisibilidade, ao papel de mãe e de esposa, mas encontrou uma maneira de não ficar pressa a essas amarras (opinião completa).

FILHO DO PAI, HUGO GONÇALVES
Há, portanto, uma análise quase sociológica, mas sem perder a emotividade, o traço familiar, o impacto da perda, as nossas idiossincrasias, as nossas incoerências, fruto de um crescimento que é sempre mais emocional do que racional. E enquanto nos implica numa conversa sobre parentalidade, faz-nos observar toda a estrutura familiar, faz-nos pensar sobre as feridas que continuam abertas, ainda que nos incomodem com menos ardor, faz-nos voltar às coisas que nos dizem e que ecoam uma vida inteira, moldando o nosso caráter, as nossas certezas, as nossas carências, tudo o que somos (opinião completa).

EDUCAÇÃO DA TRISTEZA, VALTER HUGO MÃE
Educação da Tristeza é um objeto visualmente lindíssimo, cheio de cor, de vida e de memórias que nos amparam e que trazem esperança. Com ilustrações de Valter Hugo Mãe, parte da ausência para nos fazer refletir sobre o quanto a nossa vida é cheia por termos tido aquelas pessoas por perto. Também é por isso que a sua perda nos magoa mais, mas continuo a acreditar que as saudades partem de um lugar benigno, de um amor que é incondicional. O quotidiano fica fragmentado, mas nunca esqueceremos (opinião completa).

VERÃO NO LAGO, ANN PATCHETT
Ann Patchett, com a sua escrita melódica, equilibrou muito bem a travessia entre o presente e o passado, recuperando mágoas e apaziguando feridas, mostrando que há sempre várias camadas dentro da mesma história e que as pessoas nem sempre correspondem à imagem que criamos delas, mas sem a necessidade de construir vilões. Acho que não tenho palavras que descrevam com justiça a sensação que tive durante a leitura, mas achei a narrativa mais madura, de quem nos conta os factos em paz (opinião completa).

OS ESQUECIDOS DE DOMINGO, VALÉRIE PERRIN
Fiquei fascinada com Justine desde o começo, porque acho que tem uma voz muito credível e descomplicada, com a qual me identifiquei. Achei-a empática, mas também sarcástica nos momentos certos. É muito lúcida, mas também se deixa deslumbrar. Acima de tudo, pareceu-me que tem um forte sentido de cuidado, mas sem se anular: antes pelo contrário, sabe as circunstâncias em que é necessário aparecer e aquelas em que mais vale ficar recolhida. Creio que a construção desta personagem fez toda a diferença na maneira como me relacionei com a história (opinião completa).

10 MINUTOS E 38 SEGUNDOS NESTE MUNDO ESTRANHO, ELIF SHAFAK
10 Minutos e 38 Segundos Neste Mundo Estranho não romantiza a magoa, não esconde a dor de um país a regredir, nem as consequências de vários tipos de abusos. Com uma escrita comovente, é, também, uma carta de amor e, acima de tudo, é a prova de que é possível transformar a dor e prosperar (opinião completa).

APESAR DO SANGUE, RITA DA NOVA
A minha mente divagou muito durante a leitura, porque sinto que é um livro capaz de desencadear vários debates: sobre maternidade, sobre a necessidade de preenchermos vazios, sobre fissuras, sobre diferentes tipos de dor, sobre como aquilo que não vemos condiciona a nossa perceção das situações, sobre dinâmicas familiares e sobre amor. Existe muita tristeza nesta história, no entanto, o amor é força motriz em muitos dos seus momentos, aliás, só isso justifica a forma como se foram curando algumas feridas (opinião completa).

LOBOS, TÂNIA GANHO
É curioso constatar que este livro é mais sobre os silêncios e a forma como as pessoas lidam com os seus traumas, com os seus demónios, e não tanto sobre a situação em si, porque aquele momento termina, mas a vergonha, o medo, o desgaste, o desamparo, a sensação de perdermos a nossa identidade e, inclusive, o gosto por viver persistem e fazem com que as feridas continuem expostas, a magoar. E este livro dói, embora não queiramos parar de o descobrir, porque talvez a esperança encontre o seu espaço (opinião completa).

MÁRTIR!, KAVEH AKBAR
Há um tom triste a pairar nestas páginas, mas a narrativa é frenética, porque, de repente, parece estar em todo o lado. Enquanto lida com o luto, vai refletindo sobre religião, emigração, ancestralidade e guerra; equaciona o significado da vida e procura reinventar-se, nunca escondendo o desejo de ter uma morte grandiosa. E nós, leitores, acompanhamos cada um dos seus pensamentos sem um segundo de descanso (opinião completa).

Menções honrosas: Caruncho, Layla Martinez | Enquanto o Fim Não Vem, Mafalda Santos.







2 Comments
Boas sugestões! Quero muito ler o Caderno Proibido. Bom ano novo e boas leituras!
ResponderEliminarÉ maravilhoso! Estou cheia de vontade de o reler
EliminarObrigada e igualmente, Inês