Entrelinhas #81

Fotografia da minha autoria

«Uma complexa história de encontros e desencontros»

O meu coração fica sempre desapontado quando uma leitura não corresponde ao esperado. Por mais que tente não elevar as expectativas - nem comparar -, sobretudo quando opto por um autor conhecido, é sempre difícil não criar algumas. E depois de ter lido e adorado O Tempo dos Amores Perfeitos [Entrelinhas #9], regressei a Tiago Rebelo. E a experiência não poderia ter sido mais distinta.

Já confidenciei, noutras ocasiões, que é raro não encontrar algo de inspirador numa obra, até porque acredito que há, pelo menos, um aspeto a arrebatar-nos ou a deixar-nos mais intrigados. Uma Noite em Nova Iorque não foi a exceção nesta regra, uma vez que a base da narrativa é interessante e a escrita do autor é fluída, sem grandes floreados e aliciante, construindo um argumento de esperança. Neste enredo, há um particular foco nas relações humanas. Nas ligações que se quebram. Na insegurança. Na desconfiança. Na falta de amor. E isso implica compromisso e bastante atenção, principalmente, pelos sucessivos avanços e recuos - entre o passado e o presente - e pelas relações paralelas. Apesar de apreciar esta dinâmica, que evidencia a incoerência do ser humano, foi uma história que me soube a pouco.

Determinadas passagens trouxeram mais ruído do que relevância para o desenvolvimento da ação. E, a dado momento, senti que a narrativa perdeu o seu propósito. As constantes divagações retiram-lhe o encanto. Além disso, parece-me excessivo que todas as relações tenham origem em traições, contribuindo para uma teia de ligações confusa. Existe, ainda, uma potencial parte de mistério que carece de exploração. Até certo ponto, consigo compreender o sentido, mas acho que, no final, nos faz questionar sobre o porquê de ter sido introduzida, atendendo a que a abordagem foi bastante superficial e com pouco significado, resultando em mais uma ponta solta. E esta foi uma das características que mais me deixou reticente, porque existem sempre detalhes em suspenso, sem laços que os unam, e uma sensação representativa de que falta algo para complementar o que é descrito.

A premissa entusiasma. Porém, a elaboração do texto, por muito que me custe a admitir, nem tanto. E isso provocou-me uma ausência quase total de empatia com as personagens. É inegável a ponte que consegue estabelecer com a realidade, seja pela familiaridade de alguns acontecimentos, seja pelos traços de personalidade em análise. Mas esta história merecia ser mais aprofundada - e ter menos generalizações -, porque, desta maneira, perde consistência. Embora se perceba o conflito interior provocado pelo término de uma relação longa ou pela necessidade de a manter a todo o custo, mesmo que isso influencie a felicidade dos intervenientes, temos que procurar estas camadas nas entrelinhas. E precisamos de o fazer com algum esforço.

Não me arrependo de ter escolhido este livro, mas gostaria de ter encontrado um registo mais coeso, mais sólido, mais fidedigno às interpretações que deixa antever. Porque teria qualidades para ser uma obra memorável. E se, de um modo geral, até giro bem finais em aberto, desta vez deixou-me frustrada. Uma Noite em Nova Iorque é daqueles exemplares que nos entretêm, sem exigir muito. Por um lado, até pode ser positivo - e, repare-se, não é uma leitura demorada, nem totalmente penosa. Mas, por outro, foi uma pena. Pois sinto que me acrescentou pouco. E que perdeu a intensidade - emocional e misteriosa - e a complexidade que prometia.

Deixo-vos, agora, com algumas citações:

«Ocorreu-lhe uma ironia: era um famoso escritor de histórias de amor e não conseguira salvar o seu romance com a mulher da sua vida» [p:10];

«Ela não tinha como afirmar sem qualquer contestação, evidentemente, mas havia uma voz persistente na sua cabeça que lhe dizia foste enganada» [p:29];

«O inconveniente de ter uma vida dupla era não poder contá-la a ninguém, e ele, que tomava nota de tudo num caderno que escondia, desejava intensamente ter essa oportunidade» [p:92].

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