As minhas viagens de metro #66

Fotografia da minha autoria

«Passar a vida sempre no avesso»

O caos mantém-nos suspensos. É o desequilíbrio emocional, de quem não quer dar o braço a torcer, que nos motiva a permanecer em movimento, no mesmo compasso de tempo e de vida. São as nossas palavras que nos desconcertam. E, por termos o coração perto da boca, há sempre uma explosão de sensações que, maioritariamente, não corresponde à nossa vontade - nem à nossa verdade. Quem não nos conhecer, julgará que estamos em extremos opostos da mesma estrada.

Somos o avesso um do outro: Tu aprecias o dia e eu a noite. Tu és dado ao silêncio e eu à confusão. Em contrapartida, eu gosto mais de escutar e tu de trocar opiniões. Adoras café e eu chá. E escusado será dizer que nenhum consegue compreender a fascinação que o outro tem pela preferência das bebidas em questão. Eu perco-me nas letras e tu nas melodias. Se eu quero sair, tu queres ficar deitado no sofá; se a mim me apetece ficar de pijama o dia todo, tu queres arranjar-te e ir passear. Sou apaixonada por séries e tu por filmes. Não saio de casa sem ler o jornal que tu compras e para o qual nem olhas, já tu não tiras os olhos da televisão. Aprecio tardes no jardim a ler e tu és doido por jogos de computador. Se eu te elogio, tu reclamas comigo; se sou eu a resmungar contigo, tu enches-me de mimos.

Somos instantes. E inconstantes. Estamos genuinamente do contra na maior parte do tempo. E, ainda assim, quando, ao final do dia, nos perdemos a olhar um para o outro e nos aconchegamos no nosso abraço, percebemos que nos amamos sem medida. E que nunca amaríamos tanto alguém que não fossemos nós.

M, 10.03.2015