Entrelinhas #68

Fotografia da minha autoria


«Um nome, um destino»



O meu primeiro contacto com John Green aconteceu de uma forma indireta, pois, contrariamente ao que aprecio fazer, vi o filme A Culpa é das Estrelas e só depois é que me deixei encantar pelo livro [aqui]. Uma vez que tanto a narrativa, como o estilo de escrita do autor me agradaram, rapidamente, compreendi que o seu nome figuraria nas minhas escolhas, até porque fiquei com vontade de conhecer mais obras suas. Em contrapartida, David Levithan era uma figura desconhecida. Mas essa questão não foi impeditiva na hora de adquirir a história que escreveram em conjunto.

Will e Will tem uma premissa curiosa e, pelo menos para mim, original. O que, inconscientemente, nos deixa com uma predisposição maior para absorver e desconstruir todos os seus contornos. Além disso, ter dois criadores implica um senso de generosidade tremenda e cuidado redobrado em relação à coerência e à coesão textual. Por mais que os seus estilos se diferenciem, é fundamental haver empatia nas palavras. Um aspeto interessante é que os capítulos foram escritos alternadamente, mas sem qualquer indicação sobre o respetivo autor. Transitamos de um Will para o outro sem identificarmos qual pertence a Green e qual corresponde a Levithan - ainda assim, quem estiver familiarizado com o trabalho de ambos, certamente, poderá fazer essa distinção. Mas, atenção, não é, de todo, relevante para a compreensão da mensagem. 

Outra particularidade que me despertou a atenção foi o facto de um dos Will Grayson não utilizar maiúsculas no seu discurso escrito. Inicialmente, pode provocar alguma confusão, mas quando aceitamos esta característica a leitura torna-se mais serena. A verdade é que, no enredo, não existe qualquer explicação para este detalhe, mas questionei-me sobre a sua finalidade: será que tinha alguma intenção implícita ou tinha sido uma decisão meramente criativa? Após uma breve pesquisa - e sem ter a certeza da veracidade da informação -, encontrei uma justificação plausível, atendendo às características da personagem: como esta se sentia diminuída, minúscula, a forma de se expressar espelhava esse estado de espírito. A ser esta a justificação, sinto que foi um golpe de génio.

Este livro consegue ser bastante antagónico - ou não estivéssemos perante protagonistas com personalidades opostas. Pessoalmente, apesar de toda a negatividade, identifiquei-me mais com o "Will depressivo", porque apresenta uma capacidade argumentativa consciente e sólida. E porque a sua análise acerca de várias situações toca pontos essenciais, construindo linhas de pensamento fundamentadas, úteis e inteligentes. Com uma abordagem descomplexada, simples e natural, vamos refletir sobre temas de máxima importância: homossexualidade, carência, depressão, forma física/imagem exterior, desgostos amorosos e aceitação pessoal e social. Explorando assuntos sensíveis, que tocam o leitor pelo respeito com que são abordados, acompanhamos os dramas internos e relacionais de dois seres humanos que, afinal, têm mais em comum do que aquilo que imaginam. A componente tecnológica, por seu lado, também assume um certo destaque, principalmente, no alerta para a nossa identidade virtual: até que ponto podemos confiar nas pessoas com quem conversamos online? Independentemente de toda a carga emocional, que nos leva a gerir a autodestruição e a sensação de não se ser suficientemente bom para se viver feliz, o enredo tem inúmeras cenas de humor, aliviando a tensão e permitindo-nos respirar.

A linguagem aproxima-nos, quase como se fossemos parte da história dos dois intervenientes. Por essa razão, sentimos as suas dúvidas, as suas contradições, os seus receios, os seus anseios; sentimo-nos perdidos, mas também nos [re]descobrimos. E neste percurso curvilíneo, com altos e baixos, com decisões erradas e outras mais assertivas, há algo que se evidencia: o poder da amizade. Com ou sem coincidências, a vida prega-nos partidas e é bom saber que não estamos sozinhos nesta aventura. Perdidos dentro de si, conhecemos dois jovens «com uma atitude de desinteresse pelo mundo», que funciona como uma fachada, até porque, geralmente, e de um ponto de vista filosófico, «são as pessoas que mais sentem o impacto das circunstâncias». O final, confesso, deixou-me com algumas reticências. No entanto, é inegável o que somos capazes de aprender ou de reforçar com esta obra, porque denota o quanto nos podemos deslumbrar, ao mesmo tempo que prioriza a certeza de que ninguém é obrigado a ser igual a outrem, pois a sua individualidade deve ser aceite e respeitada. 

Recorrendo a uma série de questões, pensamentos e reflexões, compreendemos o quanto é fundamental estar perto e que o amor será sempre amor, independentemente da pessoa [género] a quem o direcionarmos. Talvez não seja o livro mais brilhante, mas tem uma estrutura e uma construção maravilhosas, que permitem quebrar preconceitos. E isso, por si só, é louvável e inspirador!


Deixo-vos, agora, com algumas citações:

«Querido Mundo, não sinto excitação por Will Grayson. Mas, mundo, há uma coisa que tens de saber sobre Will Grayson. - E então começa a cantar, um barítono da Broadway tão grande como a sua cintura. - Não posso viver sem ele!» [p:13];

«nunca desejei que tudo ficasse melhor, apenas que uma coisa melhorasse. e nunca aconteceu. assim, por fim, desisti. desisto todos os dias» [p:43];

«eu: sabes o que é uma merda no amor?
o.w.g.: o quê?
eu: o facto de estar tão ligado à verdade» [p:125];

«- É impressionante quanta coisa não sabemos sobre as pessoas, sabes?» [p:153];

«quando as coisas se quebram, não é o ato de quebrar em si que impede que elas se refaçam. é porque um bocadinho se perde, as duas bordas que restam não se conseguem encaixar mesmo que quisessem. a forma inteira mudou» [p:172].



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Comentários

  1. Muito interessante não conhecia e levo a sugestão para uma futura leitura.
    Um abraço e continuação de uma boa semana.

    Andarilhar
    Dedais de Francisco e Idalisa
    O prazer dos livros

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  2. Gostamos muito de tirar notas ao ler os livros que gostamos. Marcar as páginas das melhores citações sim, mas estragar o livro não, por isso mesmo gostamos tanto desse tipo de marcadores!

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  3. Se é do escritor de A Culpa é das Estrelas tem tudo para ser bom e o teu review ajuda muito também :)
    Bjinhosss
    https://matildeferreira.co.uk

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  4. O livro parece super interessante! Também li o Culpa é das estrelas e adorei, mas não conheço muito mais do John Green! Adorei a tua review Andreia!
    Beijinho, Ana Rita*
    BLOG: http://www.margheritablog.com/ || INSTAGRAM: https://www.instagram.com/rititipi/ || FACEBOOK: https://www.facebook.com/margheritablog/

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  5. Como sabes não achei muita piada a este livro e não foi desta que o John Green me fez adorar um livro dele. Fico muito feliz por teres gostado!!! Eu acho que o segundo Will escreve sempre com minúsculas e isso, porque acha que é uma perda de tempo escrever corretamente. Inclusive porque ele é uma personagem muito depressiva.. Não me lembro, mas será que para o fim ele já escreve correctamente?

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  6. Se das estrelas é a culpa,
    de quem será a inocência?
    Na vida haja amor e ternura
    saúde e paz em permanência!

    Tenha uma boa tarde Andreia.

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  7. Apesar de não acompanhar o trabalho do autor, esta review deixou-me curiosa.

    Tenho que o ler no futuro.

    Beijinho grande, minha querida! =)

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  8. Oi Andreia, eu já havia lido alguns comentários sobre esse livro e sempre fico curiosa a respeito da sua estrutura. Imagino que seja muito curioso e original, levo a sua dica para minhas leituras futuras. Um beijo! :*

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  9. Não li, mas pelo que dizes é uma boa sugestão de leitura.
    Andreia, continuação de boa semana.
    Beijo.

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  10. Parece interessante...Obrigada. :))

    Do nosso amigo Gil António, que diz: Que a minha cama não fique tão vazia

    Bjos
    Votos de uma óptima Quinta - Feira

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  11. Vi o filme A Culpa é das Estrelas, chorei imenso, gostei muito
    Não conhecia ainda esse livro Will e Will, Um Nome, Um Destino.
    Gostei muito do teu post
    Vou ler esse livro certamente em breve
    Obrigada
    Beijinho

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  12. Acho que sempre que venho cá conheço novos livros e novas novidades, não conhecia este também
    Beijinhos
    Novo post //Intagram
    Tem post novos todos os dias

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  13. Nunca tinha ouvido falar desse livro. Obrigada pela partilha!

    Bjxxx
    Ontem é só Memória | Facebook | Instagram

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  14. Não conheço o autor nem o livro :( quando for a uma livraria vou procurar ou no Wook.
    Beijinhos linda.

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  15. Não conhecia o autor, portanto também não li o livro, no entanto, todos os livros que quebram preconceitos, são os meus livros favoritos.

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  16. obrigado, meu doce, de verdade :D

    desde que li "A Culpa é das Estrelas", acabei por viciar neste género de escrita mais livre e mais terra-a-terra, na medida em que nos parece tão próxima como se lá estivéssemos. Também me agrada o facto de falar sobre temas atuais. Acho fundamental no dias de hoje, de modo a mostrar uma outra perspectiva acerca dos assuntos!
    Vou ter de o ler :D

    Um à parte: a Helena também escreve tudo sem maiúsculas nas palavras ahahah

    NEW BRANDING POST | HOUSE99: THE MALE CARE by DAVID BECKHAM.
    InstagramFacebook Official PageMiguel Gouveia / Blog Pieces Of Me :D

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  17. Nunca ouvi falar, mas parece ser muito bom!
    Para mim, o que me faria mais confusão era mesmo as maiúsculas :p

    https://quase-italiana.blogspot.com/

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  18. Pareceu-me muito interessante, já tinha ouvido falar. Ao contrário da maioria das pessoas, o primeiro livro que li do John Green e sem dúvida o meu favorito é o Looking for Alaska, foi sem dúvida dos livros que mais marcou a minha infância.

    Já sigo o teu blog, beijinho :)

    https://sixmilesdeeper.blogspot.com/

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  19. O unico livro que li do John Green foi o "Turtles all the Way Down" e adorei. Tenho que ler mais livros dele :)

    3200 Degrees - Lifestyle and Photography ❤

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  20. Gostei muito da review e também anotei. Fiquei curiosa, parece um livro maioritariamente diferente do que tenho lido até hoje :)

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  21. andei por aqui lendo tuas impressões sobre os livros e amei como tu consegue dizer coisas importantes sem entregar muito a obra.
    pra mim é sempre um prazer tranquilo ler John Green (com esse livro não foi diferente), ele é muito bom no que se propõe a fazer. e o David só faz com que a experiência seja ainda mais completa.

    beijo.

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